A chuva veio com força em Melbourne, mas duas equipes parecem ter seus próprios cumulonimbus sobre suas cabeças. Marussia e HRT, as escuderias mais miseráveis da Fórmula 1, não sabem se participarão do Grande Prêmio da Austrália, etapa inicial da temporada 2012. Seus carros estão tão ruins e mal preparados que poucos apostam que aquela temerária barreira de 107%, recriada no ano passado para limar diligências muito vagarosas, será superada. A chance de termos apenas vinte carros no grid existe e não é baixa.

O que mais assusta é que ambas estão em seu terceiro ano completo na Fórmula 1 e, teoricamente, já deveriam ter deixado esse tipo de dificuldade para trás. O caso da HRT talvez seja até menos pior, pois a equipe espanhola sempre foi precária, passou por uma profunda mudança de gestão no segundo semestre do ano passado, mudou cerca de 80% de seu pessoal em poucos meses e só começou a aprontar seu carro de 2012 em setembro, muito após as demais. Choca-me, mesmo, é a Marussia não conseguir fazer um teste oficial de pré-temporada sequer com seu novo carro. As sucessivas reprovações no crash-test acabaram atrasando o cronograma de uma maneira jamais vista nos dois últimos anos.

É verdade que a categoria está mais exigente com estas equipes, tendo reimplantado o limite de 107% no ano passado e estabelecido a obrigatoriedade da aprovação em todos os crash-tests antes de poder colocar o carro na pista, mas é igualmente verdadeiro que as duas equipes já deveriam ter avançado mais nestes mais de dois anos de existência. Sabemos que os tempos estão difíceis para todos, mas a Fórmula 1 não perdoa ninguém. Se está ruim para a classe média, imagine para a ralé.

A Marussia nunca teve problemas com o limite dos 107%. A HRT já, mas em apenas um fim de semana do ano passado, o primeiro. De resto, as duas nunca ficaram de recuperação. Às vezes, até conseguiam um 6 ou 6,5 no boletim. Nesse ano, talvez, as coisas se dificultem. Talvez. O Top Cinq de hoje homenageia as equipes antigas que acabaram sobrando naquele cruel número de três dígitos, o 107.

5- ARROWS

Faltando poucos minutos para o fim do treino oficial do GP da Austrália de 1997, os dois carros da TWR Arrows estavam totalmente fora da corrida. Como o canadense Jacques Villeneuve havia feito um absurdo tempo na casa de 1m29, quase todo mundo acabou ficando muito para trás e o limite dos 107% apertou a cintura de muita gente. Pedro Paulo Diniz, com problemas no câmbio, e Damon Hill, que teve de pular para o carro reserva, só se salvaram na beira da bacia das almas por muito pouco. Hill só se qualificou para o grid faltando segundos para o fim da sessão. O brasileiro não conseguiu, mas foi autorizado a largar por ter feito tempos razoáveis nos treinos de sexta-feira.

A Arrows nunca foi uma equipe estritamente vergonhosa, mas já teve períodos muito ruins durante sua existência de quase 25 anos. Este treino oficial australiano foi um troço totalmente excepcional, mas também expôs as mazelas de uma equipe que sempre quis ser grande e nunca conseguiu. Em outras ocasiões, o fantasma dos 107% também a aterrorizou.

Lembro-me bem dos treinos oficiais do GP da França de 1999. Choveu indecorosamente e praticamente ninguém deixou de dar ao menos uma escapada para a caixa de brita, porque caixa de brita era o que a moda ditava naquela época. Em condições extremas, nada menos que cinco carros foram capados no limite dos 107%: o Jordan de Damon Hill, os dois carros da Minardi e os dois da Arrows, que fizeram tempos até dez segundos mais lentos que o da pole de Rubens Barrichello. Mesmo assim, os comissários de pista tiveram bom senso e permitiram que todos largassem. Não seria surpreendente se até Noé em um jet-ski não conseguisse um tempo entre os 107%.

Mas houve também uma ocasião que a equipe foi totalmente culpada por não ter largado. Na verdade, ela fez é questão de não ter conseguido. Foi no sábado do GP da França de 2002, aquele em que Michael Schumacher foi pentacampeão. Naqueles dias de julho, a Arrows estava numa situação financeira desgraçada, a ponto do Enrique Bernoldi ter de pedir um par de luvas emprestado a um mecânico! Os macacões dos pilotos estavam sendo apenas lavados devido ao corte do fornecimento de novas roupas por parte da Sparco e não havia sequer um preparador físico ou massagista. Tudo havia desmoronado.

Em Magny-Cours, a Arrows teve de optar por uma tática desesperada para tentar sobreviver. Enquanto tentava costurar sua venda à Red Bull, a equipe decidiu não disputar a corrida. Para não ter de pagar nenhuma multa por ausência à FIA, ela decidiu que seus dois pilotos, Heinz-Harald Frentzen e Enrique Bernoldi, teriam de dar apenas uma volta lenta para registrar suas participações no treino oficial. Somente uma volta seria permitida, pois o contrato com a Cosworth dizia que se o motor fosse utilizado em apenas uma volta, ele não seria cobrado. Obviamente insatisfeitos, Bernoldi e Frentzen cumpriram o combinado e, de fato, não ultrapassaram os 107% e não largaram.

Foi o início do fim da Arrows. Para Bernoldi, a ausência foi ainda mais dolorosa. Ele havia tomado uma multa de 4,5 mil dólares por excesso de velocidade no GP do Canadá e a Arrows acabou tentando pagar esta multa à FIA com um cheque sem fundo. O cheque foi retornado e a FIA ameaçou impedir a participação da equipe em Magny-Cours. Bernoldi decidiu, então, tirar os 4,5 mil dólares do próprio bolso para quitar a multa e poder participar do GP francês. Se soubesse o que lhe aconteceria, teria usado o dinheiro com uma arma pra matar Tom Walkinshaw.

