Foram sete anos de espera na Fórmula 1 brasileira. Lembra-se desta frase? Ela foi proferida pelo locutor Galvão Bueno momentos após Rubens Barrichello ter atravessado a linha de chegada daquele chuvoso Grande Prêmio da Alemanha de 2000. Sim, faz quase doze anos.

Aquele domingo foi uma coisa especial para quem gosta e acompanha o automobilismo. Eu já soquei o sofá de felicidade e de raiva. Já verti algumas lágrimas. Já bati palmas para a televisão. Já mandei fulano e beltrano ao raio que o parta. Faz parte, não? Acompanhar uma corrida de carro da mesma maneira que se acompanha um documentário sobre drosófilas ou a explicação de um economista sobre a última alta dos juros não faz sentido para mim. Esporte é, acima de tudo, emoção. Imprevisibilidade. É uma perfeita ciência humana.

Faltavam umas três voltas para o fim daquele GP da Alemanha. Chovia torrencialmente, de formar poças nos boxes e spray nas retas. Rubens Barrichello, piloto da Ferrari número quatro, liderava com uns dez segundos de vantagem para o finlandês Mika Häkkinen. Rubinho estava com pneus para pista seca, que funcionavam muito bem nas longas retas e dificultavam absurdamente sua vida no trecho do Stadium, onde chovia mais forte. Häkkinen abdicou da liderança na volta 35 para colocar os pneus de chuva.

Não fosse a água e a vitória teria ficado com o finlandês, que pilotava um MP4/15 assombroso nas retas. Barrichello havia tido um bocado de problemas no treino classificatório do sábado e conseguiu apenas um deprimente 18º lugar no grid. Na corrida, ultrapassou quase todo mundo à sua frente. As intervenções do safety-car, que entrou na pista porque um furioso ex-funcionário da Mercedes invadiu a pista com o propósito de estragar a corrida da McLaren e também devido a um acidente entre Jean Alesi e Pedro Paulo Diniz, permitiram que Barrichello pudesse se aproximar dos líderes Häkkinen, David Coulthard e Jarno Trulli. A chuva só completou o serviço.

Esta é a descrição mais objetiva da corrida. Alguns milhares de quilômetros dali, eu devorava minhas unhas enquanto esperava pela vitória de Barrichello. Fazia quase sete anos que um brasileiro não vencia uma corrida de Fórmula 1. O último foi Ayrton Senna, no GP da Austrália de 1993. Desde então, Senna morreu e os brasileiros que precisam disso depositaram todas as suas esperanças patrióticas em Barrichello, que se tornou um Judas para os detratores e um Messias para os otimistas. Eu sempre estive do segundo lado. No fundo, nunca deixei de acreditar que ele poderia ter sido campeão do mundo. Fé desde a infância.

Faltavam três voltas para o fim. Galvão Bueno mergulhado em um êxtase somente visto no final daquela Copa de 1994, que eu dei a enorme sorte de ter visto e compreendido mesmo estando a alguns meses de completar seis anos de idade. Eu olho para a minha direita e vejo o Burti chorar, olho para a esquerda e vejo o Reginaldo chorar também, foi o que Galvão disse após a bandeirada. Você pode não gostar dele, mas puta que o pariu, como não se emocionar com isso?

14/03/1993 – a primeira

Eu não chorei. Mas deixei a corrida de lado e fui respirar um pouco. Estava ansioso pra caralho, totalmente nervoso, sem conseguir respirar direito. Voltei para a sala. Barrichello estava no Stadium. O Brasil inteiro vibrando por você. Aí vem Rubens Barrichello. E nós vamos ouvir o tema da vitória. E assim por diante. De verdade, acho o Tema da Vitória uma coisa banalizada e até meio brega nos dias atuais. Ele fazia sentido nos anos oitenta dos arranjos eletrônicos, mas não no novo milênio. Mas naquela vitória de Rubens Barrichello, a musiquinha composta pelo Roupa Nova deixou sua temporalidade de lado e salpicou o trunfo com a mais pura emoção. Pensar em Ayrton Senna, naquele caso, não era ufanismo pateta global. Na verdade, era quase inevitável. Pois eu pensei. E fiquei pulando como um maluco pela casa. Um dos melhores domingos da minha vida, devo dizer.

Vindo de mim, parece estranho escrever um parágrafo como este aí em cima. No meu caso, Rubens Barrichello é o único piloto para quem torci sem considerar muito este negócio de racionalidade, números e a fria lógica. Não, não quero dizer que não há racionalidade em torcer por ele. A não ser que você seja um semianalfabeto, há de reconhecer méritos no brasileiro, mesmo ele tendo feito um monte de besteiras e sendo um voraz e insatisfeito leitor de autoajuda.

Rubens Barrichello ganhou onze corridas na Fórmula 1. Apenas vinte e cinco pessoas no planeta venceram mais do que ele. Ele fez catorze pole-positions. Apenas dezenove pessoas fizeram mais do que ele. Ele obteve dois vices. Apenas trinta e duas pessoas conseguiram o feito imediatamente superior, um título mundial. Muitos argumentam que ele só conseguiu todos estes números às custas de mais de trezentas corridas na carreira.

Mas venha cá, qual é o real demérito nisso? A insistência? Grande merda. Grandessíssima merda. Sorte a de Rubens Barrichello que haja otários como Ross Brawn e Frank Williams que ainda admirem seu trabalho mesmo com ele estando velho e sem um título mundial. Sorte a dele que ainda o remuneram razoavelmente bem por isso. Sorte a dele que há muita gente lamentando sua ausência no paddock, seja pelas suas qualidades técnicas ou por sua simpatia.

Além do mais, se Barrichello ainda gosta e se prepara bem para o que faz, quem diabos somos nós para contestarmos? Se fosse ele, teria aposentado no fim de 2009, coberto dos louros de uma boa temporada na Brawn. Como não sou, apenas observo. E vejo que ele fazia aquilo que, no fundo, causa inveja a muita gente: trabalhava no que gosta, ganhava bem e é reconhecido. Diante disso, quem não gostaria de permanecer na mesma vida por décadas? Se um Pedro de la Rosa ou um Jarno Trulli podem desejar estender suas carreiras, por que não Rubens Barrichello?

27/11/2011 – a última

Caramba, Verde, quanto clichê, quanto argumento batido. Barrichello, para mim, ainda é um símbolo do fracasso, da derrota, da submissão, daquele Brasil que abaixa a cabeça para o dominador estrangeiro. Um pé de chinelo, como apontava aquele antigo programa global. Pois é. Acho engraçado quem observa as coisas desta maneira. Acho engraçado ver brasileiros que observam as coisas desta maneira.

Deixo claro que acho Rubens Barrichello um sujeito chato, chorão, inseguro e até imaturo. Era perceptível à distância que sua autoestima estava no chão, já que, no fundo, Rubens sempre concordou com o que grande parte de seus críticos exigiam, o cumprimento do inglório papel de “novo Ayrton Senna”. Além disso, suas largadas não eram boas e seu ritmo de corrida chamava a atenção por uma irritante irregularidade. Por fim, sua emotividade sempre era traduzida em declarações no mínimo inoportunas. Ou mesmo em atos que beiravam a infantilidade. Pensei seriamente em parar de torcer por Barrichello quando a imprensa divulgou que ele liderou um coro chamando o Michael Schumacher de viado em uma festinha por aí.

Enfim, como fã de Rubens Barrichello, não tenho problema em reconhecer sua lista de defeitos. O que sempre me incomodou, e me intrigou, é o jeito com que grande parte dos brasileiros, inclusive aqueles que entendem de corridas, lida com ele. A crítica se transforma em puro deboche. Em maldade. Que virou verdadeiro folclore nacional. Chega-se a um ponto em que a perseguição existe por si mesma, sem sequer um fundamento técnico, um verdadeiro fenômeno de manada. Como é que alguém realmente acredita que Rubens Barrichello bate em todas as corridas? Ou que ele sempre termina em último? Ou que, ao contrário do nosso divino, irrepreensível e incontestável Ayrton Senna, Rubens é um pusilânime para quem não vale a pena torcer pelo terrível pecado de ter sido vice-campeão duas vezes? Diagnóstico meu é curto e grosso: as pessoas tripudiam sobre Barrichello porque é legal e porque seus amigos fazem o mesmo. Se você não o fizer, é um do contra chato e socialmente inadequado.

Como disse lá em cima, acho absolutamente normal que alguém não goste dele. E que o critique duramente. Já li críticas tão pesadas quando irrepreensíveis sobre uma cagada sua ou uma declaração absurda. Estas coisas fazem parte da vida adulta. O que não é nem um pouco adulto é o nível do que é rabiscado ou vomitado sobre um sujeito que faz seu trabalho, não afeta negativamente a vida de ninguém e se esforça ao máximo para trazer um bom resultado para o país que o renega. Ah, mas você acha que ele desrespeitou o país naquele GP da Áustria de 2002? Você acha que ele envergonha a nação? Vá se tratar. Não é Rubens Barrichello o problema, definitivamente.

A realidade é que Rubens Barrichello é um piloto acima da média que sabe extrair o máximo de seu carro em uma volta rápida, consegue fazer uma boa leitura dos problemas de seu carro e anda como poucos em pista molhada. Admita: são poucos os pilotos que são melhores que ele. Michael Schumacher e Jenson Button seguramente estão entre estes poucos. Mas e daí? Rubens não pode ser crucificado por ter perdido para dois campeões mundiais. Mesmo que ele tenha prometido o título mundial em trocentas ocasiões. Não deu, nem todos os pilotos bons chegam lá. O problema é que ninguém aceita isso, nem mesmo o próprio Rubens Barrichello, o que explica a recorrência às promessas no ano seguinte.

30/07/2000 – a melhor

Por fim, raciocine: você faria tudo diferente? Não seja mentalmente preguiçoso e deixe de lado o fato de você já conhecer a história e suas consequências. Você teria deixado de lado um contrato com a McLaren válido para 1995? Você teria abandonado uma boa proposta para correr na Indy em 1997 para abraçar um sonho de Jackie Stewart? Você teria deixado de aceitar ser o segundo piloto da Ferrari para ser o primeiro da Jaguar ou prostituta de luxo de Mika Häkkinen em 2000? Você teria aceitado renovar o contrato com a Ferrari em ao menos duas ocasiões, mesmo sob as mesmas condições? Você teria praticamente implorado para permanecer na Fórmula 1 em 2009? Acima de tudo, você teria dado passagem para Michael Schumacher na corrida austríaca? Não acredito nas respostas hipócritas. A esmagadora maioria das pessoas, e eu me incluo aí, tomaria as mesmas decisões escolhidas por Barrichello. Ou decisões até piores.

Neste 17 de janeiro de 2012, a Williams anunciou a contratação de Bruno Senna para a vaga de companheiro de Pastor Maldonado. Barrichello, que tinha remotas chances de permanecer na equipe, acabou sobrando. Devo reconhecer que a maioria das pessoas que escreveram sobre ele foi respeitosa e lamentou bastante o que pode ter sido o encerramento abrupto de sua carreira. Mas é óbvio que os comentários negativos apareceram. “Ainda bem!”, “ele poderia ter se aposentado logo de uma vez em Interlagos ao invés de ficar se humilhando para ficar na Fórmula 1” e “é um recalcado que quase acabou com a carreira do nosso Bruno Senna”, foram algumas das coisas muito inteligentes que li.

Enquanto esta gente que certamente entende muito de sucesso e felicidade faz comentários do tipo, eu, que só vejo corridas e palpito, digo que minha melhor homenagem a Rubens Barrichello é a sensação de vazio que irei sentir ao observar o grid do próximo Grande Prêmio da Austrália. Quando este filho da mãe estreou na Fórmula 1, eu tinha quatro anos de idade e Ayrton Senna ainda corria contra Alain Prost. De lá para cá, o garoto precocemente calvo se transformou em um patrimônio da categoria. Acumulou tristezas, felicidades, amigos, histórias e uma rotina calculada nos décimos de segundo. De repente, tudo acabou. A Fórmula 1 não tem mais espaço para ele. Hoje, tenho 23 anos e nunca consegui conceber uma corrida sem a participação de Barrichello. Por mais que a gente não queira aceitar, os personagens da nossa infância se aposentam um dia. O que sobra é o baque.

Que Rubens Barrichello tenha agora um pouco de paz e respeito em sua terra natal. Os brasileiros continuarão estúpidos e volúveis como sempre foram, mas o fato dele não ter de se expor mais certamente transformará o desrespeito em bajulação barata, como acontece com um ídolo que se retira. Já que Rubens realmente faz questão de ser aceito e respeitado, talvez isso até fará bem a ele.

Rubens, aproveite os elogios, aprenda com as críticas construtivas e vire a bunda para as destrutivas. Você fará falta para quem te admira e principalmente para quem te detesta. “A quem fala coisa sem pensar e a quem não respeita o talento, a luta, a batalha e o sofrimento dos outros, pensa duas vezes, tá?“, é a frase do mesmo Galvão Bueno que fecha o post de hoje.

Quando recebeu a fatídica notícia, o suíço Sébastien Buemi estava treinando em um simulador da Red Bull em Milton Keynes. Buemi, piloto da Toro Rosso desde 2009, estava fora em 2012. Seu companheiro Jaime Alguersuari também. Na hora do anúncio, provavelmente estava ocupado com alguma coisa de DJ, sua diversão predileta. Não importa. O fato é que os dois pilotos da equipe de Faenza foram demitidos sem grande dor nem pesar por parte dos bambambãs da Red Bull.

No ano que vem, os emergentes Daniel Ricciardo e Jean-Eric Vergne ocuparão seus carros. A Toro não fez uma escolha ruim: Ricciardo e Vergne são jovens, muito velozes e ostentam currículos impecáveis. O australiano ainda conta com um sorriso imaculado, o que é excelente para uma equipe que vive de imagem. Além do mais, Buemi e Alguersuari, convenhamos, não mostraram grandes performances em suas três temporadas na categoria. Longe de terem decepcionado, nenhum deles cumpriu o requisito principal da Red Bull: ser um novo Sebastian Vettel.

Do ponto de vista ético, podemos contestar a maneira com a qual a demissão foi feita. Se a Toro Rosso tivesse alguma consideração com seus dois ex-pilotos, teria sido franca com eles e dado espaço para que pudessem encontrar emprego em outro canto. “Olha, vocês não são maus pilotos, mas devem saber que temos dois moleques na World Series que tem grandes chances de tomar seus lugares. Há possibilidades de vocês seguirem aqui, mas não garantimos nada. Estão livres para conversar com quem quiserem”. Pelo tom de ambos, a reformulação veio com surpresa. O fato de Buemi estar em um simulador no momento da decisão e de Alguersuari ter dito que teria de vencer na Toro para subir para a Red Bull mostra que, sim, eles tinham grandes esperanças e elas provavelmente eram alimentadas de alguma forma pela equipe.

