A Ferrari, equipe italiana conhecida pelos seus fãs animalescos e por seus métodos pouco ortodoxos, dispõe de dois pilotos. Um deles estreou em 2006. O outro, em 2010. Passadas quinze etapas, o que estreou neste ano tem 191 pontos, quatro vitórias, duas pole-positions, a vice-liderança do campeonato e o respeito e a admiração de todos. O que estreou em 2006 tem 128 pontos, nenhuma vitória, nenhuma pole-position, uma apagada sexta posição no campeonato e um certo desdém por parte de todos. É evidente que há algo de podre no reino ferrarista.
Aos pouco afeitos com fatos históricos, Felipe Massa é o tal piloto que estreou em 2006 e Fernando Alonso é o que estreou em 2010. Enquanto Alonso, aquele que venceu as duas últimas corridas, reacendeu suas chances de título e trouxe consigo a atenção de todos na Ferrari, Massa, que só obteve até aqui quatro pódios, é aquele sujeito meio deixado de lado e um tanto quanto apático que faz talvez sua pior temporada desde que entrou para a panelinha italiana. No início do ano, muitos, incluindo eu, acreditavam que o espanhol realmente tomaria, ou ao menos tentaria tomar, o controle da equipe para si. Muitos, incluindo eu, acreditavam que Alonso, mais cedo ou mais tarde, andaria na frente de Massa com certa tranqüilidade. Mas poucos imaginavam que isso ocorreria tão cedo e de forma tão clara.
Nesta temporada 2010, temos dois pilotos completamente diferentes pilotando o carro vermelho patrocinado maciçamente pelo Santander. Fernando Alonso, até aqui, é uma das atrações do ano. Fez corridas excepcionais, boas, regulares e péssimas. Ultrapassou, bateu, tocou rodas com adversários, saiu da pista, teve problemas, fez uma pole-position inesquecível em Monza, arriscou uma estratégia soberba em Mônaco e saiu do fundo do grid para as primeiras posições em mais de uma ocasião. Enfim, deu o que falar. Felipe Massa, por outro lado, só atuou de maneira realmente proeminente no Bahrein e em Hockenheim, as duas únicas corridas em que ele teve chance de vencer. Na pista alemã, ele liderava até o famigerado Felipe, Fernando is faster than you e deu no que deu. A partir desse momento, ficou claro o que Massa realmente significava na Ferrari de Alonso. Mas não é só isso.
A impressão que eu tenho é a de uma falta de confiança da Ferrari para com Massa misturada a um esgotamento geral do piloto dentro da equipe. Pode soar como uma constatação óbvia, mas o fato é que muitos, e isso inclui aí uma boa gama de midiáticos, preferem dizer que Felipe é simplesmente um picareta, um oportunista que conseguiu fazer um 2008 bom porque tudo estava ao seu favor e perdeu porque, além de tudo, não tem a sorte inerente aos campeões. Pura inverdade maldosa. Felipe Massa é um piloto de ponta cuja evolução entre 2002 e 2008 só não foi visível para Stevie Wonder e um título não deixaria de ser merecido.
Sou honesto, no entanto. Massa está longe de ser meu piloto preferido e deixo bem claro que Fernando Alonso, por outro lado, é um piloto excepcional, raríssimo de ser encontrado por aí e que pode ser colocado em um nível acima não só de Massa mas também do restante do grid. O brasileiro ainda apresenta algumas deficiências técnicas, como a dificuldade para ganhar várias posições saindo de trás (uma boa exceção é Inglaterra/2007) e a notória falta de habilidade na chuva, como pôde ser visto nas corridas inglesas de 2002 e 2008. Não que eu ache estas deficiências um enorme pecado, já que os grandes Alain Prost, Nelson Piquet e Mika Hakkinen não se davam bem com la pioggia e outros grandes como Emerson Fittipaldi também não tinham lá grande facilidade para ganhar muitas posições. O fato é que Alonso é um piloto completo, sem ter um único grande ponto fraco, e a equipe sabe disso. Ainda assim, por que Massa foi intimidado com tanta facilidade?
Falemos da falta de confiança. Felipe Massa entrou na Ferrari em 2006 como segundão de Michael Schumacher, algo incontestável por todos. Inteligentemente, o brasileiro investiu na equipe italiana pensando na aposentadoria do alemão. Sendo assim, ele poderia galgar um posto de primeiro piloto. Seu primeiro ano na equipe começou claudicante, mas terminou muitíssimo bem, com duas vitórias e o terceiro lugar no campeonato. No ano seguinte, a equipe recebeu Kimi Raikkonen, um gênio como piloto e um poste como ser humano. Sem a menor disposição do finlandês para montar a equipe do seu jeito ou para fazer política, restou à Ferrari investir no lado mais afável de Massa. Kimi, em um brilhante sprint final, venceu de maneira surpreendente o campeonato de 2007. Naquele ano, Massa terminou na quarta posição no campeonato e trabalhou para o título de seu companheiro, como pôde ser visto no GP brasileiro.