4- TYRRELL

De bela e longa história, a Tyrrell do madeireiro Ken chegou à segunda metade dos anos 90 respirando com a ajuda de aparelhos. Ela até tinha alguns trunfos, como alguns patrocínios japoneses, o respeitado projetista Harvey Postlethwaite e o piloto finlandês Mika Salo, mas nada além disso. Ao menos, a equipe nunca passou pela vergonha de cair para o grupo das nanicas. Teve momentos horríveis e até chegou a ser banida da Fórmula 1 em 1984, mas sempre manteve um mínimo de dignidade.

A Tyrrell competiu em três temporadas com o limite de 107%, entre 1996 e 1998. Nos dois primeiros anos, tendo Salo, Ukyo Katayama e Jos Verstappen como pilotos, ela nunca teve problemas para conseguir largar. O carro era ruim e tal, mas ainda andava à frente da Minardi e ocasionalmente peitava a Arrows. Mas as coisas mudaram um pouco em 1998, quando Craig Pollock tomou de Ken Tyrrell o controle da coisa.

Pollock, muito conhecido por ter deixado para trás uma legião de inimigos e problemas, colocou o brasileiro Ricardo Rosset para correr ao lado do japonês Toranosuke Takagi, decisão que aborreceu Ken Tyrrell a ponto dele abandonar sua própria equipe. A entrada de Rosset, um bom piloto que infelizmente nunca será respeitado no Brasil, desestabilizou tudo. Não era muita gente lá na Tyrrell que o queria por lá, para dizer a verdade. O único que recebia todas as atenções era o companheiro Takagi, que levava uma boa grana das lâmpadas da PIAA.

Rosset ficou de fora de cinco corridas da temporada 1998: Espanha, Mônaco, Alemanha, Hungria e Japão. À primeira vista, um absurdo, ainda mais considerando que Takagi conseguiu largar em todas elas e ainda chegou a fazer o 13º tempo em duas sessões oficiais. Em Mônaco, o paulista fez tanta bobagem que acabou virando piada no paddock. Todo mundo ri, mas poucos sabem que seu carro estava sem a marcha ré funcionando, sem embreagem e totalmente instável. Assim, não fica difícil bater em Jacques Villeneuve ou ter dificuldade para tentar consertar uma rodada.

Muita gente gosta de acreditar que os dois pilotos de uma mesma equipe recebem tratamentos parecidos e quem perde sempre é o chorão incompetente. É óbvio que as coisas não são assim. Na Tyrrell, era evidente que o melhor carro e as atualizações eram dadas a Takagi, que pagava as contas e era visto como um sujeito que poderia até atrair as atenções da Honda. O desprestígio de Rosset na equipe ficou evidente na mesma corrida monegasca, quando os mecânicos da equipe inverteram a primeira e a última letra de seu sobrenome em uma placa de indicação, formando um “tosser”, que é basicamente uma palavra que você não deve ensinar para seus filhos. Em condições assim, dá para entender o porquê dele não ter superado a barreira dos 107% em cinco ocasiões.

3- MINARDI

Até aqui, a equipe que mais teve problemas com a maldita porcentagem foi a Minardi, talvez a equipe cult por excelência das últimas décadas. Que ela era simpática, fazia uma macarronada honesta e encarnava um espírito guerreiro, ninguém nega. Complicado é querer acreditar que ela, a Minardi, era uma equipe muito melhor do que HRT e Marussia. Sinto dizer, mas não é verdade. Os italianos pegaram uma época muito melhor do que as duas pobrezocas atuais: era muito mais tranquilo arranjar patrocínio, era muito mais fácil arranjar pilotos de testes que pudessem financiar as coisas e tanto a mídia como os espectadores tinham muito mais boa vontade.

Porque, em termos de competência, preparação e resultados, a turma de Faenza amargurou temporadas tão ruins quanto uma HRT é capaz de fazer atualmente. Na gestão de Paul Stoddart, a Minardi sempre iniciava o ano prometendo mundos e fundos e terminava praticamente à venda e apelando para pilotos pagantes. Nos seus últimos dez anos de existência, pontos foram marcados em apenas cinco corridas. Isso numa época onde havia muito mais abandonos. Reconheçamos: nós até gostamos da Minardi, mas a ruindade estava lá e era abundante.

Oficialmente, houve sete corridas em que ao menos um dos carros da Minardi não pôde largar por não ter trespassado a barreira dos 107%. Teve, é claro, os dias em que seus desafortunados pilotos puderam largar mesmo sem terem ficado dentro do limite. Eram ocasiões em que a organização sabia que o carro era ruim, mas não tanto, e o piloto em questão não atrapalharia os mais rápidos e também não sairia por aí batendo feito taquicardia. Exemplos destas ocorrências são Tarso Marques no GP da Austrália de 2001 e Marc Gené no GP da Austrália de 1999. Por ser a primeira corrida do campeonato, a Fórmula 1 perdoava.

Mas havia momento em que simplesmente não dava para tolerar. Ou o piloto em questão era muito ruim ou o carro simplesmente não tinha o nível mínimo de competitividade necessário para a categoria. Este último caso só foi visto no GP da Inglaterra de 2001, quando Tarso Marques não conseguiu fazer seu terrível PS01 marcar um tempo minimamente adequado. Por outro lado, Alex Yoong e Giovanni Lavaggi eram tão bizarros que não dava para culpar apenas o bólido. O malaio não largou nos GPs de San Marino, Inglaterra e Alemanha de 2002, ao passo que Lavaggi ficou de fora dos GPs da Alemanha, Bélgica e Japão de 1996. E olha que a Minardi, segundo alguns, ainda é mais profissional e menos patética que a HRT, hein?