Dito isso, conto o que penso de tudo: o problema é deles. O Top Cinq de hoje conta um pouco de história. Na longa história da Fórmula 1, muitas duplas foram feitas, desfeitas e refeitas. Em vários casos, havia alguma equipe que estava disposta a mudar tudo de um ano para outro. Cansada dos maus desempenhos, do péssimo ambiente, da grana escapando pelo ralo ou de simplesmente ter de olhar para as mesmas caras feias, ela mandava sua dupla de pilotos para o raio que o parta e trazia dois pilotos novos em folha. Falo aqui de cinco casos recentes e razoavelmente barulhentos. Cada um deles trata de uma equipe.

PS: Eu imagino que vocês esperavam um Top Cinq sobre os cinco piores do ano. Ele será feito na semana que vem com os seus votos, fiquem tranquilos.

5- GIANCARLO FISICHELLA E HEIKKI KOVALAINEN

No fim de 2006, o impaciente Flavio Briatore coçou a cabeça e disse a si mesmo algo como “fodeu”. Se não disse isso, ao menos pensou. Sua Renault teria de se virar sem Fernando Alonso, que havia acabado de ganhar o bicampeonato e estava de malas prontas rumo à McLaren. Enquanto a equipe de Ron Dennis tinha o espanhol e o furacão Lewis Hamilton e a Ferrari podia contar com os já consagrados Kimi Räikkönen e Felipe Massa, o que é que a Renault possuía em mãos?

Giancarlo Fisichella foi promovido ao cargo de primeiro piloto. Fisichella era bom, sim senhor, mas não o suficiente para liderar uma equipe de ponta. Briatore, mais do que ninguém, sabia disso: eles haviam trabalhado juntos em 2000 e 2001. No fim deste último ano, o gordo mafioso teceu duras críticas ao piloto italiano, considerado um dos responsáveis pelo fracasso da Benetton naquele ano. Quanto ao companheiro de equipe, o finlandês Heikki Kovalainen era considerado uma das estrelas do futuro. Havia sido vice-campeão da GP2 em 2005 e fez inúmeros e satisfatórios testes na Renault em 2006. Antes do início da temporada de 2007, ele era um estreante com muita moral. Havia apenas um revés: ele era um estreante.

Sem Alonso, a Renault teve um 2007 bem mediano. Fisichella começou razoavelmente bem o campeonato, mas se perdeu na segunda metade. Com Kovalainen, aconteceu o contrário: o jovem nórdico fez um monte de besteiras até o GP do Canadá, quando conseguiu um quarto lugar e começou a emplacar uma série de bons resultados. No fim, a Renault fez 51 pontos. Pouco para Briatore. Muito pouco.

Agruras francófonas à parte, o mesmo Fernando Alonso estava de saco cheio da McLaren e mandou uma carta de intenções à Renault pedindo para voltar. Briatore ficou com água na boca e não titubeou muito para trazê-lo de volta. Na mesma época, ele efetivou Nelsinho Piquet, que era o piloto de testes, tinha um vice na GP2 como Kovalainen e ainda carregava o bônus do sobrenome. Kova e Fisico deixaram a equipe sem muita moral. O primeiro ainda arranjou um emprego de oitavo piloto da McLaren. Para o italiano, só sobrou a então nascente Force India. Flavio Briatore é bom, mas é mau.

4- MIKA SALO E ALLAN MCNISH

Este caso aqui me assustou. Trata-se de dois pilotos profissionais de competência comprovada que interromperam suas vidas confortáveis no automobilismo para mergulhar de cabeça em um projeto extremamente ambicioso. Mika Salo é um finlandês bastante talentoso que nunca teve uma oportunidade decente na Fórmula 1 além de um punhado de corridas como substituto de Schumacher na Ferrari. Allan McNish é um escocês de currículo longuíssimo, vitórias nas 24 Horas de Le Mans e excelente reputação nas categorias de protótipos.

Em meados de 2000, os dois foram convidados pela japonesa Toyota para participarem do desenvolvimento de sua inédita equipe de Fórmula 1, que estrearia em 2002. Como recompensa, além do altíssimo salário, ambos teriam uma vaga na equipe. Consta que Mika Salo teria um contrato válido por quatro temporadas, receberia seis milhões de dólares por ano e ganharia de presente um cargo administrativo na equipe após o fim do contrato. Naquele ano de 2000, o finlandês fazia um ótimo trabalho em uma Sauber sem perspectivas. O convite era muito bem-vindo.

Salo e McNish interromperam suas carreiras como pilotos oficiais e mergulharam em uma extensa bateria de testes com os protótipos de Fórmula 1 a partir do fim de 2000. Eles chegaram a andar em onze dos dezessete circuitos então presentes no calendário, tiveram de aperfeiçoar um carro que nasceu horrível e Mika ainda quase ficou paralítico após um grave acidente em Paul Ricard causado por um problema no câmbio.

Os dois realmente ganharam uma vaga em 2002, mas a temporada acabou sendo muito ruim. Estava tudo errado: a base da Toyota na Alemanha não se dava com a base japonesa, a organização da equipe era patética e o TF102 parou de ser desenvolvido ainda no início do ano. O sempre bocudo Salo mostrou-se bastante insatisfeito com a situação e teceu críticas duras à equipe. Ao invés de ouvi-las, o que a Toyota fez? Decidiu que a culpa pelo fracasso naquele ano era unicamente dos dois pilotos e os mandou embora sem dó. Pouco depois, ela anunciou Olivier Panis e Cristiano da Matta como os substitutos. Irritado, Salo falou horrores da equipe na imprensa. Por menos profissional que tenha sido sua reação, ela é justificável. Deve ser uma merda você parar tudo e ajudar a construir uma equipe para ser dispensado como um papel de sorvete.

3- KIMI RÄIKKÖNEN E JUAN PABLO MONTOYA

Alguns leitores poderão achar este caso estranho. Afinal de contas, Kimi Räikkönen e Juan Pablo Montoya não saíram da McLaren ao mesmo tempo. Montoya foi demitido logo após o Grande Prêmio dos EUA de 2006 e Kimi só caiu fora no final daquele ano. No lugar do grande latino-americano, entrou o eterno coringa Pedro de la Rosa. Que também não permaneceu no time em 2007. A McLaren apostou na superdupla Fernando Alonso e Lewis Hamilton.

É bom que se diga que a dupla Kimi e Juan Pablo também era uma grande aposta. O finlandês foi contratado a peso de ouro em 2002, quando ainda nem tinha pelo na cara ou sífilis. Teve um primeiro ano complicado mas levou um antiquado MP4-17 à disputa direta pelo título em 2003. No fim deste mesmo ano, a McLaren anunciou de maneira surpreendente a contratação de Montoya, que corria na Williams. Era um contrato tão valioso e tão crítico que só passaria a valer em 2005, mais de um ano depois. Agora vai, pensaram muitos.

Se estes muitos estavam esperando por vitórias constantes e títulos, então não foi. Na teoria, a dupla era realmente ótima. Kimi Räikkönen era o sujeito frio, circunspecto e muito rápido. Juan Pablo Montoya era o latino falastrão, passional e muito rápido. Juntos, eles formavam a armada que acabaria com o estafante domínio ferrarista. O problema é que até mesmo uma receita perfeita pode falhar.

Em 2005, Kimi Räikkönen foi o piloto mais veloz da temporada com alguma folga, tendo vencido sete corridas e feito cinco poles. Mesmo assim, ficou longe do título porque seu carro quebrava muito e o próprio Kimi não se safou de alguns erros. Enquanto isso, o outro piloto da McLaren se perdia em atuações ainda mais irregulares, comportamentos destemperados com sua equipe e curiosos acidentes de partidas de tênis. Montoya conseguiu a proeza de terminar o ano atrás de Michael Schumacher e sua Ferrari capenga. Ron Dennis achou o cúmulo, é claro. Não por acaso, ele assinou com Fernando Alonso para a temporada 2007 logo após o fim da temporada de 2005. Eita homem que gosta de contrato longo!

Em 2006, a dupla permaneceu a mesma. O carro, em compensação, piorou. Ficou bem lento. Räikkönen e Montoya só participavam das corridas visando pódios, muito pouco para dois astros absurdamente bem pagos. Para piorar, o colombiano só fazia bosta. Em Indianápolis, o cúmulo: na primeira curva da corrida, ele bateu justamente na traseira do companheiro, saindo ambos da competição. Foi a gota d´água. Após a corrida, Dennis o mandou embora sem culpa.  No fim do ano, ele também não fez questão de ficar com Kimi Räikkönen, que migrou para a Ferrari. A dupla Alonso/Hamilton era bem mais atraente. Será?

2- NIGEL MANSELL E RICCARDO PATRESE

Sir Frank Williams é coisa de louco. Pão-duro dos bons. Odeia conceder aumento a seus pilotos, especialmente quando eles ganham algum título e aumentam furiosamente sua cotação no mercado. Para o cadeirante, mais importante que um condutor competente é um carro veloz. Tendo um carro bom, qualquer um pode andar bem e ser campeão ou vice. Até mesmo Nigel Mansell e Riccardo Patrese.

Mansell e Patrese correram juntos na Williams em 1991 e 1992. Desfrutaram, portanto, dos melhores carros saídos do forno de Grove: o FW14 e o FW14B, verdadeiras maravilhas da engenharia. Ninguém dava muito crédito à dupla, experiente e de resultados irregulares. Mesmo assim, ambos fizeram um trabalho corretíssimo em 1991. Patrese fez talvez seu melhor ano na vida, peitou Ayrton Senna no início da temporada, ganhou duas corridas e ficou em um terceiro lugar bastante digno. Mansell fez uma excepcional metade de campeonato e chegou a Suzuka ainda sonhando pelo título. Perdeu, mas não ficou triste. Todo mundo sabia que 1992 seria dele.

Pois é. O FW14B era um carro violentamente rápido e estável. Nigel ganhou nada menos que nove corridas, fez inacreditáveis catorze poles e ganhou o título com cinco corridas de antecedência, lá no mês de agosto. Mesmo assim, a Williams não fez muita questão dele. Em Hockenheim, com uma mão e meia na taça de campeão, Mansell pediu 23 milhões de dólares para renovar o contrato para 1993. Seu salário era de 15 milhões. Frank Williams queria pagar “apenas” 16. Litigiosa, a discussão. Dias depois, Ayrton Senna apareceu e disse que correria de graça na Williams, tudo para tentar arranjar o carro dos sonhos. Para piorar, Alain Prost também estava no páreo para conseguir lugar na equipe.

Dois dias depois do título em Hungaroring, Mansell disse que pararia de correr se não renovasse com a Williams. Em Spa, quase todo mundo no paddock já sabia que Prost seria um dos pilotos da equipe em 1993. Em Monza, pouco antes da corrida, Nigel realizou uma entrevista coletiva e disse que estava caindo fora da Williams e da Fórmula 1. Não dá para dizer que a equipe se esforçou muito para segurá-lo. Quem precisa de Mansell quando se tem Prost e Senna disputando a tapa seu carro?

E o Patrese, coitado? Esse daí também estava na corda bamba, especialmente após ter obtido apenas uma vitória com seu impecável bólido. Sabendo que provavelmente não ficaria na Williams em 1993, ele se antecipou e assinou com a Benetton ainda em 1992. Tudo para tentar prolongar sua pequena carreira de mais de 200 GPs.

1- JEAN ALESI E GERHARD BERGER

O primeiro lugar não podia ir para outra dupla. Nos anos 90, Alesi e Berger eram quase como uma dupla sertaneja dessas que frequentavam o Sabadão Sertanejo. Eles foram companheiros de equipe durante tanto tempo que ninguém imaginava um sem o outro. E os dois simpáticos e velozes pilotos eram tão grudados por alguma energia obscura que até mesmo as demissões aconteciam em conjunto.

Alesi e Berger se encontraram pela primeira vez na Ferrari em 1993. Naquela altura, o francês já era um sólido funcionário da esquadra cavalesca e Gerhard buscava refúgio após três anos servindo como bonequinha de Ayrton Senna na McLaren. O relacionamento entre os dois começou bem, o que soava óbvio em se tratando de dois caras extremamente gente boa. Infelizmente, ambos faziam parte de uma Ferrari em processo de reestruturação. O clima estava pesadíssimo e isso obviamente afetou a amizade entre os dois.

1993 foi uma merda (especialmente para Berger), 1994 foi bem melhor (especialmente para Berger) e 1995 foi muito legal (especialmente para Alesi). Cada um ganhou uma corrida nestes três anos e a Ferrari realmente parecia estar retornando aos bons tempos. Só que havia um Michael Schumacher na jogada. Jean Todt e companhia estavam cansados dos dois “perdedores” que não traziam os resultados dignos da história da escuderia. O negócio era mandá-los embora e formar uma dupla que pudesse recolocar a equipe no caminho do sucesso. Esta dupla deveria ser composta por um gênio, Schumacher, e um capacho que trabalhasse para o gênio, Eddie Irvine. Alesi e Berger não faziam parte deste projeto, é claro. Rua para os dois.

Como a vida é brincalhona, os dois acharam espaço exatamente na Benetton de Schumacher. Aparentemente, Alesi e Berger teriam suas melhores chances na vida, pois estavam pilotando o carro da equipe campeã do mundo. A realidade, no entanto, não era tão rósea assim. Fora a quase-vitória de Berger em Hockenheim, a equipe não chegou sequer perto do topo do pódio em 1996 e teve de se contentar com apenas dez pódios e a terceira posição na tabela final.

Em 1997, Alesi quase teve o contrato rescindido antes mesmo do início da  temporada. Ele permaneceu, mas não agradou a ninguém e foi um dos personagens principais de uma crise que quase matou a Benetton naquele ano. Berger, por outro lado, reverteu o azar de 1996 e ganhou a corrida alemã após ter se recuperado de uma cirurgia. Os resultados de ambos não foram muito diferentes dos de 1996 e só restou à Benetton mandá-los para casa e trazer gente nova e mais motivada para o lugar. Os veteraníssimos deram lugar aos jovens Giancarlo Fisichella e Alexander Wurz. A parceria Alesi-Berger acabou aí. Estava na hora.

O tempo é escasso como água na Mauritânia, mas ainda consigo falar sobre os assuntos mais relevantes. E os menos também. Não vou largar isto aqui às varejeiras e às bolas de feno.

PIQUENIQUE

Chora, Jerôme!  Enquanto Mark Webber comemorava sua solitária e até certo ponto ilusória vitória e os mecânicos empacotavam tudo para voltar à Europa, a desnecessária Marussia Virgin decidiu que o epílogo do Grande Prêmio do Brasil era o melhor momento para anunciar o companheiro de Timo Glock no ano que vem. Que não será Jerôme D’Ambrosio.

Charles Pic, 21 anos. Será ele o novo segundo piloto da Marussia em 2012. O que dá para falar sobre ele? Não muito, infelizmente. Pic segue a mesma linha de seus antecessores, D’Ambrosio e Lucas di Grassi: é um piloto bom, discreto, de currículo correto e sem grandes apelos midiáticos ou comerciais. O que mais?