Ficava claro onde estava a real vantagem de Massa. Tecnicamente inferior a Schumacher, Raikkonen e Alonso, algo que está longe de ser um demérito preocupante, Felipe preocupou-se em desenvolver um relacionamento excelente como a Ferrari, mostrando sempre disposição em trabalhar com a equipe, uma boa curva de aprendizado, agressividade na pista, Inteligência dentro e fora dela e, acima de tudo, confiabilidade e credibilidade. Em 2008, com Kimi Raikkonen fazendo um ano abaixo do esperado, restou à Ferrari confiar em Massa. E ele fez o máximo que pôde, vencendo corridas e levando a briga pelo título até os últimos instantes. Felipe perdeu porque errou feio na Malásia, mas perdeu também porque uma mangueira safada destruiu sua corrida em Cingapura, o motor lhe deixou na mão quando ele liderava na Hungria e Timo Glock teve aquele problema com os pneus no Brasil. O saldo, portanto, estava positivo para ele. A Ferrari sabia que tinha ali alguém que poderia brigar pelo título no caso do primeiro piloto não conseguir fazê-lo. É a questão da confiabilidade.
Tendo um poste como companheiro de equipe, Massa conseguiu um espaço maior dentro da Ferrari, e muitos começaram a acreditar que ele realmente poderia ser o líder da equipe. Mas Fernando Alonso não é um poste. Muito pelo contrário. Se há alguém que segue os preceitos do príncipe maquiavélico, este alguém é o espanhol.
Muito parecido com Michael Schumacher e Ayrton Senna neste sentido, Fernando é um sujeito centralizador, ególatra e esperto. Sabe fazer uma equipe inteira trabalhar ao seu redor e, se necessário, pisa na cabeça de seus companheiros de equipe. Foi assim na Renault e deu certo, por que não seria assim na Ferrari, uma equipe que também faz de tudo e mais um pouco para vencer? Ao mesmo tempo, a equipe idolatra o piloto Fernando Alonso, um dos mais completos, como apontado acima. Logo, se Massa e sua capacidade de relacionamento com a equipe conseguiram achar um lugar na sombra na Ferrari de Raikkonen, todos sabiam que na Ferrari de Alonso, um expert de relacionamento, não haveria esse espaço. Havia ainda o Santander, principal patrocinador da equipe e, caham… espanhol. Mas não dá pra dizer que o banco tem grande influência, já que ela não seria nada se Alonso não fosse o que é.
Para piorar as coisas, o espanhol começou vencendo no Bahrein. Naquele fim de semana, já começava a ficar nítida a diferença técnica entre ambos. E conforme o tempo passou, a Ferrari percebeu que tudo aquilo que Massa tinha de bom, a confiabilidade e a afabilidade para com os propósitos da equipe, podia ser encontrado em mais abundância em Alonso, que além de tudo era um piloto naturalmente melhor. E o resultado foi aquele visto em Hockenheim. Fernando não ganhou só a corrida, mas também a confiança total da equipe. Se eu tiver de fazer uma aposta a partir do que penso, prevejo um revival Michael Schumacher – Rubens Barrichello para os próximos anos. E o mais bizarro: com ou sem Massa. Alonso conseguiu o que queria.
Por fim, o esgotamento de Massa. Como disse lá em cima, Felipe é um piloto que melhorou muito entre 2002 e 2008. Aprendeu a parar de fazer bobagens, passou a andar com sensatez e começou a obter excelentes resultados a granel. Se não é o piloto dos sonhos de ninguém, ao menos tinha cacife para peitar todo mundo e levar um título para casa. De 2009 para cá, no entanto, a Ferrari sucumbiu ao surgimento de novas concorrentes, como a Red Bull, e o próprio Massa abraçou o conservadorismo de uma maneira que aquele ímpeto visto nos tempos de Sauber pôde ser considerado como extinto. E o acidente de Hungaroring foi uma influência grande? Isso só o próprio piloto pode dizer, mas creio que não. O apagão de Massa se deu porque ele percebeu que Alonso tomaria o controle de tudo, como realmente aconteceu, e não haveria o mesmo ânimo de ser um piloto da Ferrari. Em termos de carro, Felipe Massa deve seguir na Ferrari sem pensar duas vezes. Em termos de motivação pessoal, creio que já é hora de buscar uma nova equipe. Se Massa seguir do jeito que está, destroçado pelo “Aloncentrismo” e por sua própria falta de ânimo, toda aquela confiabilidade e afabilidade que ele despertou para com a mídia, os torcedores e a Fórmula 1 desandará e se desfará como uma macarronada que passou do ponto.
29 de setembro de 2010 at 17:40
Belissimo texto !
Massa teria espaço em todas equipes que não as grandes.
E uma troca com Kubica para Renault não seria ruim para ele. Porém, duvido que a Ferrari queira um piloto bom, empolgado e combativo como Kubica ao lado do Alonso.
Ainda assim, acredito que a Ferrari irá manter Massa, que será o melhor segundo possivel do grid para ajudar o espanhol.