2- FORTI-CORSE

Em seu primeiro ano, 1995, a Forti-Corse conseguiu participar de todas as corridas. Mas só participou porque a Fórmula 1 daquela época era uma mãezona com as equipes pequenas, que não tinham de enfrentar esta merda de 107%. Foi bom para ela, pois o FG01 era um carro antiquado, pesado, fraco e feio de doer. Com ele, Pedro Paulo Diniz e Roberto Moreno frequentemente tomavam seis ou sete segundos por volta dos carros mais velozes. No GP da Argentina, os dois levaram nada menos que nove voltas do líder Damon Hill e, por isso, não foram classificados na tabela final. Não é por acaso que o dono Guido Forti, após saber que a Larrousse não disputaria a temporada, afirmou que “era o sujeito mais aliviado de todos”. Se a equipe francesa tivesse conseguido participar, a Forti-Corse dificilmente conseguiria largar nas corridas.

Em 1996, Pedro Paulo Diniz, Carlo Gancia e boa parte dos patrocinadores brasileiros caíram fora da nau decadente da Forti-Corse. Sem dinheiro e com apenas alguns pequenos patrocinadores, Guido Forti teve de seguir sozinho com sua encrenca. Trouxe os desesperançosos piloto italianos Andrea Montermini e Luca Badoer, cujos talentos nunca foram devidamente explorados, e empreendeu uns retoques no antigo FG01 para as primeiras corridas enquanto o novíssimo FG03 não ficava pronto.

1996 foi o ano em que a Fórmula 1 decidiu aplicar a tal regra dos 107%, visando evitar que caricaturas de equipes, como a própria Forti-Corse, largassem com carros até dez segundos mais lentos. Se fosse para alguém participar da corrida, que ao menos demonstrasse algum nível técnico. Foi uma medida polêmica, pois o número de inscritos havia caído para 22 e uma medida dessas só tenderia a esvaziar ainda mais o grid. Não apenas a Forti poderia ter problemas, mas também Minardi, Arrows e Tyrrell. Imagine uma corrida com apenas sete equipes. Este era o medo geral.

Montermini e Badoer tiveram enormes dificuldades nos dez fins de semana em que tomaram parte. Em um deles, em Mônaco, Andrea foi o único da equipe a não se classificar por ter ficado sem carro após sofrer um acidente em um treino livre. Em outros quatro fins de semana, nenhum dos dois conseguiu largar. Em Melbourne, Montermini teve problemas com o câmbio e Badoer ficou a 0,4s do limite. Em Nürburgring, a equipe já estava esperando o novo carro e nenhum dos dois pilotos se esforçou para largar, embora Montermini tenha culpado Damon Hill por ter feito um tempo baixo demais…

Em Barcelona, os dois ficaram bem distantes dos 107%. Por fim, em Silverstone, a equipe estava praticamente falida e os pilotos só deram duas voltas cada um antes de seus motores, que não foram sequer revisados, estourarem. Este foi o fim da triste odisséia da Forti-Corse na Fórmula 1.

1- MASTERCARD LOLA

A regra do limite dos 107% pode ser extremamente dura com algumas equipes pequenas e péssima para uma pessoa como eu, que gosta de ver diversidade de estruturas e desempenhos em um grid. Mas sou obrigado a reconhecer que ela é bastante eficaz e até mesmo sensata para casos extremos. O melhor exemplo do bom funcionamento desta regra é a não-participação da Mastercard Lola no GP da Austrália de 1997.

A Lola não era nenhuma novata nesse negócio de Fórmula 1, muito pelo contrário. Já tinha fornecido chassis para equipes como Hill, Haas, Larrousse e Scuderia Italia, além de ter tido uma competente equipe própria nos anos 60. Fora da Fórmula 1, ela contabilizava ótimos momentos na Fórmula 3000 e na Fórmula Indy. Como a categoria maior parecia ser uma espécie de unfinished business para o dono Eric Broadley, a Lola não sossegaria enquanto não fizesse sucesso por lá.

Em 1995, ela projetou um chassi experimental, o T95/30, e o colocou na pista para alguns testes. No ano seguinte, foi celebrado um acordo de patrocínio com a Mastercard, que injetaria até 30 milhões de dólares anuais por meio de um interessante sistema de patrocínio por fidelização de novos clientes. A parceria foi ótima, mas tinha seu preço: a Mastercard queria que a Lola estreasse sua equipe já em 1997, um ano antes do planejado. Sem opção, Broadley teve de tentar construir um arremedo de equipe em seis meses. Arranjou dois pilotos, 35 funcionários, motores Ford V8 e um chassi, o T97/30.

Mas estava tudo errado. A equipe tinha cerca de 35% dos funcionários da Stewart e apenas 10% dos funcionários das equipes grandes. O T97/30 era um carro construído a partir de conceitos utilizados no chassi T9600 de Fórmula Indy, no T95/30 de 1995 e até mesmo no desastroso T93/30 da Scuderia Italia! Os motores eram os mesmos utilizados pela Forti-Corse em 1996, a transmissão era transversal e contrariava praticamente todas as demais equipes da época, a carroceria reaproveitava peças dos carros da Indy e toda a parte traseira era diretamente importada do antigo T93/30, considerado o pior carro da temporada de 1993. Qual foi o resultado disso tudo?

O demônio em forma de carro. Devido à sua total ineficiência aerodinâmica, o T97/30 não gerava downforce nas curvas e também não andava porcaria nenhuma nas retas. Como ele também era incapaz de gerar temperatura nos pneus, a aderência mecânica estava totalmente comprometida. Para piorar, o câmbio sequer trocava de marchas corretamente. E se eu disser que a equipe só teria direito a trinta motores para um ano inteiro enquanto as demais equipes chegavam a ter disponíveis dez unidades por corrida?

Com o carro terminado às pressas e sem ter feito um único dia sério de testes, Ricardo Rosset e Vincenzo Sospiri desembarcaram na Austrália para tentar se classificar para o primeiro GP da temporada de 1997. Nem preciso me alongar muito para dizer se eles conseguiram superar o limite de 107%.