Assim como a esmagadora maioria de seus antigos colegas da GP2, Pic é rico. Muito rico. Mais rico que o Riquinho. Tão rico que sua família consegue custear também a carreira de seu irmão mais novo, Arthur, na World Series by Renault. Père Pic é dono de uma enorme empresa de transportes que atua em mais de quinze países, a Groupe Charles Andre. Por causa disso, o pequeno e descabelado Charles nunca precisou ralar muito para virar piloto. Poderia se preocupar apenas com seus carrinhos, suas aulas de esgrima e hipismo. Não sei se ele fazia esgrima ou hipismo, mas tudo bem. Todo rico gosta dessas merdas.

Além de grana, Charles Pic tem ótimos contatos. Quem o introduziu ao mundo do automobilismo foi seu padrinho, o ex-piloto Eric Bernard. Queira eu ter um padrinho que foi piloto de Fórmula 1 nos anos 90. Em 2002, Bernard lhe deu um kart de presente e Pic pôde iniciar sua profícua carreira no automobilismo. Hoje em dia, ele é assessorado por um ex-companheiro de Bernard na Ligier, o boa-praça Olivier Panis. Mas não dá para dizer que Le Petit Charles é apenas mais um playboy que se mete a correr de carro porque tem os amigos certos. Porque além de grana e contatos, ele também tem bastante talento.

Nosso jovem francês cresceu, amadureceu, nunca conheceu um barbeiro e subiu para os monopostos. Assim como Felipe Massa é dono do sexto lugar, Charles Pic parece gostar de um terceiro lugar nas tabelas. Na Fórmula Campus, terminou em terceiro em 2006. Na Fórmula Renault, terminou em terceiro em 2007. Na World Series by Renault, terminou em terceiro em  2009. Na GP2, ficou a um único ponto do terceiro lugar neste ano. Pela lógica, deverá terminar a próxima temporada da Fórmula 1 em terceiro. A matemática nunca falha.

Pic é o único estreante confirmado até aqui. Algo que me interessa bastante é o fato de ser, até agora, o único piloto francês assegurado para a próxima temporada. Você, leitor muito bem-informado deste sítio, sabe que a França está mandando ver no automobilismo de base. Romain Grosjean levou o título da GP2, Jean-Eric Vergne quase fez o mesmo na World Series e Jules Bianchi é o atual queridinho da Ferrari. Em termos de preferência popular, Charles Pic fica atrás de toda esta patota aí. Mas driblou todos eles e salvou seu lugar na Fórmula 1. Por enquanto, a torcida francesa vai para ele.

Como Pic pilotará pela pior equipe do campeonato, que só termina em último e sequer sabe parafusar direito uma roda, não podemos esperar muito dele em 2012. É verdade que a Marussia conseguiu se livrar de Nick Wirth e seu utópico sonho de projetar um carro sem túnel de vento e arranjou um acordo técnico com a McLaren, mas somente isso não será suficiente para transformá-la em uma equipe campeã do mundo. Falta mudar muita coisa. Para começo de conversa, eu mandaria aquele Richard Branson ir pastar. Em seu lugar, colocaria algum mafioso uzbeque no lugar. O dinheiro e a fanfarronice continuariam os mesmos, mas estou absolutamente certo de que somente a ausência daquele inglês metido a Peter Pan fará os carros serem um segundo mais rápidos, no mínimo.

Mais alguma coisa? No ano passado, Pic passou por uma situação bem desagradável em Istambul. Desagradável é um eufemismo, na verdade. Escrevi sobre isso aqui.

GELADEIRA

Mas ninguém está ligando para Charles Pic ou coisas do gênero. O povo quer saber mesmo é de Kimi Räikkönen. Pois ele voltou. Vai correr na Renault no ano que vem. E no outro. Ah, desculpe, chamei a Lotus de Renault? Sou meio burro e demoro um pouco para me acostumar com estas mudanças. Não é todo dia que equipe A rouba o nome de equipe B.

Acabou hoje uma das principais novelas desta silly season. O retorno de Räikkönen, na verdade, é conveniente para todos. A equipe terá um piloto de ponta que poderá recolocá-la no caminho das vitórias e ainda atrair as atenções. Por sua vez, o finlandês reencontrará uma motivação para sua vida. Nos últimos dois anos, Kimi fez algumas corridas no Mundial de Rali pela equipe júnior da Citroën e pela sua própria equipe, a Ice 1. Achou divertido no início, mas começou a se aborrecer com os vários acidentes, as dificuldades e as viagens a lugares inóspitos. Fora isso, ele também participou de uma corrida da NASCAR Truck Series em Charlotte. Também não deve ter gostado muito, pois não voltou mais para lá.

Kimi deve ter concluído que por mais que a Fórmula 1 seja um saco, não há lugar mais adequado para ele do que lá. Mesmo que todo mundo implique com seu laconismo, sua vida etílica ou seu descompromisso com as coisas mundanas. Imagino também que o fato da Fórmula 1 ter reunido um heptacampeão, dois bicampeões e dois campeões deve tê-lo motivado a voltar para provar que, sim, ele também pertence ao convescote. Também imagino que o dinheiro deve estar lhe fazendo falta. Räikkönen passou todo o ano de 2010 sendo pago pela Ferrari para não fazer nada na Fórmula 1. Neste ano, a fonte acabou. É hora de voltar ao batente para garantir o leite da criançada.

Antes de assinar com a Renault (dane-se, será chamada assim até quando eu quiser), Räikkönen conversou durante um bom tempo com a Williams. Frank Williams estava arquitetando a contratação do finlandês como uma forma de atrair investidores do Catar, manobra semelhante à feita por ele mesmo há trinta anos, quando convenceu um punhado de árabes a investir em sua equipe. Pois as conversas com a turma do Catar não avançou e a vinda de Kimi também acabou azedando. Hoje, a Williams pensa em um finlandês um pouco menos famoso, Valtteri Bottas. Motivos financeiros.

Na Renault, Kimi Räikkönen terá de trabalhar muito se quiser andar lá com a turma da frente. Neste ano, a equipe preta e dourada passou por maus bocados e só marcou 73 pontos. A Force India, que ninguém levava a sério até pouco tempo atrás, ficou apenas quatro pontos atrás. O R31, que pretendia homenagear as antigas Lotus patrocinadas pela John Player Special, não foi desenvolvido a partir da segunda metade da temporada. Com isso, ficou para trás e passou a levar porrada de Toro Rosso e Sauber, uma tristeza. E nem bonito o carro era. Aquelas asas avermelhadas comprometeram qualquer tentativa de se fazer uma pintura preta bonita.

No ano que vem, imagino que Kimi terá sua temporada mais difícil desde que Peter Sauber decidiu apostar no branquelo que havia assustado a Fórmula Renault britânica. A não ser que o R32 seja um milagre da engenharia, imagino que ele não terá muitas chances de passar para o Q3 das classificações e terá de se contentar com aqueles pontos magros da oitava posição para baixo. Ou seja, ele fará o mesmo papel de Michael Schumacher, só que um pouco piorado.

Teria o volátil Kimi Räikkönen humor para esse tipo de desafio? Para alguém que simplesmente desistiu de disputar um rali na Austrália por não ter a menor vontade de pegar um avião até lá, é meio difícil responder algo com certeza. Mas a Fórmula 1 é um outro planeta e as exigências são infinitamente superiores. E o finlandês sabe disso mais do que qualquer um. Se ele assinou com a Renault, é porque deve ter aceitado todos os desafios e os potenciais aborrecimentos que poderiam acontecer com ele nos próximos dois anos.

Ou ele estava bêbado quando assinou. O que também não é improvável.

BURAJIRU

Como eu não vou conseguir dar notas para a corrida deste fim de semana, prefiro fazer um apanhado geral sobre tudo o que aconteceu. O Grande Prêmio do Brasil, última etapa da temporada 2011, foi vencido pelo australiano Mark Webber, segundo piloto da Red Bull. Ele venceu após o pole-position e líder Sebastian Vettel ter começado a apresentar problemas de vazamento de óleo do câmbio. Solidarizo-me com Vettel. Meu Corsa também está apresentando vazamento de óleo do câmbio e está cada vez mais difícil engatar as marchas daquela porra. Nunca perdi uma vitória em Interlagos por causa disso, mas nunca se sabe quando isso pode acontecer.

Foi uma corrida chata. As provas em Interlagos têm sido assim desde 2009, aliás. Aquela coisa de definir o título mundial na última curva aconteceu somente uma vez e, não, não voltará a se repetir. Neste ano, ficamos todos esperando pela tempestade. Ela caiu – na Zona Norte, no Centro, na Zona Oeste, na Zona Leste e aqui em Campinas. Por pouco, fiquei sem sinal para ver a corrida. A Zona Sul sobreviveu sequinha nos três dias de treinamentos, mesmo com todas as precisas observações meteorológicas do narrador oficial, que diz que a chuva vem da represa. E sem chuva, não dá. Temos, no máximo, uma corrida mediana, facilmente esquecível.

Vettel finalizou em segundo. Mau resultado para alguém que ganhou onze corridas só neste ano, mas um alívio que compensou a rodada na primeira volta na corrida de Abu Dhabi. Jenson Button pegou o último lugar do pódio e garantiu o vice-campeonato. Logo atrás, Fernando Alonso, que protagonizou, ao meu ver, a melhor cena da corrida, uma ultrapassagem por fora sobre Button no Laranjinha. Por mais que sua Ferrari estivesse em melhores condições, qualquer um que executa esse tipo de manobra naquele ponto merece respeito.

Massa? Finalizou em quinto. Ficaria em sexto, mas Lewis Hamilton teve um problema de sei-lá-o-quê e acabou alijado da disputa. O brasileiro não fez uma má corrida, mas não teve cacife para pleitear algo melhor. Os demais brasilianos tiveram uma corrida laboriosa até demais. Rubens Barrichello fez um ótimo 12º tempo na classificação, mas largou primorosamente mal e comprometeu qualquer chance de pontos. Esta foi, provavelmente, sua última corrida, uma pena. Bruno Senna foi a sensação do treino oficial, mas acabou com suas chances de pontos ao bater com Michael Schumacher na freada do S do Senna. Foi considerado culpado e teve de pagar uma punição.

O melhor brasileiro no domingo foi Nelson Piquet, é claro. O tricampeão do mundo foi a grande atração do fim de semana ao dar quatro voltas com o Brabham BT49C que lhe proporcionou seu primeiro título mundial em 1981. Felizmente, o público correspondeu aplaudindo o cara de pé. Piquet merece toda e qualquer homenagem.

Em entrevista à TV, a boa filha boa Julia Piquet afirmou que Nelsão prometeu durante toda a semana que levantaria a bandeira do Vasco da Gama, que está disputando o título do Campeonato Brasileiro com o Corinthians e o perderá infalivelmente no próximo fim de semana. Pois não é que ele fez mesmo? Após as primeiras voltas, Piquet sacou do bolso uma pequena bandeira do Vasco e a exibiu para todos. Mesmo em território paulista, todo mundo achou o máximo. E a manifestação deu resultado. O Vasco conseguiu vencer seu jogo contra o Fluminense no último minuto da partida, o que tirou o título antecipado do Corinthians na bacia das almas. Não foi o Hamilton que ganhou uma camisa do Vasco no ano em que ele obteve o título na última curva?

Ao descer do carro, lá veio a saltitante repórter da emissora oficial. “Piquet, chegou a se emocionar? Deu vontade de chorar?”. A resposta só comprovou que, mesmo próximo dos 60 anos de idade, Nelson continua sendo um dos sujeitos mais afiados que o automobilismo mundial já conheceu:

“Não. Tem que chorar de coisa ruim. De coisa boa, tem de rir”. Gênio.

Kimi Räikkönen, que pode voltar à Fórmula 1 pela Williams no ano que vem. A silly season fica, com isso, um pouco mais bagunçada

A verdade é uma só: faltam vagas na Fórmula 1 de 2012.

Parece um raciocínio economicista, mas não posso fazer nada, treinado que fui na área. Vamos dizer que a disposição de pilotos na Fórmula 1 é pautada por um equilíbrio entre oferta de vagas por parte das equipes e demanda por parte dos pilotos de dentro e de fora da categoria. Em alguns momentos, há um equilíbrio claro: todo mundo que faria falta na Fórmula 1 está correndo.

Exemplos? Tenho duas temporadas em mente, 2001 e 2006. Em 2001, a Fórmula 1 tinha Schumacher, Montoya, Ralf, Barrichello, Coulthard e Häkkinen nas três equipes de ponta. Alguns menos, outros mais, todos os seis eram bons o suficiente para estarem onde estavam. Mais para trás, a velha guarda era representada por Alesi, Frentzen, Irvine, Panis, Verstappen, Bebeto e Romário.  Aquela geração formada na segunda metade dos anos 90 que já não era mais a dos caçulas da classe era composta por Villeneuve, Trulli, Fisichella, Marques, De La Rosa, Mel B e Mel C. E a creche era dominada por Button, Alonso, Räikkönen, Bernoldi, Heidfeld, Burti, Tiazinha e Feiticeira.

Não faltava ninguém. Talvez com exceção do Mika Salo, todo mundo que deveria estar na Fórmula 1 havia encontrado lugar em 2001. E sobrava espaço até mesmo para um bônus como Tarso Marques ou Enrique Bernoldi.

Em 2006, o grid também estava, digamos, completo. Schumacher, Alonso, Räikkönen, Montoya e Massa estavam lá. Ralf, Fisichella, Villeneuve, Heidfeld, Button, Webber e Trulli também. Barrichello e Coulthard também. Rosberg e Kubica também. Sato, Klien, Liuzzi, Speed, Montagny, Yamamoto, Albers e Monteiro também. Sabe de uma coisa? Só dois pilotos realmente faziam falta aí: Vettel e Hamilton. Um começou a testar com a BMW Sauber no mesmo ano e o outro já estava sendo preparado pela McLaren para estrear no ano seguinte.

Espero que entendam o que eu quis dizer. Tanto 2001 como 2006 foram anos nos quais não enxergamos um sem-número de pilotos competentes, promissores ou experientes disputando uma ou outra vaga média a tapa. No fim, todo mundo que era relevante encontrava algum lugar à sombra. E chegávamos a uma situação de equilíbrio.

Não é o que está acontecendo agora. Desde que comecei a ver corridas de Fórmula 1, nunca vi uma Fórmula 1 com tanta gente querendo uma vaga e com tão poucas vagas disponíveis. Na economia, diríamos que vive-se um momento de desequilíbrio em que a demanda é bem maior que a oferta. Todo mundo quer, mas pouca gente consegue, essa é a tônica da Fórmula 1 em 2012. E as disputas pelas migalhas estão ficando cada vez mais acirradas.

Este seria o carro que Kimi poderia ocupar no ano que vem

Nos últimos dias, quem voltou com tudo ao noticiário do automobilismo é Kimi Räikkönen, o próprio. Imaginem vocês que um jornal finlandês, o Ilta Sanomat, divulgou que o ébrio campeão de 2007 já havia assinado com a Williams para a próxima temporada. Quem entregou o suposto furo foi ninguém menos que o ex-piloto Takachiho Inoue. Aquele que foi atropelado por um carro de serviço na Hungria? Ele mesmo, bonobos! Taki, que trabalha atualmente como agenciador de pilotos, teria postado em seu Twitter que Kimi já havia assinado o acordo com a equipe de Frank Williams.