Uma vez que Webber e Vettel competem por titulo e nao se ajudam, assim como Button e Hamilton.
Massa daria um ajuda exclusiva para um piloto dentre as equipes maiores.
Um abraço, HENRIQUE
29 de setembro de 2010 at 22:57
Os personagens mudam,mas a história é sempre a mesma.
Schumacher foi bicampeão em 94 e 95.
Até então,só tinha duas vitórias e vinha de um país sem tradição na F1.
Corria de Benetton-Renault.
Foi para a Ferrari e trucidou seu companheiro de equipe logo no primeiro ano.
Na equipe vermelha,se tornou o maior campeão da F1,tendo como escudeiro Barrichello.
Alonso foi bicampeão em 05 e 06.
Até então,só tinha uma vitória na F1 e vinha de um país sem tradição na F1.
Corria de Renault.
Foi para equipe italiana,trucidou seu companheiro de equipe em seu primeiro ano e tem tudo para ser tricampeão.
Será que Massa será o escudeiro da vez?
E tem mais.
O domínio de Schumacher teve um hiato de quatro anos.Nesses anos,o carro campeão foi projetado por Adrian Newey.
Se a Red Bull levar esse ano…
Talvez Alonso e Schumacher não sejam parecidos apenas na personalidade…
30 de setembro de 2010 at 11:52
rapaz, que blog bom o teu hein
parabéns, mas muito parabéns
hehehe
já está favoritado e estou vendo os posts antigos… pérolas muito boas
sobre o artigo do massa, sair da ferrari buscando motivação na carreira seria admitir fragorosamente a derrota para alonso…
passaria atestado de incompetente ou de desmotivado frente a um “everest” espanhol
mas quem me dera estar na Fórmula 1 como ele…rs
30 de setembro de 2010 at 15:10
Excelente texto. Parabéns.
30 de setembro de 2010 at 21:40
belíssimo texto!
12 de outubro de 2010 at 21:00
una verità perfetta Rubinho e o Felipe são os dois maiores segundo-piloto do mundo… nada mais.
14 de julho de 2012 at 6:54
Felipe Massa talvez seja o piloto brasileiro que teve os melhores carros…Piquet teve ótimos carros em 80,81, 83 86 e 87, Senna tinha os melhores em 88, 89, já 90 discutível alguns achavam a Ferrari, também teve o melhor em 1994 mas acabou ocorrendo a tragédia, já Massa teve 5 anos o melhor carro o problema do Massa é que ele é um piloto médio.
17 de agosto de 2012 at 15:29
Muitas vezes um piloto tido como um campeão ou quase campeão, ganha o título por mérito do carro ou por ter um piloto número 2 inferior. Mansell era ridicularizado quando corria na Lotus apanhava feio do De Angelis (que foi dominado pelo Senna), ao ir na Williams em 85 enfrentou de igual pra igual o campeão Keke Rosberg, e em 86/87 também enfrentou de igual o campeão Piquet, se tornou um piloto muito temido, só que Mansell equilibrou com Berger na Ferrari sendo que Berger perdia feio pro Senna na Mclaren, e Mansell foi amplamente dominado pelo Prost na Ferrari Mansell caiu em desgraça, mas depois se recuperou quando pegou o Williams 92 o carro mais rápido da história da F1, e hoje todos apontam que naquela época, por comparação o Senna e Prost eram muito superiores a Piquet/Mansell/Berger/Rosberg pelo menos com os mesmos carros…com o Massa acontece a mesma coisa ele teve bons carros mas era lento, o Alonso que todos elogiam não é o bixo, ele teve um confronto com o Hamilton na Mclaren em que foi dominado, se o Alonso massacra todo mundo, desde Nelsinho Piquet, Massa, por que ele perdeu pro Hamilton…o Alonso lembra muito o Prost, olha o que ele fez com vários campeões mundiais todos fartamente dominados pelo francês o único que ele não dominou foi o Senna…com o Alonso acontece a mesma coisa, tem pilotos melhores que ele na F1, exemplo o Hamilton.
21 de janeiro de 2013 at 21:14
Na verdade o Hamilton conseguiu vencer o Alonso na McLaren porque é uma equipe que deixa os seus pilotos correrem livremente e deu um carro igual aos dois pilotos e como o espanhol é um bebê chorão que não sabe perder e quer uma equipe inteira a favor dele se deu mal nessa!
E o Schumacher que tomou um pau feio do Rosberg na Mercedes? É porque o Rosberg é fora de série? Não! É porque o Schumacher está velho? Pode até ser, mas isso não justifica tomar esta surra porque se fosse assim, o De La Rosa, com 41 anos (mesma idade em que o Dick Vigarista voltou a correr) perderia para o Karthkeyan na HRT! O que justifica esta surra é que o alemão sempre foi privilegiado na Benetton e na Ferrari e nunca correu contra concorrentes dentro da mesma equipe (Nelson Piquet não vale porque correu poucas corridas e estava em fim de carreira no momento em que Schumacher estreiou na F1).