Enquanto Jacques Villeneuve fazia um tempo na casa de 1m29s e Pedro Paulo Diniz se lamentava por não ter conseguido fazer nada além de 1m35s9, Sospiri fez exatos 1m40s972 e Ricardo Rosset marcou 1m42s086. Os dois ficaram, respectivamente, a 11s603 e 12s717 da pole-position. Para se ter uma ideia da catástrofe, se houvesse um limite de 113%, ambos ainda teriam fracassado. No fim, a regra dos 107% acabou impedindo que esta draga da Mastercard Lola brincasse de corrida de caracol em pleno mundo da Fórmula 1.

GP DA AUSTRÁLIA: Bonobos, a Fórmula 1 voltou. Hoje à noite, os brasileiros e as brasileiras que gostam de acompanhar carros correndo ao redor de nada poderão matar a vontade de rever aqueles troços coloridos e com degraus circulando por aí a mais de 300 por hora. E Albert Park será o palco do início da 63ª temporada da categoria mais veloz da Europa. O circuito localizado em Melbourne é um dos melhores do campeonato: exigente, de acerto difícil, variado e muito bonito. O sol está sempre presente e os pilotos adoram tirar fotos com os coalas e passar as noites com as australianas. E as corridas são repletas de ultrapassagens e acidentes, não nesta ordem. Por causa disso, beira o absurdo quando Bernie Ecclestone prefere começar o ano com uma etapa naquela droga de Bahrein, onde ninguém bebe e as moças usam burca. Mas Bernie, que é um tremendo de um empata-foda, já deixou claro que a Austrália cai fora do calendário se não realizar sua prova à noite. Vocês sabem, ele não gosta de sol e odeia ver gente satisfeita.

FAVORITOS: Sebastian Vettel, Sebastian Vettel e Sebastian Vettel. Não sejamos inocentes ou excessivamente otimistas. Adrian Newey gripado, sem um braço e bêbado ainda consegue desenvolver um carro melhor que qualquer outro. Como Newey estava em perfeitas condições quando desenhou o RB8, é improvável que o título saia do mundo Red Bull. Diz a lenda que o tal degrau do carro da Red Bull é um duto frontal disfarçado, que conduz o fluxo de ar diretamente ao difusor. Se for isso, não só é genial como também chega a ser constrangedor que nenhuma outra equipe tenha pensado nisso. De qualquer jeito, com ou sem duto, Vettel ainda é o favorito. Correndo por fora, os dois pilotos da McLaren e Mark Webber, que precisará resgatar a dignidade perdida no ano passado. Não acredito na Mercedes e a Ferrari nas mãos de latinos é uma coisa digna de pena.

ESTREANTES: Teoricamente, são apenas dois. Ambos franceses. O mais promissor deles é Jean-Eric Vergne, que ganhou um título na Fórmula 3 britânica com 13 vitórias e que quase abocanhou o troféu da World Series by Renault logo em sua primeira temporada. Ele dividirá a Toro Rosso com Daniel Ricciardo, que também fará sua primeira temporada completa. A maior experiência do australiano, que já disputou algumas provas no ano passado pela HRT, o ajudou a andar à frente de Vergne na maior parte dos treinos da pré-temporada. Digo e assino que o francês irá sofrer um pouco nestas primeiras etapas. O outro é Charles Pic, que foi condenado a um ano de reclusão na Marussia. Sem conhecer o carro novo ou a pista, ele só estará na Austrália para tentar largar e terminar. Pelo menos, a cabeleira dos tempos da GP2 já foi aparada, provavelmente para se adequar aos padrões mauricinhos da Fórmula 1. São só estes dois. Romain Grosjean e Daniel Ricciardo não contam.

INTERMEDIÁRIOS: Partindo do pressuposto de que a Ferrari não conseguirá ser ainda mais sem-vergonha do que nos últimos anos e a Mercedes seguirá na rabiola dos grandes, o objeto de análise aqui compreende todo mundo que vai ficar naquela de pontuar de vez em quando e não ser sequer tocado pelas equipes pequenas. A Lotus, que era a Renault, é a melhor delas: liderou quatro testes de pré-temporada, está em lua de mel com Kimi Räikkönen e Romain Grosjean é um nome que definitivamente renasceu das cinzas. Se bobear, poderá peitar Ferrari e Mercedes sem grandes problemas. Sauber e Force India parecem ter carros bons, principalmente a primeira, mas não deverão sair muito do patamar atual. A Toro Rosso também, mas sua dupla de pilotos é mais empolgante do que a dos últimos anos. E a Williams, coitada, só acertou na pintura do carro. Liderar um teste com Pastor Maldonado não quer dizer absolutamente nada, talvez apenas que não será dessa vez que ela se juntará às equipes minúsculas.

NANICAS: Os últimos não serão os primeiros. O fundão continua desorganizado e sem futuro assim como nas duas últimas temporadas. A Caterham é um caso engraçado. Ex-Lotus, a equipe de Tony Fernandes melhorou muito de 2011 para 2012. Assim como melhorou muito de 2010 para 2011. Assim como evoluiu bastante durante o ano de 2010. Resultado: continuará um segundo atrás da Williams, que é a pior das equipes do meio. Ela terá de “melhorar muito” por mais quantos anos até começar a, enfim, marcar pontos? Mas esta, ao menos, parece ter a sobrevivência mais ou menos garantida a longo prazo. Suas companheiras de sofrimento, que ainda apostam no motor Cosworth, não têm muita coisa além de dois carros miseráveis, dois pilotos desiludidos e uma trevosa névoa pela frente. A Marussia ainda terá um carro de design invocado, mas o degrau no bico não está lá, o que não é um bom sinal. A HRT só pode contar com uma pintura bonita, pois o chassi é basicamente aquele velho Dallara montado às pressas no início de 2010. Narain Karthikeyan está lá. De dalits, ele entende.