Muita gente pediu um pouco de calma acerca da validade da notícia, já que o Twitter de um condutor barbeiro dos anos 90 não é a fonte mais confiável da galáxia. Pois eu sou da turma dos impressionistas. Onde há fumaça, há fogo. É consenso geral que Räikkönen participou de um chá das cinco regado a uísque escocês com os homens da Williams. A reunião pode ter sido tanto uma discussão sobre um contrato para a próxima temporada como um bate-papo descompromissado sobre o Campeonato Brasileiro e a queda do ministro Orlando Silva. Kimi não entende nada de futebol ou de política. Só por isso, acredito que ele foi a Grove falar sobre seu futuro com a Williams.

Da mesma forma, é consenso geral que Kimi anda se preparando fisicamente com mais frequência e intensidade do que nos últimos tempos. Não creio que ele esteja com qualquer intento narcisista, isto é, ele não quer ganhar músculos para agradar à mulherada. Também não acho que seja necessário ter um preparo físico tão impecável para correr na NASCAR Truck Series, onde metade do grid está muito acima do peso, ou no WRC, lembrando que grandes nomes como Tommi Mäkinen e Juha Kankkunen não tinham um porte exatamente atlético. Somente uma categoria no automobilismo mundial requer níveis tão elevados de preparo físico: a Fórmula 1.

Também é consenso geral que Kimi já se encheu de sua nova vida como aposentado milionário e descompromissado. Tal como Michael Schumacher, que voltou à Fórmula 1 por concluir que não levava jeito para participar de peladas dominicais, pescar e cair de moto, Räikkönen não está mais com a mesma empolgação do início de 2010, quando ele abandonou a categoria maior para matar sua vontade de ser piloto de rali. O piloto finlandês participou de toda a temporada 2010 pela equipe satélite da Citroën, sofreu muitos acidentes e aprendeu o suficiente para, neste ano, abrir sua própria equipe, a Ice 1 Racing.

Só que as coisas mudaram um pouco para Kimi Räikkönen em 2011. Aquela multa caríssima que a Ferrari era obrigada a lhe pagar no ano passado para colocar Fernando Alonso em seu lugar chegou ao fim, e o nórdico se viu sem sua grande galinha dos ovos de ouro. Gerenciar a Ice 1 também não estava tão interessante assim. Kimi chegou a faltar à etapa australiana do WRC por pura falta de vontade de viajar para os confins do planeta. Por ter se inscrito com antecedência, ele e sua equipe acabaram punidos pela ausência. Fora isso, o cara também disputou uma etapa da NASCAR Truck Series em Charlotte. Pelo visto, não gostou muito, pois nunca mais falou em competir nos Estados Unidos.

Robert Wickens, um dos grandes talentos que poderiam ficar sem lugar na Fórmula 1 em 2012

A verdade é que, sem dinheiro e sem grandes motivações para seguir correndo aonde lhe dava na telha, Räikkönen deve ter percebido que a Fórmula 1 lhe faz alguma falta. Não a política, as obrigações, as pessoas lhe cobrando um comportamento menos arisco, as frescuras típicas da categoria ou os colegas de profissão. Kimi precisa é ganhar o seu. Fora isso, competir contra um dos melhores plantéis que a Fórmula 1 já teve deve ser muito mais empolgante do que disputar ralis solitários ou andar em círculos lá no meio da caipirada norte-americana.

Chega a ser curioso que a Williams seja sua provável equipe em 2012, pois simplesmente não haveria dinheiro por lá para contratá-lo. Mas Frank Williams é homem vivo e vivido. Ele quer Kimi Räikkönen como um chamariz para patrocinadores polpudos, como um banco do Catar que poderia patrocinar a equipe caso ela tivesse um grande piloto sob sua égide. Sir Frank joga um ali para colher dois acolá. A conferir.

O retorno de Kimi Räikkönen à Fórmula 1 seria muito interessante porque a categoria chegaria ao número cabalístico de seis campeões do mundo, um recorde em sua história. Mais ainda: se os seis estiverem presentes, será possível dizer que todos os títulos desde 2000 foram conquistados por algum piloto em atividade. Não serve para nada, mas é legal. Só que a presença de Kimi poderá trazer um efeito colateral bem desagradável.

Se Kimi entrar na Williams para correr ao lado de Pastor Maldonado, o pessoal do Movimento Sem Vaga teria uma a menos à disposição. O veterano finlandês deixaria para trás uma série de pilotos jovens que precisam de uma chance razoável e outra série de pilotos experientes que precisam de um lugarzinho para esticar a carreira por mais algum tempo. De um lado, choram Nico Hülkenberg, Romain Grosjean, Jerôme D’Ambrosio, Bruno Senna, Davide Valsecchi, Giedo van der Garde, Sam Bird, Jules Bianchi, Stefano Coletti e Valtteri Bottas. Do outro, esperneiam Rubens Barrichello, Nick Heidfeld, Adrian Sutil, Vitaly Petrov e até Robert Kubica. Todos eles foram mencionados em algum momento, seja em uma nota séria ou em um boato infundado. Mas não dá para negar uma coisa: quase todos eles, se não todos, realmente estão buscando uma vaga na Fórmula 1.

São poucas os carros disponíveis. Há quem diga que nem Nico Rosberg e nem Michael Schumacher estão garantidos na Mercedes, mas isso daí é besteira. Norbert Haug ama o primeiro e Ross Brawn idolatra o segundo. A Renault poderia abrir uma ou até duas vagas, mas depende da recuperação de Robert Kubica e da situação financeira de Vitaly Petrov perante outros pilotos. Na teoria, ambos possuem contratos com a equipe gaulesa e, se tudo der certo, deverão correr em 2012. Sendo honesto, acho que é isso mesmo que vai acontecer. Romain Grosjean e Bruno Senna podem sentar lá na tarjeta e chorar.

Creio haver uma vaga disponível também na Force India, a de Adrian Sutil, mas ela deverá ser ocupada por Hülkenberg – e Sutil seria mais um a compor a lista dos desesperados por uma vaga na Williams. A Virgin, que não tem muita paciência, deve mandar D’Ambrosio para casa. No lugar, poderiam vir Charles Pic, Robert Wickens ou Giedo van der Garde. São três pilotos bons se matando por um carro que vai andar em 22º na maior parte do tempo. Há algo errado.

Será que realmente vale a pena deixar um jovem talento de fora pelo capricho de ter um heptacampeão quarentão no grid?

O errado é que sobram pilotos e faltam carros. Devemos, é claro, agradecer este problema aos velhotes egoístas que não largam o osso. Michael Schumacher, 42, ocupa um carro muito interessante para um novato, mas aquém de um sujeito que já foi heptacampeão mundial. Rubens Barrichello, 39, está há quase vinte temporadas consecutivas na Fórmula 1 e não tem muito mais a fazer, mas também não quer se aposentar. Jarno Trulli, 37, acha bonito ficar andando lá no fim do grid com o carro da Lotus. Nick Heidfeld, 34, também já não tem muito o que almejar se conseguir voltar à Fórmula 1. Por mais que eu torça para Heidfeld, Barrichello e Schumacher, admito que o ideal seria os três e o Trulli darem espaço para novatos que poderiam aproveitar a chance para construir uma carreira bem-sucedida.

Além disso, os contratos estão muito longos. Fernando Alonso e Jenson Button, por exemplo, assinaram acordos que terminarão daqui a uns quatro ou cinco anos, sei lá. Nico Rosberg deve seguir o mesmo caminho. E não dá para não imaginar que Sebastian Vettel e Lewis Hamilton também renovem os contratos com suas respectivas equipes por mais umas duzentas temporadas. Mark Webber e Felipe Massa, que poderiam ter aberto duas vagas ótimas para o ano que vem, renovaram com suas equipes e ficarão mais um ano na mesma. O primeiro entrou na Red Bull em 2007. O segundo é ferrarista desde 2006. Para que a permanência de ambos em detrimento da entrada de dois jovens leões tenha valido a pena, Webber e Massa teriam de mandar muito bem em 2012. Honestamente, quem aposta nisso?

Mesmo lá embaixo, os contratos andam truncados. Pastor Maldonado e Timo Glock assinaram contratos quase tão longos quanto os de Alonso e Button – nem dá para entender o porquê, já que ficar preso à Williams e à Virgin por tanto tempo não soa muito interessante hoje em dia. Na Sauber, creio que Peter Sauber irá se esforçar ao máximo para manter sua promissora dupla por um bom tempo. E a Toro Rosso só troca pilotos da Red Bull por pilotos da Red Bull. Quem não pertence à panelinha dificilmente pode contar com alguma coisa lá. E quem pertence tem de rezar por uma vaga na equipe italiana ou por um bico na HRT, o que não anima ninguém.

Com isso, a possibilidade de ascensão por parte de estreantes se reduz drasticamente. Da GP2, creio que só Romain Grosjean teria alguma chance mais concreta em uma equipe média. Outros que poderiam entrar são Charles Pic e Giedo van der Garde, mas ambos só conseguiriam lugar nos cacarecos do fim do grid por meio da grana. Da World Series, poderiam vir o campeão Wickens, que vive de mãos atadas à Virgin, e o geniozinho rubrotaurino Jean-Eric Vergne. Mas está difícil até para eles.

O caso é que 24 carros já não são o suficiente. Em outros verões, eram. A Fórmula 1 precisa de mais equipes para comportar tantos talentos. Só assim para a ilustre presença de um Räikkönen ou um Schumacher não expelir um Wickens ou um Grosjean.

Eu realmente estou meio sem inspiração nestes dias para um Top Cinq. Afinal, não há nenhum assunto legal que valha a pena hoje. Falar de Vettel, Button ou Hamilton já encheu o saco, convenhamos. Por isso, faço uma viagem pelo tempo. Eu já tinha feito listas sobre meus cinco carros favoritos lá no fundão e lá no meião do grid há algum tempo. Hoje, volto a fazer uma lista dessas.

Dessa vez, comento um pouco sobre cinco dos carros de ponta que eu mais gosto. Só um detalhe: nenhum deles foi campeão de pilotos ou construtores. Estes foram bólidos muito velozes que permitiram grandes resultados, mas não o título. Em alguns casos, faltou um pouco mais de velocidade. Em outros, faltou confiabilidade. Em outros, faltou piloto. O caso é que o pacote nunca estava fechado. Mas sobrou beleza.

Então, vejam a lista e digam o que acham. Só uns parênteses: não, não coloquei nenhuma Lotus preta e dourada patrocinada pela John Player Special. Nada contra a Lotus, acho a lendária pintura sensacional, mas tenho outros carros em minha preferência. Confiram aí:

5- BRABHAM BT54 (1985)

Em 1985, o então bicampeão mundial Nelson Piquet já estava meio que de saco cheio da Brabham. Embora ficasse maravilhado com a imponente estrutura da equipe, achasse o bigode de Gordon Murray um luxo e admirasse a capacidade de Bernie Ecclestone em sugar os outros com contratos leoninos, Piquet já havia chegado a um ponto em que precisava de novos ares. Ele continuaria na equipe naquele ano, mas já procurava uma nova casa para 1986.

Além disso, a Brabham passava por um período meio conturbado em termos financeiros: a Parmalat havia abandonado a equipe no final da temporada de 1984 e ela ficou um tempo sem um patrocinador principal antes de conseguir um acordo com a Olivetti. Antes das máquinas de escrever italianas, a mídia dizia que a Brabham seria vendida à Ford e teria como patrocinador principal as caríssimas garrafinhas de água da Perrier. Quer dizer, incertezas demais para uma equipe só. Que acabou não conseguindo fazer um carro à altura da igualmente poderosa McLaren.

Vamos falar do BT54, então. Desenvolvido pelo egrégio Gordon Murray, o Brabham BT54 tinha como grande novidade técnica a adoção dos pneus Pirelli em substituição aos Michelin do ano anterior. Muita gente contestou a escolha, já que as demais equipes de ponta utilizavam Goodyear, mas Bernie Ecclestone só fazia suas escolhas baseado em questões econômicas, como sempre. Borracharia à parte, milhões de dólares foram gastos no desenvolvimento do novo chassi e de um novo sistema de transmissão. O motor ainda era o BMW, que alcançava 800cv na corrida e mais de 1.000cv nos treinos oficiais. Na pré-temporada, o otimismo era explícito. “Este carro é muito mais fácil de pilotar que o anterior”, garantiu Piquet. “Ele é ao menos um segundo mais veloz que o carro do ano passado”, celebrou o chefe Herbie Blash.

Infelizmente, as boas expectativas não corresponderam à realidade. Piquet teve uma temporada terrível, marcou apenas 21 pontos e ganhou apenas uma única corrida, o GP da França em Paul Ricard. O grande calcanhar de Aquiles do BT54 eram justamente os pneus Pirelli, muito ruins em pistas mais abrasivas, na chuva ou em temperaturas mais baixas. O novo câmbio também era extremamente frágil e quebrou bastante nas mãos de Piquet e de seus companheiros, François Hesnault no início da temporada e Marc Surer no final. O chassi, no entanto, era muito bom e funcionava muito bem em pistas velozes. A receita para a vitória em Paul Ricard estava aí: chassi bom em pistas de alta, motor BMW potentíssimo, pneus adequados para uma pista pouco abrasiva e muito quente e piloto com ótimo retrospecto nos traçados velozes. O restante do ano, todavia, foi muito fraco. Registro aí as linhas modernas e a clássica combinação de cores da equipe. Para mim, a Brabham faz até mais falta que a Lotus.

4- MCLAREN MP4/20 (2005)

Um carro absurdamente bonito e que me passava enorme sensação de velocidade. Este era o McLaren MP4/20, utilizado pela equipe inglesa na temporada de 2005. Eu não sou desses que conseguem captar detalhes de comportamento de um bólido facilmente. No entanto, especialmente nos treinos classificatórios, a diferença entre o MP4/20 dos outros carros era gritante. O carro prateado e preto freava depois e reacelerava antes de qualquer outro carro, parecia contornar as curvas de baixa e média velocidade totalmente acelerado e cruzava as retas como um tiro de rifle. Não me assusta o fato de ter galgado dez vitórias, oito poles e doze voltas mais rápidas.

O MP4/20 foi um dos últimos carros desenvolvidos por Adrian Newey na McLaren. Após o fracasso retumbante do MP4/19 em 2004, Newey decidiu criar um carro do zero a partir das novas regras da temporada que viria. Entre elas, a vida útil do motor deveria ser estendida de um para dois fins de semana de corrida, a asa dianteira deveria ser mais alta, a asa traseira deveria ser menor e, o mais importante, as trocas de pneus estariam abolidas durante a corrida. O piloto completaria os 300km de prova com o mesmo jogo de pneus. Em 2005, a confiabilidade era um fator bem mais importante que a velocidade. Foi aí que a McLaren perdeu.

