Vocês são eurocêntricos e tenho orgulho disso. Se considerarmos que as Américas e a Austrália são extensões bárbaras da Europa, praticamente todo o Calendário do Verde deste ano tem raízes no Velho Continente. Nada de Abu Dhabi, Indonésia ou esquisitices do tipo. Para dizer a verdade, havia apenas um circuito asiático que realmente fez falta no calendário do ano passado. Felizmente, vocês fizeram a escolha certa. Hoje, falo do Fuji Speedway.
Antes que você pense que vou gastar tempo e dedos para falar sobre aquele negócio xexelento, maricas e sem-graça utilizado pela Fórmula 1 em 2007 e 2008, antecipo-me dizendo que não falo sobre circuito banal no meu calendário. Posso ter escrito sobre Hungaroring e Valência, circuitos tão detestados quanto distintos, mas me recuso a fazer o mesmo para essas coisas medíocres compostas por um retão e um monte de curvas de primeira e segunda marcha. Falo da primeira versão de Fuji, utilizada entre 1965 e 1973. Circuito para samurais, e não para gueixas.
Não é muito fácil achar informações sobre a história do circuito, já que o site oficial é um dos piores que eu já vi… Enfim, vamos lá. No início dos anos 60, os japas queriam trazer corridas da NASCAR para seu arquipélago. Como qualquer um deve saber, a NASCAR corre majoritariamente em ovais. Então, mãos à obra. Em 1961, foi apresentado pelo arquiteto Charles Moneypenny um projeto de construção de um trioval de 2,5 milhas ao sopé do Monte Fuji. Quando desenvolveu a ideia, Moneypenny tinha em mente os célebres ovais de Pocono e Daytona. Parecia ideia de doido, mas o fato é que, apesar de ativo, Fujisan não entra em erupção desde 1770. Além disso, os japoneses são especialistas em contornar catástrofes naturais. É mais fácil nós sermos afetados por uma erupção do Fuji do que eles.
A construção do oval, cujo nome seria Fuji Speedway, foi iniciada em 1963 pela Japan NASCAR Corporation, empresa que cuidaria do circuito e dos futuros eventos da NASCAR no país. Houve um pequeno problema, no entanto: esta empresa não demorou muito para falir e a construção foi interrompida pela metade. Esta metade era composta por um retão separado por dois curvões inclinados em 30° e suportados por enormes bases, assim como nos bankings dos ovais mais antigos. Coisa mais bonita, impossível.
As obras do Fuji Speedway foram, então, adquiridas pela Mitsubishi Estate Co, uma das empresas da holding Mitsubishi e segunda maior companhia do setor imobiliário do país. Como o projeto de trazer a NASCAR para o Japão havia ido para o ralo, a Mitsubishi Estate decidiu completar o traçado com um trecho misto de modo a permitir provas de outras categorias. E assim foi feito. Em dezembro de 1965, o Fuji Speedway foi inaugurado com um trecho velocíssimo, que reaproveitava a parte originalmente construída para o oval, e uma parte sinuosa, mas ainda muito veloz. Além de tudo, a infraestrutura era impecável: torres de controle, garagem com rampas e arquibancadas excelentes para o público.
Só que o circuito era perigoso até mesmo para os padrões esquizofrênicos dos anos sessenta. As primeiras corridas foram realizadas no sentido anti-horário, e a primeira curva era nada menos que um mergulho extremamente íngreme em uma curva de oval inclinada em 30°! Não consigo pensar em nada mais carniceiro do que isso. O piloto inglês Vic Elford, que passou um tempo no Japão testando um Toyota V8 destinado para a CanAm, explicou que “o piloto chega ao topo do retão dos boxes a mais de 200mph para, imediatamente, dar de cara com uma curva de oval feita em descida íngreme”!
Os acidentes eram tantos que não demorou muito para que os donos do autódromo sensatamente decidissem inverter as coisas, com o sentido passando a ser horário. Só que a primeira curva neste sentido horário também não era muito menos perigosa: outro curvão inclinado e absurdamente veloz. Os acidentes continuaram e os donos do circuito decidiram diminuir a inclinação da última curva e substituir a primeira curva por um cotovelo em 1974. Foi a primeira grande reforma sofrida pelo Fuji Speedway. A partir daí, o belíssimo e perigosíssimo circuito começou a dar lugar a algo trivial e insípido. Desde aqueles tempos, os organizadores têm seríssimas dificuldades em conciliar desafio com segurança.
A versão a ser tratada, como não poderia deixar de ser, é esta que vigorou entre 1965 e 1973 e que matou um bocado de japas, sendo o sentido horário. A melhora na segurança do Fuji Speedway atraiu a Fórmula 1, que sediou duas corridas por lá em 1976 e 1977. A primeira foi lendária, com chuva torrencial, título definido em favor de James Hunt e volta mais rápida de Masahiro Hasemi e seu Kojima, carro construído por uns parentes meus. A segunda foi marcada por um acidente entre os malucões Gilles Villeneuve e Ronnie Peterson, que resultou na morte de dois espectadores.