O tempo é escasso como água na Mauritânia, mas ainda consigo falar sobre os assuntos mais relevantes. E os menos também. Não vou largar isto aqui às varejeiras e às bolas de feno.

PIQUENIQUE

Chora, Jerôme!  Enquanto Mark Webber comemorava sua solitária e até certo ponto ilusória vitória e os mecânicos empacotavam tudo para voltar à Europa, a desnecessária Marussia Virgin decidiu que o epílogo do Grande Prêmio do Brasil era o melhor momento para anunciar o companheiro de Timo Glock no ano que vem. Que não será Jerôme D’Ambrosio.

Charles Pic, 21 anos. Será ele o novo segundo piloto da Marussia em 2012. O que dá para falar sobre ele? Não muito, infelizmente. Pic segue a mesma linha de seus antecessores, D’Ambrosio e Lucas di Grassi: é um piloto bom, discreto, de currículo correto e sem grandes apelos midiáticos ou comerciais. O que mais?

Assim como a esmagadora maioria de seus antigos colegas da GP2, Pic é rico. Muito rico. Mais rico que o Riquinho. Tão rico que sua família consegue custear também a carreira de seu irmão mais novo, Arthur, na World Series by Renault. Père Pic é dono de uma enorme empresa de transportes que atua em mais de quinze países, a Groupe Charles Andre. Por causa disso, o pequeno e descabelado Charles nunca precisou ralar muito para virar piloto. Poderia se preocupar apenas com seus carrinhos, suas aulas de esgrima e hipismo. Não sei se ele fazia esgrima ou hipismo, mas tudo bem. Todo rico gosta dessas merdas.

Além de grana, Charles Pic tem ótimos contatos. Quem o introduziu ao mundo do automobilismo foi seu padrinho, o ex-piloto Eric Bernard. Queira eu ter um padrinho que foi piloto de Fórmula 1 nos anos 90. Em 2002, Bernard lhe deu um kart de presente e Pic pôde iniciar sua profícua carreira no automobilismo. Hoje em dia, ele é assessorado por um ex-companheiro de Bernard na Ligier, o boa-praça Olivier Panis. Mas não dá para dizer que Le Petit Charles é apenas mais um playboy que se mete a correr de carro porque tem os amigos certos. Porque além de grana e contatos, ele também tem bastante talento.

Nosso jovem francês cresceu, amadureceu, nunca conheceu um barbeiro e subiu para os monopostos. Assim como Felipe Massa é dono do sexto lugar, Charles Pic parece gostar de um terceiro lugar nas tabelas. Na Fórmula Campus, terminou em terceiro em 2006. Na Fórmula Renault, terminou em terceiro em 2007. Na World Series by Renault, terminou em terceiro em  2009. Na GP2, ficou a um único ponto do terceiro lugar neste ano. Pela lógica, deverá terminar a próxima temporada da Fórmula 1 em terceiro. A matemática nunca falha.

Pic é o único estreante confirmado até aqui. Algo que me interessa bastante é o fato de ser, até agora, o único piloto francês assegurado para a próxima temporada. Você, leitor muito bem-informado deste sítio, sabe que a França está mandando ver no automobilismo de base. Romain Grosjean levou o título da GP2, Jean-Eric Vergne quase fez o mesmo na World Series e Jules Bianchi é o atual queridinho da Ferrari. Em termos de preferência popular, Charles Pic fica atrás de toda esta patota aí. Mas driblou todos eles e salvou seu lugar na Fórmula 1. Por enquanto, a torcida francesa vai para ele.

Como Pic pilotará pela pior equipe do campeonato, que só termina em último e sequer sabe parafusar direito uma roda, não podemos esperar muito dele em 2012. É verdade que a Marussia conseguiu se livrar de Nick Wirth e seu utópico sonho de projetar um carro sem túnel de vento e arranjou um acordo técnico com a McLaren, mas somente isso não será suficiente para transformá-la em uma equipe campeã do mundo. Falta mudar muita coisa. Para começo de conversa, eu mandaria aquele Richard Branson ir pastar. Em seu lugar, colocaria algum mafioso uzbeque no lugar. O dinheiro e a fanfarronice continuariam os mesmos, mas estou absolutamente certo de que somente a ausência daquele inglês metido a Peter Pan fará os carros serem um segundo mais rápidos, no mínimo.

Mais alguma coisa? No ano passado, Pic passou por uma situação bem desagradável em Istambul. Desagradável é um eufemismo, na verdade. Escrevi sobre isso aqui.

GELADEIRA

Mas ninguém está ligando para Charles Pic ou coisas do gênero. O povo quer saber mesmo é de Kimi Räikkönen. Pois ele voltou. Vai correr na Renault no ano que vem. E no outro. Ah, desculpe, chamei a Lotus de Renault? Sou meio burro e demoro um pouco para me acostumar com estas mudanças. Não é todo dia que equipe A rouba o nome de equipe B.

Acabou hoje uma das principais novelas desta silly season. O retorno de Räikkönen, na verdade, é conveniente para todos. A equipe terá um piloto de ponta que poderá recolocá-la no caminho das vitórias e ainda atrair as atenções. Por sua vez, o finlandês reencontrará uma motivação para sua vida. Nos últimos dois anos, Kimi fez algumas corridas no Mundial de Rali pela equipe júnior da Citroën e pela sua própria equipe, a Ice 1. Achou divertido no início, mas começou a se aborrecer com os vários acidentes, as dificuldades e as viagens a lugares inóspitos. Fora isso, ele também participou de uma corrida da NASCAR Truck Series em Charlotte. Também não deve ter gostado muito, pois não voltou mais para lá.