O carro teve sua asa dianteira levantada em 5cm, a altura do difusor traseiro diminuída para 12,5cm e a asa traseira afastada em 15cm. Um novo conjunto de suspensões foi desenvolvido para reduzir ao máximo o consumo dos pneus Michelin. Além disso, a equipe inovaria com um par de asas colocado nas laterais superiores. Pelo formato das asinhas, o MP4/20 ganhou um quê de barco viking. Muita gente achou feio. Eu gostei.

O carro realmente ficou rápido, embora tenha perdido tanto em confiabilidade quanto em performance para a Renault nas primeiras corridas. Com o passar das provas, a velocidade aumentou drasticamente, mas os problemas mecânicos continuaram. O motor Mercedes foi um das partes mais complicadas: ele era muito potente, mas quebrava demais. Estes problemas de motor afetaram os treinos de classificação de Kimi Räikkönen em Magny-Cours, Hockenheim, Monza e Suzuka. Mas o mais assustador foi a quebra da suspensão dianteira na última volta do GP da Europa, corrida na qual Kimi liderou quase de ponta a ponta. A suspensão explodiu após o carro sofrer com vibrações fortíssimas em decorrência do desgaste dos pneus nas últimas voltas. Enfim, muito contratempos para um carro tão bonito.

3- WILLIAMS FW14 (1991)

Em certa ocasião, Riccardo Patrese comentou que o Williams FW14 chegava a ser desconfortável de tão rápido que era nas curvas. O italiano tinha toda a razão. Este belíssimo carro azul, amarelo e branco, desenvolvido pelo inabalável Adrian Newey, foi um dos mais sofisticados e velozes da história da categoria. Ele só não ganhou os títulos de pilotos e construtores de 1991 porque teve como adversário maior Ayrton Senna. Nigel Mansell e Riccardo Patrese, os dois pilotos, precisavam de um carro ainda melhor para bater o brasileiro. E ainda há quem me xingue por contestar o Leão.

O FW14 era bom demais. Teve seus problemas de confiabilidade no início da temporada, mas era um carro para ser campeão do mundo com folga. Para começar, o motor V10 da Renault pesava apenas 136kg (bem menos que o Honda V12, por exemplo) e rendia por volta de 750cv. A gasolina especial Elf era considerada a melhor da Fórmula 1. A suspensão ainda não era ativa, mas já estava toda preparada para receber o sistema em 1992. O câmbio, de seis marchas, era semiautomático. O bico, embora diretamente ligado à asa dianteira, era razoavelmente alto, característica criada por Newey na March que permitia uma penetração otimizada do fluxo de ar. A refinada parte traseira finalizava o trajeto suave do fluxo. O radiador era menor e mais compacto, de modo a reduzir o peso. Não havia defeitos. Era um carro aerodinamicamente impecável dotado de um motor perfeito e uma gasolina poderosa.

Pode-se dizer que o grande problema do FW14 foi a confiabilidade do câmbio semiautomático no início do ano. Em Phoenix, os próprios Nigel Mansell e Riccardo Patrese declararam no briefing dos pilotos, realizado horas antes da largada, que os dois carros teriam quebras nas marchas mais altas do sistema de transmissão. Não deu outra: o câmbio deixou os dois na mão. Mas a Williams não demorou muito para resolver o problema e, uma vez solucionado, o FW14 simplesmente esmigalhou a McLaren especialmente no meio da temporada.

Infelizmente para a equipe de Frank Williams, Mansell não conseguiu se aproximar o suficiente de Ayrton Senna na pontuação e ainda cometeu um erro fatal em Suzuka, o que garantiu o terceiro título ao paulistano. Com o perdão dos fãs de Nigel e Riccardo, o maior problema do belíssimo carro estava justamente entre o banco e o volante.

2- BENETTON B188 (1988)

Já devo ter comentado aqui que gosto muito de monopostos com pinturas cheias de cores diferentes. Desde criança, sempre gostei desse negócio de cores. Não por acaso, duas das minhas equipes favoritas naquela época eram as sempre coloridas Benetton e Larrousse. Mas foi a primeira, que representava uma das maiores grifes de roupas do planeta, que ficou com a fama de ter os visuais mais inusitados do grid. No fim dos anos 80, a “United Colors of Benetton” colocava nos grids da Fórmula 1 dois carros com pintura verde, amarela, vermelha e azul.  Não há como não gostar disso.

O Benetton B188 foi o mais bonito dos carros de Luciano Benetton, ao meu ver. Em 1988, este foi considerado um dos chassis mais harmônicos e sofisticados de todo o grid. Vale lembrar que o McLaren MP4/4 basicamente aproveitava a ideia do “carro-skate” desenvolvida por Gordon Murray na Brabham em 1986 e tanto o Ferrari 88C como o Lotus 100T eram chassis tenebrosamente ruins. Só que faltou ao Benetton o que estes três outros carros tinham: um motor turbo. O B188 utilizava um Ford Cosworth DFR V8 de cinco cilindros por válvula, com cabeçote desenvolvido pela Yamaha. Em termos de velocidade em reta e em curvas velozes, não dava para sonhar em competir com os motores turbinados da Honda e da Ferrari.

O projetista sul-africano Rory Byrne conseguiu compensar a falta de fôlego com um chassi tão bonito quanto competente. Baseado no Benetton B187 do ano anterior, ele tinha algumas soluções bem interessantes. Como o regulamento de 1988 exigia que os pés do piloto deveriam ficar atrás do eixo dianteiro, Byrne deu um jeito de empurrar para trás a posição do piloto sem aumentar a distância entre eixos. Ele decidiu refazer todo o sistema de suspensões dianteiras e ainda criou um esquema de amortecedores que ficavam dentro do nariz do carro. Além disso, o B188 teria um inovador sistema de transmissão longitudinal cujas dimensões eram tão compactas quanto às de um convencional sistema transversal. Por fim, o bico foi bastante afilado – tendência copiada posteriormente por outras equipes.

Os subestimados Thierry Boutsen e Alessandro Nannini lograram realizar um bom ano com o belíssimo B188. Boutsen, mais constante e mais conservador, conseguiu cinco pódios e terminou o ano em quarto. Nannini, muito mais agressivo, obteve apenas dois pódios, mas chamou a atenção de muita gente com corridas arrojadas e belas disputas. A Benetton terminou o ano como a terceira colocada, tendo um carro tão reverenciado quanto o impecável MP4/4. Com a vantagem de ser bem mais bonito.

1- FERRARI 640 (1989)

Eu não gosto da Ferrari. Nunca fui muito fã. Sendo bem injusto com o notório entusiasta da velocidade Enzo Ferrari, sua marca sempre esteve associada aos novos-ricos que viajam para Miami para comprar duas dúzias de tênis Nike. E eu também não sou muito fã de carros avermelhados – é uma cor meio saturada, sabe? Mas devo dizer que um dos meus bólidos de Fórmula 1 preferidos de todos os tempos é a Ferrari 640 pilotada por Nigel Mansell e Gerhard Berger em 1989.

Eu olho para este carro e não sei definir bem o que sinto por ele. É como se tudo aquilo que Enzo Ferrari esperasse de um veículo de competições estivesse materializado ali. A cor vermelha, forte e sóbria. A suavidade das linhas aerodinâmicas, que forma um único corpo homogêneo apelidado de “garrafa de Coca-Cola”. O motor V12, de ronco bravo e rasgado. A tecnologia, materializada no revolucionário câmbio semiautomático. As asas pretas. Os poucos patrocinadores, quase todos relacionados ao mundo automobilístico. O vivaz cavalo voador. Os belos capacetes de Berger e Mansell são a cereja do bolo. Que me perdoe a Williams FW14, mas o carro de Fórmula 1 perfeito é o 640.

John Barnard foi o grande responsável pela belezinha. São tantas novidades em relação ao infeliz 88C do ano anterior que fica até difícil apresenta-las em tão pouco espaço. Para começar, o harmônico chassi tinha um formato que lhe garantiu o apelido de “garrafa de Coca-Cola” citado lá em cima. Ele começava com um bico fino, afiado e retangular, abria-se com uma lateral alta, estreita e de formato convexo que se afunilava gradativamente até a parte traseira, também retangular. É impossível não achar este desenho bonito. Impossível.

O tanque de combustível era dividido em três: uma parte no meio do chassi e as outras duas posicionadas nas duas laterais, o que explica o fato delas serem altas. Para comportar estes tanques, os radiadores foram diminuídos. A entrada de ar ficava posicionada nas laterais, mas John Barnard decidiu colocá-la no santantônio a partir do GP do México. O sistema de amortecedores também era inovador, com as molas posicionadas horizontalmente dentro do bico e sobre o câmbio. O motor V12 retornava a cena, produzindo animadores 660cv.

Mas a melhor novidade da Ferrari 640 era, sem dúvida, o sistema de câmbio semiautomático, uma das maiores revoluções da história da Fórmula 1. Ele substituía a alavanca por duas borboletas posicionadas atrás do volante. Para subir uma marcha, bastava apertar a borboleta da direita. Para descer, bastava apertar a da esquerda. Simples, como em uma moto. Mas mesmo uma coisa simples dessas confundiu a cabeça do nosso querido Nigel Mansell, sujeito canhoto e meio atrapalhado. A Ferrari resolveu o problema entregando-lhe duas luvas com cores diferentes. Para subir uma marcha, cor tal. Para descer, a outra cor. Agora, sim

Mal sabia a equipe que este seria o menor dos problemas relacionados à transmissão semiautomática. Graças a ela, a Ferrari teve um enorme número de abandonos durante o ano, notadamente com Gerhard Berger. Mesmo assim, a escuderia conseguiu vencer duas corridas com Mansell em Jacarepaguá e em Hungaroring e outra com Berger no Estoril. Fora que foi a equipe que, de longe, mais deu trabalho à McLaren em termos de desempenho. Se o 640 não tivesse quebrado tanto, a escuderia italiana não teria ficado 18 pontos atrás da Williams no campeonato.

Paciência. O que resta é contemplar a beleza do carro.

Coloquem suas listas. Prometo que faço um Top Cinq com os carros mais escolhidos. Prometo.

GP DO JAPÃO: Vou te dizeruma coisa. Hoje em dia, só há um circuito que me parece desafiador e perigoso o suficiente para fazer um piloto relutar em acelerar mais ou frear menos em determinada curva. Não, não me refiro a Spa-Francorchamps, que nem anda proporcionando tantos desafios assim. Suzuka é uma das pistas mais temerárias do planeta. Anda-se muito rápido por lá e as pancadas são sempre fortes, dessas que doem até em nós. Antigamente, o GP do Japão era um dos mais esperados por duas razões em especial. Além de ter sido uma das poucas corridas noturnas durante um bom tempo, a prova costumava definir os títulos mundiais até alguns anos atrás – Ayrton Senna, por exemplo, confirmou seus três títulos no arquipélago. Infelizmente, após ter sido trocada por Fuji durante dois anos, Suzuka nunca mais conseguiu ter uma boa corrida, graças à dificuldade de se ultrapassar por lá. E os fãs mais novos tendem a achar até mesmo que a lendária pista japonesa é ruim e deveria sair do calendário. Considerando que alguns desses fãs mais novos devem ter ido ver o show do Justin Bieber ontem, creio que a criançada, por princípio, está errada.

RADIOATIVIDADE: Em 1986, o Grande Prêmio da Ucrânia, que seria sediado nas ruas de Kiev, foi cancelado graças à explosão do reator quatro da Usina de Chernobyl (pronuncia-se “tchernóbil”). Mentira, a Fórmula 1 nunca sequer sonhou em correr na Ucrânia, o que nos priva de contemplar algumas das melhores grid-girls do mundo. Em compensação, o Japão vive sob constante estado de alerta graças ao sério vazamento nuclear proveniente da usina de Fukushima, danificada após o terremoto seguido de tsunami no início do ano. Os europeus, temendo a assustadora possibilidade de orelhas nascendo na bunda, estão tomando todas as precauções necessárias, e mais algumas. O jornal alemão Bild am Sonntag afirmou que a Red Bull Racing está levando comida da Europa e também está orientando aos seus funcionários para que não inventem de comer nada diferente daquilo que a equipe está levando. A própria Red Bull desmentiu que estava fazendo isso, mas eu não duvidaria. Se considerarmos que, quando a MotoGP esteve em Motegi, Jorge Lorenzo só tomou banho com água engarrafada e Dani Pedrosa jogou todas as suas roupas fora, a sempre paranoica Fórmula 1 não poderia ficar atrás no excesso de cuidados.

UM: Um ponto. Nas próximas cinco corridas, Sebastian Vettel precisará de um único e estúpido ponto para ser bicampeão. Para perder o título, Sebastian teria de deixar de marcar pontos em todas as etapas daqui em diante e o inglês Jenson Button teria de vencer todas as corridas até o final. Portanto, é mais fácil nascer um pé de rabanete em plena Avenida Paulista. Só para desanimar mais um pouco o playboy da McLaren, a última vez que Vettel terminou fora dos pontos foi na Bélgica no ano passado, quando ele cruzou a linha de chegada em 15º após se envolver em um choque com o mesmíssimo Button. Fora isso, ele finalizou o GP da França de 2008 em 12º. Seu último abandono foi um motor estourado na Coréia do Sul no final do ano passado enquanto liderava. Quer dizer, nem Chris Amon conseguiria perder este título.

RÄIKKÖNEN: Pelo visto, a grande carta na manga da decadente Williams é Kimi Räikkönen. Sem lenço nem documento, a equipe de Rubens Barrichello e Pastor Maldonado sonha com o finlandês que se sagrou campeão do mundo em 2007 para atrair os petrodólares do Banco Nacional do Catar, que aceitaria conceder patrocínio caso Kimi seja um dos pilotos. Frank Williams, que foi o primeiro do paddock a estabelecer contato com os árabes no fim dos anos 70 e que chegou a aprender um pouco da língua deles para facilitar a comunicação, pensa em repetir a trajetória com o minúsculo país do Golfo Pérsico. Com isso, quem dançaria seria Rubens Barrichello, que custa caro e que não está trazendo resultados muito melhores do que o lucrativo Pastor Maldonado. Kimi, além da insígnia de campeão do mundo, poderia até fazer o papel do brasileiro com mais competência. Não é o que Rubens, que disse que ninguém faria um papel melhor que o dele, acha. Eu não sei. Barrichello pode até um ser bom ativo para a Williams, mas seria burrice para a equipe dispensar um pacote que inclui um campeão do mundo e um banco abastado. Isso se, é claro, o boato tiver fundamento.

BUTTON: Mas essecara tem tanta moral, mas tanta moral, que a McLaren decidiu renovar seu contrato até 2016. É incrível. Lewis Hamilton, o piloto preferido da armada prateada até duas horas atrás, não tem um contrato tão longo assim. Pode ser um sinal de que seu império romano particular esteja começando a ruir. Falemos de Button, pois. Este é um cara que concentrou a sorte de meio planeta em um único organismo. Além de muito rico, muito gente boa e muitíssimo bem acompanhado, Jenson conseguiu afastar de si o papel de Sancho Pança e cativou espaço próprio na McLaren. Nesse momento, é ele quem tem chances imaginárias de título. Com tantas qualidades assim, não é de se assustar que a equipe apareça com um contrato trilionário e de longuíssima duração. Assim, até a Hispania.