Depois de receber a Fórmula 1, Fuji passou a sediar corridas do Mundial de Protótipos entre 1982 e 1988. Como as velocidades seguiam altas, foi decidido colocar uma chicane safada antes do último curvão em 1985. No fim dos anos 80 e início dos anos 90, o principal evento anual realizado em Fuji era uma corrida internacional de Fórmula 3, nos moldes do Grande Prêmio de Macau. Um que venceu uma edição desta corrida foi Michael Schumacher, o próprio.
Em 1993, fizeram mais uma reforma e transformaram a antiga Suntory em uma curva de baixa velocidade. Sete anos depois, a Toyota comprou todas as ações do autódromo, fez uma extensa reforma e anunciou que planejava tomar o Grande Prêmio de Fórmula 1 das mãos de Suzuka a partir de 2007. O novo traçado, bolado pelo arquiteto oficial Hermann Tilke, é um cuspe na cara de quem pensa na versão original. Não por acaso, a Toyota conseguiu o que queria e Fuji constou nos calendários de 2007 e 2008 da categoria maior. As corridas foram ótimas, mas a Toyota precisava cortar uns custos e Fuji caiu fora da Fórmula 1 após apenas dois anos.
TRAÇADO E ETC.
Suponhamos que foi entregue a um psicopata um lápis, uma borracha, uma folha A4 e toda a liberdade poética disponível. É ordenado ao psicopata que desenhe um circuito. Sem grandes surpresas, o sujeito o fará com toda a sua raiva e o seu espírito maníaco incontidos, pondo no papel uma verdadeira armadilha medieval, capaz de criar uma série interminável de viúvas e órfãos. O desenho está pronto. O psicopata acabou de desenhar a primeira versão do circuito de Fuji.
Como falei lá em cima, o Fuji Speedway era perigosíssimo, talvez o circuito mais perigoso já visto no Calendário do Verde. Entre 1965 e 1973, segundo o Motorsport Memorial, sete pilotos faleceram por lá. Para um circuito que não recebia lá tantas corridas, um número inegavelmente alto. Embora eu considere que o perigo é absolutamente inerente às corridas, devo confessar que, infelizmente, o circuito realmente precisava de mudanças fundamentais. Digo infelizmente porque ele era belíssimo.
Com 5,999 quilômetros de extensão (faltou um metro só!) e quinze curvas, Fuji era um circuito de velocidade absurda. Para se ter uma ideia, o recorde desta pista foi feito pelo australiano Vern Schuppan, que fez 1m32s57, com média de velocidade de 232km/h! O detalhe mais impressionante é que o carro utilizado era um March-Ford de Fórmula 2, que não ultrapassava os 300cv! Há apenas um ponto de freada, o Hairpin. No restante do circuito, no máximo, tira-se o pé do acelerador.
Tirando a questão da segurança, não há muito o que reclamar. O cenário é uma beleza à parte, com o Monte Fuji sendo avistado lá do início do último curvão. As áreas de escape, como costumava acontecer em todo circuito daquela época, eram risíveis e uma escapada de pista poderia mandá-lo direto para o caixão. Apesar da pista não ser extremamente larga, as ultrapassagens são sempre possíveis, embora nem sempre recomendáveis. Enfim, Fuji teria tudo para ser o melhor circuito de todos se as pessoas tivessem sete vidas.
Confira os trechos:
RETA DOS BOXES: É o retão dos boxes, ué. No projeto original, esta seria a grande reta do trioval de 2,5 milhas. Inicia-se em subida e segue em descida sutil. Na versão atual, esta reta tem 1,5 quilômetros. E vale lembrar que ela foi cortada de 1973 para cá. Imagino que a versão antiga tinha mais de dois quilômetros.
DAIICHI: Uma boniteza que nunca mais será vista no automobilismo moderno. Trata-se de uma curva feita à direita de raio extremamente longo e inclinação de 30°. Do lado esquerdo, uma mureta baixa. Como a inclinação e o raio são enormes, o piloto pode manter o pé cravado no acelerador. Se há um problema qualquer e o piloto perde o controle, um abraço.
BANKING: Confesso que não consegui identificar direito o nome deste trecho, mas há quem diga que se chama Banking. É uma sequência de duas curvas de raio longo. A primeira é feita à direita e tem 180°. Logo em seguida, o piloto vira à esquerda e completa outro trecho de 180°. Não é um trecho muito largo, o guard-rail está sempre próximo e o piloto apenas controla a velocidade no acelerador, sem frear. Um bom convite para a morte, portanto.
SUNTORY: É uma dessas típicas curvas patrocinadas. A Suntory, no caso, é uma das maiores fábricas de bebidas do Japão. Trata-se basicamente de uma perna feita à esquerda em alta velocidade. O piloto apenas esterça o volante e segue acelerando.
100R: Este é basicamente o primeiro trecho onde o piloto realmente tira o pé. Trata-se de uma curva de 180° e raio longo feita à direita. Apesar disso, o freio só é necessário para carros mais desequilibrados ou pilotos medrosos.