Kimi deve ter concluído que por mais que a Fórmula 1 seja um saco, não há lugar mais adequado para ele do que lá. Mesmo que todo mundo implique com seu laconismo, sua vida etílica ou seu descompromisso com as coisas mundanas. Imagino também que o fato da Fórmula 1 ter reunido um heptacampeão, dois bicampeões e dois campeões deve tê-lo motivado a voltar para provar que, sim, ele também pertence ao convescote. Também imagino que o dinheiro deve estar lhe fazendo falta. Räikkönen passou todo o ano de 2010 sendo pago pela Ferrari para não fazer nada na Fórmula 1. Neste ano, a fonte acabou. É hora de voltar ao batente para garantir o leite da criançada.

Antes de assinar com a Renault (dane-se, será chamada assim até quando eu quiser), Räikkönen conversou durante um bom tempo com a Williams. Frank Williams estava arquitetando a contratação do finlandês como uma forma de atrair investidores do Catar, manobra semelhante à feita por ele mesmo há trinta anos, quando convenceu um punhado de árabes a investir em sua equipe. Pois as conversas com a turma do Catar não avançou e a vinda de Kimi também acabou azedando. Hoje, a Williams pensa em um finlandês um pouco menos famoso, Valtteri Bottas. Motivos financeiros.

Na Renault, Kimi Räikkönen terá de trabalhar muito se quiser andar lá com a turma da frente. Neste ano, a equipe preta e dourada passou por maus bocados e só marcou 73 pontos. A Force India, que ninguém levava a sério até pouco tempo atrás, ficou apenas quatro pontos atrás. O R31, que pretendia homenagear as antigas Lotus patrocinadas pela John Player Special, não foi desenvolvido a partir da segunda metade da temporada. Com isso, ficou para trás e passou a levar porrada de Toro Rosso e Sauber, uma tristeza. E nem bonito o carro era. Aquelas asas avermelhadas comprometeram qualquer tentativa de se fazer uma pintura preta bonita.

No ano que vem, imagino que Kimi terá sua temporada mais difícil desde que Peter Sauber decidiu apostar no branquelo que havia assustado a Fórmula Renault britânica. A não ser que o R32 seja um milagre da engenharia, imagino que ele não terá muitas chances de passar para o Q3 das classificações e terá de se contentar com aqueles pontos magros da oitava posição para baixo. Ou seja, ele fará o mesmo papel de Michael Schumacher, só que um pouco piorado.

Teria o volátil Kimi Räikkönen humor para esse tipo de desafio? Para alguém que simplesmente desistiu de disputar um rali na Austrália por não ter a menor vontade de pegar um avião até lá, é meio difícil responder algo com certeza. Mas a Fórmula 1 é um outro planeta e as exigências são infinitamente superiores. E o finlandês sabe disso mais do que qualquer um. Se ele assinou com a Renault, é porque deve ter aceitado todos os desafios e os potenciais aborrecimentos que poderiam acontecer com ele nos próximos dois anos.

Ou ele estava bêbado quando assinou. O que também não é improvável.

BURAJIRU

Como eu não vou conseguir dar notas para a corrida deste fim de semana, prefiro fazer um apanhado geral sobre tudo o que aconteceu. O Grande Prêmio do Brasil, última etapa da temporada 2011, foi vencido pelo australiano Mark Webber, segundo piloto da Red Bull. Ele venceu após o pole-position e líder Sebastian Vettel ter começado a apresentar problemas de vazamento de óleo do câmbio. Solidarizo-me com Vettel. Meu Corsa também está apresentando vazamento de óleo do câmbio e está cada vez mais difícil engatar as marchas daquela porra. Nunca perdi uma vitória em Interlagos por causa disso, mas nunca se sabe quando isso pode acontecer.

Foi uma corrida chata. As provas em Interlagos têm sido assim desde 2009, aliás. Aquela coisa de definir o título mundial na última curva aconteceu somente uma vez e, não, não voltará a se repetir. Neste ano, ficamos todos esperando pela tempestade. Ela caiu – na Zona Norte, no Centro, na Zona Oeste, na Zona Leste e aqui em Campinas. Por pouco, fiquei sem sinal para ver a corrida. A Zona Sul sobreviveu sequinha nos três dias de treinamentos, mesmo com todas as precisas observações meteorológicas do narrador oficial, que diz que a chuva vem da represa. E sem chuva, não dá. Temos, no máximo, uma corrida mediana, facilmente esquecível.

Vettel finalizou em segundo. Mau resultado para alguém que ganhou onze corridas só neste ano, mas um alívio que compensou a rodada na primeira volta na corrida de Abu Dhabi. Jenson Button pegou o último lugar do pódio e garantiu o vice-campeonato. Logo atrás, Fernando Alonso, que protagonizou, ao meu ver, a melhor cena da corrida, uma ultrapassagem por fora sobre Button no Laranjinha. Por mais que sua Ferrari estivesse em melhores condições, qualquer um que executa esse tipo de manobra naquele ponto merece respeito.

Massa? Finalizou em quinto. Ficaria em sexto, mas Lewis Hamilton teve um problema de sei-lá-o-quê e acabou alijado da disputa. O brasileiro não fez uma má corrida, mas não teve cacife para pleitear algo melhor. Os demais brasilianos tiveram uma corrida laboriosa até demais. Rubens Barrichello fez um ótimo 12º tempo na classificação, mas largou primorosamente mal e comprometeu qualquer chance de pontos. Esta foi, provavelmente, sua última corrida, uma pena. Bruno Senna foi a sensação do treino oficial, mas acabou com suas chances de pontos ao bater com Michael Schumacher na freada do S do Senna. Foi considerado culpado e teve de pagar uma punição.

O melhor brasileiro no domingo foi Nelson Piquet, é claro. O tricampeão do mundo foi a grande atração do fim de semana ao dar quatro voltas com o Brabham BT49C que lhe proporcionou seu primeiro título mundial em 1981. Felizmente, o público correspondeu aplaudindo o cara de pé. Piquet merece toda e qualquer homenagem.