Sebastian Vettel, Red Bull, Adrian Newey, Mark Webber, Renault. Tudo igual para os quase campeões em 2012

Estamos no dia 20 de setembro de 2011. Pelo menos, eu estou. Se você está lendo esse texto deitado em uma rede enquanto toma água de coco e relaxa um pouco sob o sol de Tonga, você está um dia adiantado. Não importa. O mês está acabando, assim como o ano. Hora de juntar uma grana para pagar o IPTU e o IPVA. Hora de se endividar comprando presentes. Hora de reservar aquele apartamento chinfrim para passar o Ano Novo em Balneário Camboriú ou no Guarujá. Hora de ver quem é que vai correr aonde na Fórmula 1 do ano que vem.

O mais divertido é quando muda tudo. Fernando Alonso sai de A para B. Em seu lugar, vem Adrian Sutil, que largou C porque teve de dar lugar a Charles Pic. Sebastian Vettel permanece em Y, que passará a utilizar motor Z e terá o projetista X. Rubens Barrichello se aposenta e a equipe D contrata Timo Glock, que deixa o lugar livre na equipe E para a reestréia de Romain Grosjean. Gosto disso. A expectativa por uma nova temporada é sempre maior. Como fulano se comportará em uma nova equipe? E sicrano, que terá sua primeira oportunidade em uma equipe boa? E a equipe Seiláoquê, que terá dono, pintura e motor novos? Vem logo, Melbourne!

Só que não vai ter nada disso em 2012. Quase tudo permanecerá como dantes no quartel de Abrantes. Pelo segundo ano seguido, a Fórmula 1 terá um inverno calmo e bastante previsível. Depois de tudo ter ficado de ponta-cabeça entre 2009 e 2010, a categoria apresentou poucas novidades de lá para cá. O que dizer da enorme possibilidade das quatro principais equipes seguirem com as mesmas duplas de pilotos pelo terceiro ano seguido? Não me lembro disso ter acontecido nos últimos anos. Quiçá, na história da Fórmula 1.

A Red Bull segue igual, porque não se mexe em time que está ganhando. Sebastian Vettel é intocável, como não poderia deixar de ser, assim como o projetista Adrian Newey. O resto é passível de conversas, mas Dietrich Mateschitz decidiu deixar tudo como está. Até mesmo Mark Webber, que costuma ter pesadelos com o companheiro de equipe, vai continuar. De novo, apenas o novo status da equipe perante a Renault, fornecedora de motores. A partir de agora, a Red Bull Racing é a principal escuderia da montadora francesa, e não mais a Lotus Renault, que não é Renault e nem Lotus. Enfim, isso não altera a cotação do café.

A McLaren segue igual, porque a equipe está em um momento excepcional em termos de ambiente. Mesmo que os resultados não sejam os melhores, tudo está funcionando maravilhosamente bem por lá. Lewis Hamilton e Jenson Button formam a dupla perfeita: são britânicos, são amigos, são carismáticos, são campeões do mundo e um complementa o outro. Hamilton é o doidão, o piloto que faz malabarismos e que traz as atenções para si. Button é o cerebral, o piloto que dribla todo mundo à mineira e ganha a corrida. A parceria com a Mercedes segue normal e não há grandes perspectivas de mudança a médio prazo. Alguém sugeriu que Button poderia ser contratado pela Ferrari. Não acredito nisso. Jenson é esperto e sabe que a mamata da McLaren nunca se repetiria na Ferrari owned by Fernando Alonso.

Rubens Barrichello, um dos mais ameaçados neste momento. Todo mundo quer sua vaga

Falando na Ferrari, esta também segue igual, mesmo com este interminável período de entressafra. Fernando Alonso tem um contrato até o próximo milênio e só sai da equipe se aparecer um novo Lewis Hamilton em sua vida. Felipe Massa é o grande ponto de interrogação do momento. Ele tem contrato em 2012 e a Ferrari não se cansa de garantir sua permanência, mas sabe como é, italianos não são exatamente previsíveis. O brasileiro não está bem e atuações como aquela de Spa-Francorchamps só servem para derrubar sua já combalida moral. No ano que vem, Massa terá sua última chance de recuperação. Se fracassar, cai fora e não leva nem beijinho da nonna. A cúpula ferrarista já pensa seriamente nesta possibilidade e iniciou, há alguns dias, uma espécie de disputa tête-à-tête entre Sergio Pérez e Jules Bianchi. Quem ganhar deverá ficar com a vaga do brasiliano em 2013. Mas isso não é muito importante agora. Quanto ao resto, segue a mesma coisa desde sempre. O carro continuará vermelho, os fãs continuarão histéricos e a macarronada al dente continuará sendo servida aos domingos.

A Mercedes, bem, também segue igual. Há alguns meses, muitos tinham dúvidas sobre a permanência de Michael Schumacher na equipe em 2012. O heptacampeão teve um início de temporada bem ruinzinho e, aos 42 anos, não estava exatamente motivado em disputar posições inúteis com crianças como Alguersuari e Kobayashi lá no meio do pelotão da merda. Umas duas ou três corridas geniais, muito geniais, o fizeram mudar de idéia. Que bom. Nico Rosberg segue. Todo mundo, tirando eu e mais uns oito ou nove, gosta dele. Todo mundo acha que ele tem pinta de campeão. Ele tem pinta é dessas misses infantis, isso sim.

Falar das equipes de ponta, no geral, me causa bocejos. Então, falemos da ralé, da gentalha, da rafaméia, da plebe, dos favelados a motor. O problema é que estes também não deverão mudar muita coisa no ano que vem. Começo por aquelas que deverão ter as mudanças mais interessantes, a Williams e a Renault.

A Williams já foi rica de ostentar colar de diamantes. Hoje, ela é pobre de ostentar cartão da Previdência e registro no Posto de Saúde de Perus. Seu carro é bonito, mas não tem muitos adesivos.  Na verdade, os que mais se destacam são os da PDVSA, a companhia petrolífera que pertence ao governo venezuelano. São os bolívares não tão fuertes assim de Hugo Chavez que financiam a permanência de Pastor Maldonado na equipe. O outro carro pertence atualmente a Rubens Barrichello, que ganha algo ao redor de cinco milhões de dólares por ano. É uma quantia que faz falta. Patrick Head e Adam Parr estão ponderando até quando gastar tanto por um único piloto – coisa que Frank Williams não fazia nem nos dias mais felizes – vale a pena.

Vitaly Petrov? Bruno Senna? Robert Kubica? Romain Grosjean? Quem vai pilotar o carro da Renault/Lotus/GENII?

Barrichello pode acabar dançando. A cada dia que passa, as possibilidades disso acontecer crescem exponencialmente, assim como cresce também a lista de candidatos à vaga. A lista de nomes citados por, no mínimo, uma fonte é composta por Sam Bird, Stefano Coletti, Romain Grosjean, Giedo van der Garde, Jules Bianchi, Davide Valsecchi, Valtteri Bottas, Nico Hülkenberg, Adrian Sutil, Robert Kubica, Vitaly Petrov e Kimi Räikkönen. Dessa turma aí, uns 80% não representam possibilidades sérias. O que sobra é gente endinheirada como Van Der Garde, genro de um dos homens mais ricos da Holanda. É aí que reside o perigo de Barrichello.

Nos sonhos mais amalucados de alguns, Rubinho poderia parar na Renault. Esqueçam. A Renault está num momento terrível, talvez o pior de sua existência. Falta-lhe principalmente dinheiro e identidade. Identidade? Sim, pois ela não tem nada a ver com seu nome oficial, Lotus Renault GP. A rigor, a Lotus menos falsa é aquela do Tony Fernandes, ecológica e ordinária. Renault também não cabe, já que a montadora passou a maioria (ou todas, não sei direito) das suas ações para o grupo GENII. E a equipe preferida dos franceses, hoje em dia, é a Red Bull. Como GENII Racing seria um nome absurdo de feio, opta-se pelo simpaticíssimo Lotus Renault. Mas ninguém sabe até quando será esta a denominação.

Além dos problemas de nomenclatura, há também os problemas de caixa. A Renault, ou Lotus Renault, ou GENII, precisa urgentemente de dinheiro e, para isso, conta com o espírito beneficente de seus pilotos. Vitaly Petrov e Bruno Senna, que formam a dupla atual, trazem muito dinheiro. Pesa contra eles a inexperiência: não é muito prudente largar uma equipe média na mão de dois pilotos limitados que estrearam somente em 2010. O chefe Eric Boullier quer trazer Romain Grosjean para um dos carros. Logo após se sagrar campeão da GP2, o francês paraguaio fez um teste rápido com um carro antigo de modo a iniciar um processo de readaptação à Fórmula 1. É um candidato fortíssimo, sem dúvidas. E há ainda Robert Kubica, que só vai confirmar se está apto a dirigir em outubro. A Renault dispõe de quatro pilotos para dois carros. Chuto Grosjean e Petrov em 2012. Se depender da minha capacidade de palpites, a dupla será Kubica e Senna.

Estas são as duas equipes que estão animando mais esta silly season chatinha. A Sauber segue com Pérez e Kobayashi. Não há razões para mudar. A Force India só libera Paul di Resta se este conseguir uma vaga na Mercedes e também não tem grandes intenções de mandar Adrian Sutil embora. Se um deles cair fora, ela já tem um cara prontinho para substituí-lo, Nico Hülkenberg. A conservadora Lotus segue com Jarno Trulli e Heikki Kovalainen. De novidade, talvez o nome. Ela pode deixar de ser Lotus para virar Caterham. Solução simpática.

Jaime Alguersuari. Na briga interna com Sébastien Buemi pela permanência na Toro Rosso, ele é quem leva vantagem

Outra equipe que, em menor escala, pode mexer em alguns pauzinhos na próxima temporada é a Toro Rosso. Sébastien Buemi e Jaime Alguersuari disputam metro a metro quem é que seguirá na equipe no ano que vem. Pode ser que fiquem ambos (muito improvável), que um deles saia (o mais provável) ou que os dois saiam (longe de ser improvável). Quem está na vantagem neste momento é Alguersuari, que tem o apoio teórico da petrolífera espanhola CEPSA e que está andando melhor nestas últimas corridas. A grande ameaça parte dos novos garotos da Red Bull, Daniel Ricciardo e Jean-Eric Vergne. O australiano já está fazendo um estágio na Hispania e anda mostrando muita competência. Vergne tem boas chances de levar o título da World Series by Renault. Não é absurdo pensar na efetivação de Ricciardo à Toro Rosso e na ascensão de Vergne à Fórmula 1 pela Hispania.

A Toro Rosso deve ser também a equipe com as mudanças mais profundas fora da pista. Todo ano, se ouve falar da emancipação da priminha pequena da Red Bull. Nesse ano, ela firmou uma interessante parceria com o fundo de investimentos Aabar, que intermediou a vinda dos apoios da CEPSA e do Falcon Private Bank. Há quem diga que, logo, logo, a Aabar deverá acabar tomando conta da equipe inteira. Embora eu não goste desse negócio de fundos de investimento obscuros dominando o automobilismo, folgo em saber que aquela pintura horrenda da Toro Rosso poderá estar com os dias contados.

Por fim, Virgin e Hispania. A Virgin não saiu do lugar desde que estreou na Fórmula 1. No ano que vem, as coisas deverão melhorar um pouco: a idéia de utilizar apenas o CFD para desenvolver o carro será deixada de lado e os virginianos fizeram uma parceria com a McLaren que permitirá à pequena equipe utilizar as instalações, os computadores e o túnel de vento da equipe de Martin Whitmarsh. Espero que essa parceria dê certo, já que a Virgin de hoje é muito patética. Timo Glock assinou um contrato de longa duração. De três, uma: ele sabe de coisa a mais; ele é otimista; ele é burro e medroso. A outra vaga deve permanecer com Jerôme D’Ambrosio, mas o canadense Robert Wickens está sempre por perto. Não me surpreenderia se ele tomasse a vaga do belga, assim como este fez com Lucas di Grassi no ano passado.

E a Hispania? Essa daí, como sempre, está no meio do nevoeiro. O Thesan Capital, mais um grupo de investimentos esquisito, se apoderou da estrutura há pouco tempo e vem fazendo, aos poucos, algumas mudanças bem interessantes. Mandou José Ramón Carabante ir pastar, trocou quase toda a cúpula e, gradativamente, está transferindo a sede da equipe da Alemanha para a Espanha. Há quem diga também que a equipe poderá ter a participação acionária de Paul Gasol, um dos astros da NBA, e de alguns parceiros chineses. Borbulhante, o negócio. Com relação aos pilotos, é impossível dizer algo com certeza. Pode ser que entre um espanhol, como Javier Villa ou Dani Clos. Pode ser que Vitantonio Liuzzi siga na equipe. Pode ser que a Red Bull continue injetando uma grana lá, o que garantiria a presença de Jean-Eric Vergne ou mesmo de Daniel Ricciardo. Pode ser que eu fique rico e compre a equipe. Pode ser que a vida seja bela. Pode ser que pizza de frango seja mesmo algo bom. Não, não pode.

Esta é a silly season 2012. Não há muitas vagas abertas, não há uma enxurrada de pilotos de categorias menores se matando pelas poucas vagas, não há boatos muito divertidos, não há novas equipes tentando lugar no grid. O que há é o tédio. Estou entediado. A Fórmula 1 também.

Romain Grosjean, o campeão da temporada 2011 da GP2. Este é o sétimo título de sua carreira. Piloto ruim, não?

Há quase dois anos, vinte caras desembarcaram em São Paulo para disputar a penúltima etapa da temporada de 2009 da Fórmula 1, o Grande Prêmio do Brasil. Três (Jenson Button, Rubens Barrichello e Sebastian Vettel) estavam caçando o desejado título mundial, outros (Jarno Trulli, Nick Heidfeld, Giancarlo Fisichella) estavam correndo atrás de alguma vaga digna de seus currículos para o ano seguinte, um (Kamui Kobayashi) estava descobrindo um mundo novo e tantos outros (Kimi Räikkönen, Sébastien Buemi, Robert Kubica) só estavam esperando o ano acabar. Havia um, no entanto, que estava afundado em um inferno astral que parecia irremediável.

Magrelo, alto e dono da cabeleira mais estranha dos últimos tempos, Romain Grosjean estava na pior situação possível para um jovem talento. Aos 23 anos, ele ocupava o pior emprego de toda a Fórmula 1, o de segundo piloto da Renault. Quando seu carro é um dos piores do grid, seu companheiro é Fernando Alonso, seu ex-chefe é Flavio Briatore e sua equipe é aquela que foi acusada de obrigar um piloto bater para favorecer o outro, não dá para sair por aí agradecendo a Deus pela oportunidade.