HAIRPIN: Este é, efetivamente, o trecho mais lento de todo o circuito, o único onde o piloto realmente pisa no freio e diminui algumas marchas. É uma curva feita à esquerda que lembra um pouco o Hairpin de Suzuka. O trecho de baixa velocidade acaba aí.
300R: Uma curva feita à direita que não acaba mais. O piloto segue acelerando e esterçando levemente à direita esperando pelo próximo trecho. Há leve inclinação e leve mudança de relevo.
ÚLTIMA CURVA: Ela não tem nome, mas bem que mereceria. Trata-se de uma curva à direita de raio longo que forma 90°. Além da inclinação de 30°, ela é feita em subida. Um trecho belíssimo, que pode ser visto no final do primeiro vídeo abaixo. Quando a pista era no sentido anti-horário, esta curva era a primeira e os carros faziam esta curva em descida. Sensacional, não?
Dois vídeos. Um feito com um carro GT em 1970. O outro é uma volta de um Fórmula 1 moderno no jogo rFactor.
15 de junho de 2011 at 18:32
Seria legal ver uma Simtek manejada pelo Verde rasgando a Daiichi, sendo pressionado por P.P. Diniz abordo de uma Forti Corse.
15 de junho de 2011 at 21:35
Ambos levando volta do Verstappen e do Irvime, que disputam ferrenhamente a 9ª colocação, e dando uma volta no Kartkeyan ao mesmo tempo….kkkkkkkkk
16 de junho de 2011 at 1:21
E umas duas voltas depois eles levavam volta do Badoer e do Al Pease que estavam uma posição a frente do blogueiro Verde e do riquinho Diniz kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
15 de junho de 2011 at 18:41
Carros calçados com pneus Michellin 2005, chuva repentina apenas em uma parte da pista, tanques de combustivel já com nível pela metade abastecidos com Metanol, valendo uma caixa de Stella Artois a quem vencesse.
16 de junho de 2011 at 4:12
eta pessoal sádico heim?kkkk
Esse é um dos meus circuitos preferidos, mesmo na versão decapada atual.
Parabéns,verde
16 de junho de 2011 at 13:53
Mesmo andando devagar, nunca serei pressionado pelo picareta do Diniz. Empurro ele para fora na Daiichi, ganho a corrida e dou banho de Artois em todo mundo.
17 de junho de 2011 at 23:04
Como tu vai ganhar Verde se tu acabou de levar volta do Badoer e Al Pease,só se deu alguma coisa no motor e ele ia até uns 280 por hora,passasse os dois,passasse o líder que era eu(no PlayStation eu sou fera em qualquer pista,menos em Mônaco aonde sempre bato no guard-rail no setor 3),tá que eu ia deixar tu me passar,ia falar “ah tu que me passar é,não vou deixar não” nem com KERS,asa móvel ou qualquer coisa do tipo eu ia te deixar passar.
15 de junho de 2011 at 19:02
Pistaça!
15 de junho de 2011 at 20:47
Naquela Daiichi,tu é doido é,não é a toa que um bocado de gente bateu as botas ali.
16 de junho de 2011 at 1:30
E esse psicopata que o verde falou era o Freddy Krueger que estava cansado de matar as pessoas apenas nos sonhos e resolveu criar alguma coisa sanguinolenta para matar mais gente.
E quando eu votei nessa pista para o calendario do verde 2011,eu tinha votado na versão atual da Toyota,ops foi mal kkkkkk poxa eu vivo rindo.
15 de junho de 2011 at 22:38
Gosto dessas coisas. Ótimo post. Circuito casca-grossa.
Valeu
16 de junho de 2011 at 12:35
Naquele jogo Gran Turismo a pista recebe o nome de High Speed Ring. Mesmo sendo parecidíssima com Fuji, não sei se existe uma confirmação da Sony de que seja mesmo o circuito. A diferença seria uma pequena parabólica ligando a reta principal à Suntory, sem a parte da Daiichi e Banking. Era uma das minhas preferidas no videogame.haha
16 de junho de 2011 at 14:34
Creio ser um pouco diferente o desenho da pista, em High Speed Ring do GT2 tem só umas duas curvas rápidas, as outras geralmente se freia (e bastante).
17 de junho de 2011 at 0:35
sem pontos de ultrapassagem… sem chance de dar uma mudadinha no traçado.. seria uma corrida mto monótona…
DIFICIL para o piloto (legal isso), e chata para o publico…
Ia vencer quem usasse motor Mercedes! rsrs
18 de junho de 2011 at 1:16
Verde estava olhando as pistas em que a F1 correu na história e achei essa aqui:a Zeltweg,se tiver uma pista extra-campeonato pode ser em Zeltweg.
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Só pra ter uma idéia o circuito é mais ou menos assim,desenhe no papel,os boxes ficam na primeira reta de cima,tá legal,fui.
28 de junho de 2011 at 0:24
Existe um video do Jim Clark em uma visita ao Japao, ele dirige um Jaguar E Type no Fuji Speedway. acho q tem no youtube
20 de maio de 2014 at 17:21
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Calendário do Verde 2011: Fuji (1965) | Bandeira Verde