Em entrevista à TV, a boa filha boa Julia Piquet afirmou que Nelsão prometeu durante toda a semana que levantaria a bandeira do Vasco da Gama, que está disputando o título do Campeonato Brasileiro com o Corinthians e o perderá infalivelmente no próximo fim de semana. Pois não é que ele fez mesmo? Após as primeiras voltas, Piquet sacou do bolso uma pequena bandeira do Vasco e a exibiu para todos. Mesmo em território paulista, todo mundo achou o máximo. E a manifestação deu resultado. O Vasco conseguiu vencer seu jogo contra o Fluminense no último minuto da partida, o que tirou o título antecipado do Corinthians na bacia das almas. Não foi o Hamilton que ganhou uma camisa do Vasco no ano em que ele obteve o título na última curva?

Ao descer do carro, lá veio a saltitante repórter da emissora oficial. “Piquet, chegou a se emocionar? Deu vontade de chorar?”. A resposta só comprovou que, mesmo próximo dos 60 anos de idade, Nelson continua sendo um dos sujeitos mais afiados que o automobilismo mundial já conheceu:

“Não. Tem que chorar de coisa ruim. De coisa boa, tem de rir”. Gênio.

Nesta semana anterior ao primeiro Grande Prêmio do ano, o da Austrália, volto para apresentar as três últimas equipes restantes. Como mera constatação, nenhuma delas será um must para nada neste ano. A primeira é a Marussia Virgin, ou simplesmente Virgin.

MARUSSIA VIRGIN RACING

Última colocada entre os construtores na temporada passada, a Virgin é uma concorrente que suscita certa desconfiança por parte de todos. Suas ligações com o imprevisível bilionário Richard Branson e com a escusa montadora russa Marussia, de propriedade de Nikolai Fomenko, dão à equipe uma aparência meio misteriosa e incerta. Alguns críticos alegam que a equipe não tem qualquer passado no automobilismo. Errado. Todas as partes que a compõem já tiveram alguma experiência nesse mundo.

Antes de ser uma equipe de Fórmula 1, a Virgin é simplesmente um dos maiores conglomerados de entretenimento do planeta. Fundada em 1970 pelo britânico Richard Branson, o Virgin Group transita pelos setores de telefonia celular, transporte aéreo, finanças, mídia, música, viagens, bebidas, jogos, energia e saúde. O império opera em 30 países, emprega mais de 50 mil pessoas e faturou 18 bilhões de dólares em 2010. Coisa pequena, não?

Branson é um maluco que se diverte abrindo novas empresas e fazendo estripulias que só realçam seu lado excêntrico. Por duas ocasiões, ele tentou dar a volta ao mundo em um balão, mas não teve sucesso. Esse seu lado aventureiro o motivou a patrocinar a Brawn, equipe de Fórmula 1 que surgiu dos escombros da Honda para ser a melhor equipe de 2009. O sucesso foi grande, mas Branson gosta mesmo é de um pouco de emoção. Ele decidiu largar a vitoriosa parceria para comprar a estreante Manor, uma das novatas escolhidas na seletiva de 2009, e montar sua própria equipe, a Virgin Racing.

Mas o que era a Manor? Fundada pelo ex-piloto John Booth em 1990, a Manor Competition é uma das equipes de maior sucesso da história do automobilismo de monopostos. Em 21 anos, a equipe conquistou nada menos que 171 vitórias e 19 títulos nos campeonatos europeu, inglês e espanhol de Fórmula Renault e na Fórmula 3 britânica. Muita gente de gabarito competiu sob sua insígnia: Lewis Hamilton, Kimi Räikkönen, Antonio Pizzonia, Lucas di Grassi, Paul di Resta, Mario Haberfeld e Oliver Jarvis estão entre os nomes mais conhecidos. Hoje em dia, além de operar a parte técnica e esportiva da Virgin Racing, a Manor mantém equipes na GP3 e na Fórmula Renault britânica.

E a tal da Marussia, aonde entra? Nikolai Fomenko deve ser o homem mais polivalente de São Petersburgo. Além de dono da companhia de supercarros russos, ele também é engenheiro, músico, ator de comédias e piloto de corridas nas horas vagas. Na última década, Fomenko foi figurinha fácil nas corridas do FIA GT e de endurance, tendo registrado participações nas 24 Horas de Daytona e Le Mans. Em setembro de 2005, ele apareceu em Brands Hatch e deu 21 voltas lentas no carro da Rússia nos treinos livres da primeira etapa da A1GP, sendo esta sua única experiência em monopostos.

A Manor foi uma das muitas equipes que se inscreveram para ocupar uma das três vagas que a Fórmula 1 abriria a partir de 2010. Batendo projetos aparentemente mais sólidos, como a Lola e a Epsilon Euskadi, ela contou com a boa relação entre John Booth e Max Mosley, o presidente da FIA e arquiteto desta seletiva. Sem estrutura técnica para funcionar como uma equipe de Fórmula 1 e sem dinheiro, Booth decidiu vender a maior parte das ações a Richard Branson, que queria patrocinar um projeto novo. E a Manor virou Virgin.

Seu primeiro ano foi bem ruim e o MVR-01, totalmente desenvolvido no tal sistema de Dinâmica de Fluidos Computacional, se mostrou bastante frágil e lento. Como Branson não aparecia em boa parte das corridas e também não colocava dinheiro na estrutura, surgiram alguns boatos de que a Virgin poderia até cair fora após o fim do ano. Não demorou muito e foi anunciada a venda da maior parte das ações da equipe para Nikolai Fomenko, que já patrocinava a equipe desde o início do ano e que mudou seu nome oficial para Marussia Virgin Racing e sua nacionalidade para russo. Sem lenço nem documento, a Virgin segue na Fórmula 1 esperando unicamente sair do pelotão da merda.