Grosjean fez sete corridas naquele horrendo carro branco e amarelo de número 8. Não marcou pontos em nenhuma delas. Bateu em várias ocasiões. Em Cingapura, conseguiu a proeza de repetir o acidente de Nelsinho Piquet, que foi quem deu lugar ao suíço, durante os treinos de sexta-feira. Em Interlagos, quase capotou após rodar na saída da Subida do Lago. Enquanto esteve dentro da pista, o que nem sempre acontecia, cometia erros básicos de traçado e não conseguia reproduzir a agressividade de seus tempos de GP2. Seu melhor resultado em treinos oficiais foi um 12º em Monza. Em corrida, foi um 13º em Interlagos. Uma lástima de participação.

Como vocês sabem, o povo não tem paciência alguma. Romain, que era considerado um dos pilotos mais promissores do automobilismo mundial antes de estrear na Fórmula 1, se transformou em um piloto completamente incompetente e digno de F1 Rejects. Sua imagem ficou tão negativa em tão pouco tempo que a Renault, que também não estava com a melhor fama do planeta, não fez o mínimo esforço para mantê-lo em seu plantel de pilotos em 2010. Preferiu trazer Vitaly Petrov, que não era exatamente melhor que Grosjean. No Brasil, o locutor global Galvão Bueno não se furtava em fazer comentários jocosos sobre o suíço. Nem mesmo o seu nome era pronunciado corretamente. “Grôjean” não existe. É “Romã Grrosjã”.

Dois anos depois, o mesmíssimo “Grôjean” se sagrou campeão da GP2 Series sem nenhuma dificuldade. Mais maduro, experiente e humilde, o suíço obteve cinco vitórias, uma pole-position e quatro pódios. Deixou para trás uma concorrência de peso: Giedo van der Garde, Charles Pic, Jules Bianchi, Sam Bird, Luca Filippi, Davide Valsecchi, Christian Vietoris, Marcus Ericsson e outros (por favor, que ninguém tente me convencer que o grid da GP2 é uma merda. Todo ano, ouço a mesma ladainha). Mostrou velocidade, constância e confiabilidade. Errou muito pouco. Fez boas corridas de recuperação. Comprovou que sabe pilotar um carro de 600cv e aerodinâmica muito próxima à de um Fórmula 1 com muita destreza. O que mais lhe falta?

Grosjean e os piores dias de sua carreira: aqueles na Fórmula 1 no fim de 2009

Uma vaga na Fórmula 1. Nesse momento, ele está conversando seriamente com duas equipes. Uma, logicamente, é a mesma Renault que quase encerrou prematuramente sua carreira. Na verdade, pouco daquela equipe de 2009 ainda resta: o carro é razoável, a pintura é preta e dourada, o chefe é o Eric Boullier, o financiador da brincadeira é um grupo de investimentos de Luxemburgo, o companheiro de equipe é o soviético Vitaly Petrov e o patrocínio é da Lotus paraguaia. Daquela Renault de Fernando Alonso, Flavio Briatore e Pat Symonds, só sobrou o nome. Ou nem isso, já que muita gente chama a equipe de Lotus.

Como expliquei em um texto na semana passada, Grosjean enfrenta a dura concorrência de Bruno Senna e o retorno cada vez mais provável de Robert Kubica. O polonês tem vaga cativa na equipe e, se sua recuperação seguir positiva, terá sinal verde para pilotar o carro negro. Senna, por outro lado, traz dinheiro da OGX e da Procter & Gamble. O que pode ajudar o suíço é o fato dele ser apoiado pela Gravity Sport Management, que é comandada pelo mesmo Eric Boullier que manda na Renault. Mas não dá para dizer que isso é o suficiente.

Portanto, se não der para correr na Renault, Romain ainda pode encontrar emprego na Williams, que utilizará motores da marca francesa no ano que vem e que está considerando a possibilidade de mandar Rubens Barrichello para o chuveiro. Nesse caso, Grosjean disputaria a vaga com um bocado de gente: Adrian Sutil, Nico Hülkenberg, Jerôme D’Ambrosio, Giedo van der Garde, Jules Bianchi, Sam Bird, Stefano Coletti e Valtteri Bottas. Páreo duro. O franco-suíço tem como vantagens maiores o título da GP2 (que Hülkenberg também tem), o apoio da Gravity (que D’Ambrosio também tem) e o lobby da Renault. Dá para supor que ele não é o maior favorito e também não é a maior zebra.

Se tudo der errado, ainda há outras possibilidades. Franz Tost, chefão da Toro Rosso, andou elogiando muito Grosjean e não descartou trazê-lo para sua equipe no ano seguinte. Vale lembrar que Sébastien Buemi e Jaime Alguersuari ainda não estão garantidos e pelo menos um deles cairá fora. O que pesa contra Romain é a concorrência de Daniel Ricciardo e Jean-Eric Vergne, que são pilotos da Red Bull e que estão à frente de qualquer outro ser humano na escala de preferência dos taurinos. Há ainda a Lotus do Tony Fernandes, que também recebe motores Renault e que está tendo problemas contratuais com Heikki Kovalainen. Consta que o finlandês teria pedido um aumento indecente de cinco milhões de dólares. O malaio gorducho não gostou muito disso e pode substituí-lo por Luiz Razia, D’Ambrosio ou Grosjean.

Mesmo que ainda não haja nenhuma possibilidade concreta, é legal ver Romain Grosjean sendo lembrado por tantas equipes. Por mais que muita gente precipitada (e, em alguns casos, mal-intencionada ou simplesmente burra) o veja com maus olhos, o pessoal do paddock sabe que se trata de um piloto com enorme potencial. E é também um bom exemplo de como um tempinho no inferno pode tornar uma pessoa melhor.

Em sua primeira passagem pela GP2, Romain era tão rápido quanto escroto

Antes de pagar alguns pecados lá na Renault do Briatore, Romain Grosjean era apenas um moleque muito rápido, muito agressivo e muito idiota. Chamou a atenção pela primeira vez em 2005, quando destruiu a concorrência na Fórmula Renault francesa. No ano seguinte, já integrado ao programa de desenvolvimento de pilotos da Renault, estreou na Fórmula 3 Euroseries pela Signature. No mesmo ano, decidiu participar da rodada dupla da Fórmula 3 Britânica em Spa-Francorchamps. Em duas corridas, obteve duas poles, duas voltas mais rápidas e duas vitórias. Incrível. Foi naquele momento que ouvi falar nele pela primeira vez.

Em 2007, Grosjean assinou com a poderosa ASM, filial da ART Grand Prix nas categorias menores, para tentar ganhar o título da Fórmula 3 Euroseries. Teve um pouco de trabalho com Sébastien Buemi no início do campeonato, mas reagiu e, com seis vitórias, obteve mais um título para o seu currículo. No final do mesmo ano, foi efetivado pela ART Grand Prix para disputar o então inédito campeonato da GP2 Asia. Mesmo sem experiência em um carro tão potente, o suíço ganhou quatro corridas e levou o título com enorme facilidade. O vice-campeão foi o mesmo da Fórmula 3, Sébastien Buemi. Diante disso, todo mundo acreditava que o título no campeonato principal da GP2 viria tranquilamente.

Na verdade, não veio. No pior ano da história da GP2 Series, Grosjean até conseguiu se destacar com boas ultrapassagens e muita velocidade, mas não teve a constância para brigar pelo título com Giorgio Pantano e Bruno Senna. No fim, terminou a temporada em quarto, com duas vitórias e uma pole-position. Decepcionado, Romain decidiu seguir na GP2 em 2009. Trocou a ART Grand Prix pela Addax, que vinha em um momento melhor e que passaria a ter o apoio oficial da Renault.

Tinha tudo para ser o título mais certo da história da GP2, mas ele não veio. Grosjean até venceu as corridas de sábado de Barcelona e Mônaco, mas não conseguiu nada além disso. Na segunda corrida monegasca, acabou se envolvendo em um perigoso acidente com o igualmente perigoso Andreas Zuber. Depois, fez apenas um pódio em Silverstone. Após completar a rodada dupla de Hungaroring, já estava doze pontos atrás do líder Nico Hülkenberg. Seu companheiro, o esquecido Vitaly Petrov, estava apenas quatro pontos atrás.

Para piorar, um episódio na Hungria deixou muita gente revoltada com ele. No treino classificatório, Grosjean acertou o carro de Franck Perera e os dois foram parar na caixa de brita. Revoltado, Perera procurou Grosjean para tirar satisfação. Esnobe, Romain simplesmente perguntou “quem é você?” e lhe deu de costas. Como se isso não bastasse, a organização de prova decidiu absolver Romain e culpar Perera! Mesmo que o suíço tenha se dado bem, a imagem de garoto arrogante, mimado e protegido ficou estampada na testa.

Na AutoGP, sua carreira nos monopostos renasceu

Estes seus tempos difíceis na sua primeira passagem na GP2 e na Fórmula 1 lhe fizeram bem. Após ficar sem vaga na Renault, Grosjean se viu praticamente aposentado do automobilismo, obrigado a seguir trabalhando apenas no banco Faisal. No fim de março, ele decidiu assinar com a Matech Competition para pilotar um Ford GT no FIA GT1. Romain acreditava que sua passagem pelos monopostos havia acabado e, agora, era hora de mudar os rumos de sua vida.

Para surpresa geral, Grosjean venceu as etapas de Abu Dhabi e Brno em parceria com Thomas Mutsch. No fim de junho, enquanto ainda corria no FIA GT1, ele recebeu um convite da DAMS para disputar o AutoGP, um novo campeonato que utilizaria os antigos carros da A1GP e que distribuiria prêmios milionários por etapa. O suíço disputou oito corridas, quatro a menos que o total, venceu três e conseguiu a façanha de se sagrar campeão com 16 pontos de vantagem para o vice-campeão Edoardo Piscopo. Além de disputar a AutoGP, Grosjean ainda fez algumas corridas pela mesma DAMS na GP2. Sem grandes ambições, ele ainda conseguiu dois pódios com uma equipe que não vinha conseguindo muita coisa com Jerôme D’Ambrosio e Ho-Pin Tung.

Após um excelente 2010, Romain Grosjean decidiu voltar a sonhar com a Fórmula 1. Para começar, optou disputar novamente a GP2 Asia para tentar levar o bicampeonato. E conseguiu, tendo vencido uma corrida e obtido um pódio nas quatro provas realizadas. Por fim, a temporada européia só serviu para provar que, sim, ele ainda era um dos pilotos mais promissores da Europa. Hoje, o suíço contabiliza nada menos que sete títulos na carreira (o primeiro foi um não muito relevante na Fórmula Renault suíça em 2003). Você, que enche a boca para dizer que Grosjean é ruim, me responda: em qual dimensão um piloto que possui sete títulos tendo apenas 25 anos de idade é ruim?

E aí que entram alguns pequenos comentários. A segunda chance que Timo Glock e Bruno Senna tiveram também é um direito de Romain Grosjean, assim como deveria ter sido um direito de Giorgio Pantano em 2009. O automobilismo não deveria ser um ambiente tão imediatista. Todo mundo tem o direito de errar uma, duas, três ou cinco vezes, ainda mais em um lugar como a Renault em 2009. Desde que acerte em algum momento, o perdão é sempre válido.

Além disso, quem acompanhou a temporada 2011 da GP2 não sucumbirá ao argumento fácil e falho de que o nível dos pilotos era baixo. Embora os erros tenham acontecido (e eles devem mais é acontecer nesta fase mesmo – é melhor errar lá do que na Fórmula 1), as boas atuações de vários pilotos representaram boa compensação. E a verdade é que Grosjean mostrou aquilo que todo bom piloto de Fórmula 1 deve mostrar: segurança, amadurecimento e constância. Ele foi o melhor dos melhores, por assim dizer.

A GP2 tem um novo campeão. E a Fórmula 1 tem a chance de ter um ótimo piloto com cacife para representar a França, a Suíça e o Paraguai em alto nível.

Enquanto o mundo celebrava o Dia Mundial do Rock ouvindo Restart e Rihanna, alguém celebrava seus 54 anos de maneira quase silenciosa em seu apartamento em Mônaco. Apesar de sua vivenda estar localizada no principado, o aniversariante em questão é belga como uma garrafa esverdeada de Stella Artois. Engenheiro mecânico de formação, ele é dono de uma empresa que comercializa aviões e de uma equipe de automobilismo. Sua fama, no entanto, foi construída há pouco mais de 25 anos. Tempos em que era um competentíssimo piloto de Fórmula 1.

Thierry Boutsen fez aniversário ontem. Garanto que muitos ficaram felizes com isso. Enquanto correu na Fórmula 1, entre 1983 e 1993, o nativo de Bruxelas fez inúmeros amigos, como o sempre difícil Ayrton Senna, e conquistou a simpatia da torcida. Estava muito longe de ser o piloto mais arrojado do grid, mas entregava resultados com a consistência de um relógio suíço. Poderia dizer que era um Nick Heidfeld de sua época. Um Nick Heidfeld que venceu corridas e cativou fãs.

Thierry Boutsen chegou à Fórmula 1 em 1983 com uma boa dose de moral: campeão da Fórmula Ford belga com 15 vitórias em 18 corridas em 1978, vice-campeão de Fórmula 2 com duas vitórias em 1981 e terceiro colocado na mesma Fórmula 2 com três vitórias em 1982. Um currículo bom, obviamente. No entanto, o belga ficou famoso por ter sofrido um violentíssimo acidente nas 24 Horas de Le Mans de 1981, que custou a vida de um fiscal de pista.

Como não havia mais o que fazer na Fórmula 2, Boutsen foi atrás de seu sonho maior, a Fórmula 1. Em 1983, a pequena equipe Arrows estava desesperada por dinheiro, chegando ao ponto de mudar a pintura de seu carro a cada corrida unicamente para comportar um patrocinador aqui e outro acolá. A equipe corria com o brasileiro Chico Serra, que levava pouco dinheiro, mas sonhava em ter o ex-campeão Alan Jones. No entanto, o cara-de-pau pediu 1,3 milhão de dólares para pilotar a jabiraca branca, os dirigentes disseram não e o mandaram para casa. Neste interregno, surgiu Boutsen com 500 mil dólares e um currículo legal. Como o Grande Prêmio da Bélgica ainda estava para acontecer, a Arrows o contratou para correr a partir de Spa-Francorchamps.

Em 1983, Boutsen não fez nenhum ponto, já que o Arrows A6 era muito ruim. Em 1984, ele iniciou o ano com o mesmo A6 e até conseguiu fazer pontos em Jacarepaguá e em Imola por simplesmente chegar ao fim. Quando a equipe estreou o A7, os resultados até pioraram e ele só marcou mais dois pontos em Österreichring.

A Arrows era esquisita e apresentava resultados absurdamente irregulares. Em 1985, aconteceu de a equipe acertar a mão e fazer um carro legal. Thierry fez onze pontos e até conseguiu terminar em segundo no Grande Prêmio de San Marino. No ano seguinte, acompanhando a extrema irregularidade da Arrows, Boutsen não marcou nenhum ponto. Depois de quase quatro temporadas naquele calvário, era hora de ir para outra maison. Afinal de contas, ele precisava de um carro competitivo para demonstrar seu talento.