VIRGIN MVR-02

Gozado. Não era a Virgin a equipe revolucionária, sustentável e descolada? Pois então, cadê? Até aqui, tudo o que vimos foi um carro absolutamente conservador, uma dupla de pilotos insípida e nada que remeta a qualquer tipo de vanguarda. Tanto em termos técnicos como em termos marqueteiros, os virginianos estão a léguas do sucesso.

O MVR-02 é basicamente uma releitura do MVR-01 do ano passado. Assim como o antecessor, o carro a ser usado neste ano também foi totalmente desenvolvido em CFD, aquele sistema computacional que dispensa o uso de túnel de vento para fazer análises aerodinâmicas. Nick Wirth, diretor técnico da equipe, disse que a preocupação maior da Virgin era resolver os problemas de confiabilidade no câmbio e no sistema hidráulico, duas partes que deram muita dor de cabeça no ano passado. Resumindo: entre inovar e consertar, escolheram a segunda opção.

A maior mudança ocorreu no bico: ele está mais plano, mais largo e até mais baixo, contrariando a tendência geral de elevá-lo. E se a Virgin escolheu um caminho diferente do resto, na certa é ela que deve estar errada. No mais, as asas continuam iguais, a parte traseira é rigorosamente a mesma, os sidepods não foram alterados e as entradas de ar continuam com um curioso formato ovalado. A distância entre eixos aumentou um pouco para não haver problemas na hora de comportar o tanque de combustível. E o KERS não será utilizado.

Não está empolgado? Certamente, você faz parte de uma imensa multidão.

24- TIMO GLOCK


Sabe aquele cara que basicamente não se destaca em nada, nem positivamente e nem negativamente? Aquele que não é bonito e nem feio, não é inteligente e nem burro, não é rico e nem pobre, não é alto e nem magro e por aí segue. Uma pessoa mais amável o consideraria alguém mediano, remetendo ao sentido mais estatístico da palavra. Outra, mais ácida, simplesmente o tacharia de medíocre, salientando que mediocridade não é igual à ruindade. Se há alguém na Fórmula 1 que se encaixa perfeitamente neste parágrafo, este é Timo Glock.

Não há absolutamente nada de extraordinário para se falar dele. Timo Glock é um cara de aparência média que representa o país mais comum do grid, a Alemanha. Suas declarações são absolutamente esquecíveis. Seu senso de humor é bom para um germânico, mas indiferente para uma pessoa normal. Dentro da pista, Glock é um sujeito veloz em treinos, constante em corridas e razoavelmente propenso a erros no início de sua carreira na Fórmula 1.

Que se não foi genial, também está longe de ser ruim. Timo fez quatro corridas pela antiga Jordan, dois anos pela Toyota e um pela Virgin. Conseguiu três pódios, 51 pontos, uma primeira fila e uma volta mais rápida. Para alguém que nunca dirigiu nada além de um carro do meio do pelotão, nada mal. Antes disso, Glock foi campeão da GP2 em 2007, mostrando muita velocidade e alguma falta de juízo (quem não se esquece do seu acidente com o companheiro Andreas Zuber na largada da corrida de Magny-Cours?). Passou também pela ChampCar (estreante do ano em 2005), pela Fórmula 3 europeia e pela Fórmula 3 alemã. E… só isso.

O QUE VOCÊ NÃO SABE DELE: Antes de ser piloto profissional, Timo Glock trabalhava como construtor de andaimes na empresa de seu pai. O piloto da Virgin ajudava no desenvolvimento dos suportes que eram geralmente utilizados na construção de igrejas e prédios de grande porte.

25- JERÔME D’AMBROSIO


Pastor Maldonado e Sergio Perez foram os dois primeiros colocados da GP2 em 2010, enquanto que Paul di Resta é o atual campeão da DTM. Diante de tais atribuições, o belga Jerôme D’Ambrosio é o estreante com menos credenciais no grid. Se bem que, no seu caso, isso não significa muito.

D’Ambrosio é o primeiro belga a correr na Fórmula 1 desde Philippe Adams, o quatro-olhos que disputou duas etapas em 1994 e que foi entrevistado por mim algum tempo atrás. Entre 2008 e 2010, ele pagou todos os pecados dirigindo o Dallara-Renault da equipe DAMS nas GP2 europeia e asiática. Mesmo pilotando um carro mais lento e muito menos confiável do que o da concorrência, ele venceu uma corrida em Mônaco no ano passado e superou Kamui Kobayashi com folga nos dois anos em que correram juntos. Antes disso, ele foi campeão da Fórmula Master em 2007, e também passou por uma série de campeonatos. Dá pra dizer que seu desempenho na pista não condiz com seus resultados.

O belga garantiu uma vaga na Virgin com um belo apoio da Gravity, a empresa de gerenciamento de pilotos do grupo Genii. No início de 2010, ele foi anunciado como um dos pilotos de testes da Renault, mas andou muito pouco. A Virgin o convidou para pilotar seu MVR-01 nos treinos de sexta das quatro últimas etapas. D’Ambrosio andou bem e agradou a equipe, que não fez muito esforço para seguir com Lucas di Grassi e que chegou a conversar com Giedo van der Garde. Em 2011, é candidato a lanterna no grid. Sua única obrigação é andar o mais próximo possível de seu companheiro Glock.

O QUE VOCÊ NÃO SABE DELE: Em julho de 2007, enquanto corria na Fórmula Master, Jerôme D’Ambrosio sofreu um dos acidentes mais bizarros que eu já vi. Na segunda corrida da rodada de Anderstorp, o belga andava na quinta posição até faltarem duas voltas para o fim. A pista estava muito molhada e ele acabou escapando para a grama em determinada curva. Descontrolado, seu carro deslizou em alta velocidade e caiu… sobre uma enorme poça d’água. Jerôme saiu ileso, mas com o macacão completamente encharcado.