Em 1987, uma boa oportunidade finalmente apareceu. Depois que Gerhard Berger cascou fora, a Benetton precisava contratar alguém para correr ao lado de Teo Fabi. Como a BMW já não metia mais o bedelho também, não havia influência bávara na contratação de pilotos. Então, Luciano Benetton trouxe Thierry Boutsen. E a decisão foi acertadíssima: oitavo colocado em 1987 (16 pontos, um pódio em Adelaide) e excelente quarto colocado em 1988 (27 pontos, cinco pódios válidos e um inválido por desclassificação em Spa). A Fórmula 1 estava diante de um piloto excelente. Seu pecado maior, no entanto, foi ter surgido em tempos de Senna, Prost, Piquet, Mansell, Berger, Alboreto e Nannini, pilotos que tinham a agressividade que faltava a Boutsen.

Em julho de 1988, de maneira até surpreendente, a Williams anunciou a contratação de Boutsen para correr no lugar de Nigel Mansell em 1989. A equipe inglesa estava em uma temporada ruim dos diabos, mas as coisas melhorariam no ano seguinte com a chegada dos motores Renault. Correr lá seria um bom negócio, portanto.

Falemos rapidamente de 1989. Thierry começou o ano cheio de moral lá no império de Frank Williams, já que seu companheiro, Riccardo Patrese, já era considerado um piloto decadente e não foi escorraçado da equipe por pouco. O Williams FW12C nada mais era do que uma atualização do chassi do ano anterior, que nem era tão ruim assim. Na verdade, a equipe estava desenvolvendo o carro de 1990. 1989, portanto, seria apenas um ano de transição.

No fim, até que as coisas não correram mal. O que ninguém esperava era o ótimo desempenho de Patrese nos treinos oficiais e na maioria das corridas. Até antes da última corrida, Thierry e Riccardo haviam disputado quinze fins de semana juntos. O italiano levava vantagem em pontos (36 contra 28 do colega), em número de pódios (cinco a quatro) e principalmente em treinos de classificação (12 x 3). A única vantagem de Boutsen residia no fato dele ter sido o único da equipe a ter vencido uma corrida naquele ano, o Grande Prêmio do Canadá. Que certamente terá artigo próprio qualquer dia desses.

A última corrida da temporada de 1989 foi o Grande Prêmio da Austrália, a ser realizado na região do centro comercial de Adelaide. O título daquele ano já estava definido em favor de Alain Prost, o francês da nareba que recebeu mãozinha substancial de Jean-Marie Balestre, o presidente da FISA. Enquanto Prost curtia os louros do título e o vice-campeão Ayrton Senna reclamava com razão, chorava e ameaçava cair fora da Fórmula 1, os demais 37 pilotos inscritos viajavam para a Oceania despreocupados. O negócio era cumprir o cronograma e curtir alguns dias de sol.

Sol? O tempo em Adelaide estava extremamente instável naquele início de novembro. Os treinos foram realizados sob o solzão típico da ilha, mas o domingo estava impiedosamente chuvoso, desses em que não dá para ir para a praia, fazer churrasco ou lavar o carro. Falemos antes dos treinos.

Sexta-feira, 3 de novembro de 1989, primeiro livre. Thierry Boutsen começa mal e faz apenas o 17º tempo, quase quatro segundos atrás do líder Ayrton Senna. Para piorar as coisas para a Williams, Riccardo Patrese foi ainda pior e marcou o 24º tempo, sendo mais de um segundo mais lento que Boutsen. Consequência direta da juventude do Williams FW13, carro que a equipe utilizaria na temporada de 1990 e que havia estreado nas últimas corridas de 1989 de modo a já ser testado para o ano seguinte.

Felizmente, quando as coisas realmente valeram alguma coisa, a sorte da Williams mudou. Boutsen acertou uma volta excepcional e conseguiu o tempo de 1m17s791, apenas 79 milésimos mais lento que o segundo colocado, Ayrton Senna. O belga foi o único a conseguir andar na casa de 1m17. Enquanto isso, Patrese não passava de 1m18s6. Dessa vez, quem brilharia nos treinos classificatórios seria Thierry.

No segundo treino oficial, a pista melhorou drasticamente, mas Thierry Boutsen não conseguiu extrair vantagem disso. Na verdade, ele conseguiu marcar apenas 1m18s586, o que representava apenas o sétimo tempo da sessão. Enquanto isso, Alessandro Nannini e o surpreendente Pierluigi Martini conseguiam bater o tempo do piloto da Williams, que acabou relegado à quinta posição no grid oficial. Sua insatisfação era visível, embora não expressa claramente: “tudo o que posso dizer é que ontem ficou para trás – se bem que isso sempre foi assim! O carro estava andando bem de manhã com tanques cheios, mas nós tivemos problemas à tarde. Fim de papo!”.

Até sábado, o sol reinava. No dia seguinte, São Pedro quis acabar com a festa mandando raios e trovões sobre a cidade australiana. O warm-up ainda foi realizado sob condições tranquilas, mas a chuva que caiu pouco antes da largada era assustadora. Alguns pilotos, notadamente os astros Alain Prost e Nelson Piquet, se reuniram para tentar adiar a largada. Entende-se: Prost e Piquet são dois notórios hidrofóbicos. Como se percebe, a choradeira sempre existiu.

Inicialmente, a organização decidiu adiar a largada em 30 minutos. Como o temporal não passou neste período, Bernie Ecclestone decidiu realizar a corrida daquele jeito mesmo. Afinal, contratos deveriam ser respeitados e dezenas de emissoras de TV estavam gastando os tubos com o aluguel do satélite – para quem não sabe, em tempos remotos, as emissoras pagavam pelo tempo de uso do satélite quando precisavam realizar uma transmissão internacional ao vivo; um atraso implicaria em multas e até mesmo na perda do sinal. Não sei se funciona assim até hoje. Talvez sim. Ou não.

Prost era o maior incomodado com a história. Em primeiro lugar, porque ele não queria largar de jeito nenhum. Em segundo lugar, porque quase todos os seus colegas haviam concordado em boicotar a largada. Apenas um não havia aceitado: Ayrton Senna, que não estava nem aí para o choro de seus dois desafetos e que não poderia aprontar nada, pois corria sob sursis da suspensão da FISA pelo ocorrido em Suzuka. Enquanto isso, Thierry Boutsen só esperava o que iria acontecer. Não queria correr, mas também não se estava muito incomodado.

A primeira largada foi dada normalmente (lembrem-se: não havia essa chatice de largar atrás de safety-car). Senna e Prost quase bateram na primeira curva, mas seguiram em frente nesta ordem. O francês deu apenas uma volta e recolheu para os pits, sem a menor vontade de prosseguir. Segundos depois, algumas confusões aconteceram lá atrás: os dois carros da Ligier se tocaram e ficaram parados no meio da pista. Em outro ponto da pista, o Onyx de J. J. Lehto bateu em alguma coisa e ficou rodopiado no meio da pista. Bandeira vermelha.

A segunda largada foi dada não muito tempo depois e sem Prost na primeira fila. Senna manteve-se na frente e abriu grande distância desde a primeira curva. Martini chegou a tentar ultrapassá-lo por fora na primeira curva, mas não teve êxito e permaneceu em segundo. Atrás, Nannini, Boutsen e Patrese. Ainda na primeira volta, Boutsen ultrapassou Nannini e assumiu a terceira posição.

Enquanto Senna desaparecia na liderança, Martini fazia das tripas coração para conseguir manter a segunda posição. Apesar de estar calçado com bons pneus Pirelli, seu Minardi-Ford não era páreo para os Williams e o Benetton de Nannini que vinham atrás. Após fechar centenas de portas, o baixote italiano não conseguiu tracionar direito na Jones Straight e foi ultrapassado facilmente por Boutsen na curva que levava à Brabham Straight. Era apenas a terceira volta e Thierry Boutsen assumia a segunda posição.

Boutsen não tinha muito o fazer a não ser evitar ao máximo um erro e esperar pelo erro de Senna. De fato, a pista estava em condições terríveis e todo mundo rodava ou batia. O próprio Ayrton escorregou no final da volta 11 e deu uma belíssima sequência de rodadas. Pelo menos, ao contrário de gente como Nigel Mansell e Alex Caffi, conseguiu voltar à pista e à liderança.

Mas não por muito tempo. Na volta 14, Senna descia a Brabham Straight sem visibilidade alguma quando deu de cara com o Brabham de Martin Brundle. De maneira meio ridícula, aquela luz vermelha que pisca em corridas chuvosas não estava instalada no Brabham – no seu lugar, estava uma câmera que a FOCA havia instalado arbitrariamente e que mostraria ao mundo de maneira clara o que havia acontecido.

Sem saber que havia um carro à frente exatamente pela ausência da luz vermelha, Senna seguiu acelerando e atingiu com tudo a traseira do Brabham de Brundle. Com o bico estourado e sem a roda dianteira direita, restou ao brasileiro abandonar a última corrida daquela temporada. A liderança caiu, então, no colo de Thierry Boutsen.

Muitos não enxergam méritos nesse tipo de vitória, mas a verdade é que o belga foi o único piloto entre os 26 que largaram a não cometer nenhum erro. Enquanto os demais rodaram ou bateram em pelo menos uma ocasião, Thierry desfilou incólume com seu Williams FW13 branco, azul e amarelo durante as duas horas de corrida. E sempre com um ritmo bom: até a volta 47, a melhor volta da corrida pertencia a ele.

Boutsen assumiu a liderança quando estava com 10 segundos de vantagem para Nannini. O italiano chegou a se aproximar perigosamente nas voltas seguintes, mas Thierry começou a abrir grande vantagem a partir da volta 25. Nannini chegou a tentar descontar um pouco a diferença, mas o piloto da Williams reagiu facilmente a partir da volta 40. Na volta 66, chegou a estar 38 segundos à frente do segundo colocado. No fim, Boutsen recebeu a bandeirada da vitória com 28 segundos de vantagem para Nannini. Vitória antológica do piloto da Bélgica.

“O carro esteve perfeito e o motor se comportou muito bem. O único problema que eu tive, além de alguma dificuldade para engatar a terceira marcha no final da corrida, foi o clima e eu realmente acredito que os organizadores deveriam ter adiado um pouco mais a primeira largada. Na hora da segunda largada, as condições estavam um pouco melhores, mas ainda estavam muito piores do que no Canadá ou na Bélgica, onde também tivemos corridas com chuva. Estou obviamente emocionado por ter vencido pela segunda vez – foi um grande final de temporada para mim, para a Williams e a Renault. Agora, é hora de testar e pensar em 1990“.

Não foi a última vitória de Boutsen – ele viria a vencer também em Hungaroring no ano seguinte -, mas foi certamente a melhor delas. Ele havia acabado de provar que não era um piloto de herdar vitórias. Merecia ter vencido mais, creio eu. Parabéns, Thierry!

GP DA INGLATERRA: Já comecei falando coisa errada. O nome oficial é Grande Prêmio da Grã-Bretanha, assim como a FIA é Federação Internacional do Automóvel. Mas como eu fui devidamente educado e adestrado pela Rede Globo, acabo falando deste jeito e sou feliz assim. Ao contrário de vocês, reles mortais, Silverstone está longe de ser a pista mais esperada por mim na temporada. Depois da reforma do ano passado, o negócio piorou mais. Achei que aquele trecho construído a partir da Abbey seria veloz, divertido e sensual, mas não passou de uma sequência safada de curvas lentas e burocráticas. O que salva é o ambiente, muito legal. Britânicos amam corrida de carros e fazem de tudo para lotar o autódromo. Além disso, os gramados intermináveis e aquela sensação de roça que caracteriza os circuitos britânicos também são algumas das atrações. Para mim, pelo menos.

RETA DOS BOXES: A partir desse ano, a Fórmula 1 deixará de largar da antiga reta dos boxes, que se iniciava na Woodcote, para largar naquela reta localizada após a Club, curva que ficava no meio do circuito até o ano passado. Faz parte daquela grande reforma de 43 milhões de dólares que visava modernizar todo o autódromo. O trabalho, de fato, ficou bem digno: toda a infraestrutura lembra aquela vista nos exagerados autódromos asiáticos pós-modernos. E há quem diga que largar antes daquelas novas curvas do ano passado será bem mais divertido. Eu não acredito nos “há quem diga”: a largada será chata, assim como o resto da prova. E os números da próxima Mega Sena serão 08, 14, 19, 26, 33 e 39.

BARULHO: A Fórmula 1 é fascinante. Como todas as equipes estão em ótimas condições financeiras, as novas medidas para ultrapassagens estão sendo aprovadas unanimemente, FIA, FOM e FOTA estão se entendendo em todos os aspectos relevantes e os organizadores das corridas não estão tendo problemas para manter suas provas no campeonato, todos consideram que o maior problema da categoria atualmente é o barulho dos motores. A introdução dos motores V6 1.6 para 2014 deixou muita gente incomodada, já que o sacro ruído de 150 decibéis seria consideravelmente diminuído e parte da graça iria embora. Eu, que tenho problemas mentais e de caráter, considero este assunto de importância secundária. Será que é loucura minha? Vale lembra que, nos anos 90, um piloto aí desenvolveu considerável problema auditivo após alguns anos de carreira. Tenho certeza que ele não era tão entusiasta assim da barulheira. Seu nome? Ayrton Senna.

VILLENEUVE: De vez em quando, algum ex-campeão aparece para meter a boca no trombone e comentar sobre todos os assuntos de maneira ácida como se fosse um Felipe Neto quarentão da vida. O problema é quando este ex-campeão é Jacques Villeneuve, canadense gordo, barbudo, meio grunge, um tanto quanto chato e totalmente perdido. Nessa semana, alguém teve a duvidosa ideia de lhe perguntar algumas coisas sobre o céu, a terra, a água e o mar. Empolgado, Villeneuve falou bastante coisa: disse que Vettel só perderá o título se fizer algo estúpido, disse que Hamilton não tem o menor direito de abandonar a equipe que simplesmente construiu sua carreira, disse que os comissários não deveriam punir tanto e disse que simplesmente não estava mais vendo as corridas de Fórmula 1, principalmente por causa da artificialidade das ultrapassagens. Sabe o que é pior? Mesmo sendo o Villeneuve, ele falou coisas que fazem algum sentido.

MOTORES: Muito lentamente, as coisas para a próxima temporada começam a ser decididas. Nessa semana, a Williams anunciou que utilizará motores Renault a partir do ano que vem. Cansada da Cosworth, a equipe do Sir Frank reeditará a parceria que papou quatro títulos de pilotos e cinco de construtores. Todos imaginávamos, portanto, que a Renault acabaria fornecendo propulsores para quatro equipes no ano que vem, mas o jornalista Fábio Seixas apurou que uma das equipes atuais ficará sem os motores franceses: a própria Renault! O nonsense pode ser explicado pelo interesse da fábrica em apenas fornecer propulsores. Se não me engano, ela ainda possui 25% das ações da equipe Lotus Renault GP. A partir do ano que vem, acredito que estes 25% seriam repassados para a Genii. E os motores a serem utilizados seriam os Cosworth rejeitados pela Williams. Sou eu ou essa equipezinha preta e dourada do Vitaly Petrov e do Nick Heidfeld será uma tremenda zica no ano que vem?