Na atual temporada de Fórmula 1, temos cinco pilotos que fizeram sua primeira corrida neste ano: Nico Hülkenberg, Vitaly Petrov, Lucas di Grassi, Bruno Senna e Karun Chandhok. Somem-se a eles Kamui Kobayashi e Jaime Alguersuari, que estrearam no decorrer do ano passado, e temos sete pilotos que estão fazendo sua primeira temporada completa na categoria. Se você perguntar a qualquer um o que ele acha do nível médio dos atuais estreantes, a resposta tem tudo para ser negativa. Como argumento, ele dirá que os caras não fizeram nada que chame atenção até aqui. É o que eu chamo de “efeito Hamilton”.
Em 2007, a McLaren contratou um moleque de 22 anos para ser companheiro de equipe do bicampeão Fernando Alonso. O moleque em questão já havia levado para casa os títulos da Fórmula Renault inglesa, da Fórmula 3 européia e da GP2. Um fenômeno. Além do mais, uma ótima ferramenta de marketing, era o primeiro piloto negro a conseguir chegar à Fórmula 1. A princípio, isso era o que deveria chamar mais a atenção. Surpreendentemente, Lewis Carl Hamilton colocou seu capacete amarelo, igualou-se aos seus oponentes (quem vê capacete não vê cor de pele, oras) e começou a obter uma série bons resultados. Fez nove pódios consecutivos nas suas primeiras nove corridas, venceu quatro e perdeu o título por apenas um único ponto devido a problemas de inexperiência e insensatez. Vice-campeão, foi considerado pela mídia e pelos torcedores o melhor estreante de todos os tempos. Apenas Jacques Villeneuve havia conseguido resultado igual em seu primeiro ano, e mesmo assim sem tanto furor. Lewis Hamilton era um fenômeno, um candidato a gênio. E também uma bela exceção.
O problema é que nem todo mundo pensa assim. A estréia de Hamilton estabeleceu um novo padrão na Fórmula 1, o do estreante genial que aparece fazendo grandes corridas logo no começo. Equipes, torcedores e midiáticos passaram a esperar o mesmo dos outros. Não importa se o cara não faz o estilo arrojado. Não importa se o cara está na Hispania. Não importa se a curva de aprendizado é diferente para todos. O que todos queriam ver era estreantes destruindo seus companheiros experientes, fazendo ultrapassagens impressionantes e maravilhando a todos. O que digo? Digo que todos enlouqueceram.
Como falei lá em cima, Hamilton foi uma agradabilíssima exceção. Vamos a uma pequena aula de semântica. Segundo o Aurélio, EXCEÇÃO é um substantivo feminino que indica “uma pessoa cujo modo de pensar ou proceder não é comum”. Logo, Lewis Hamilton é uma pessoa cujo modo de proceder não é comum. Aprendam isso, infantes! Nenhum estreante é obrigado a fazer corridas excepcionais logo no primeiro ano. Talvez, nem no segundo ou no terceiro. Lembremos que Nigel Mansell, aquele que é amado por muitos, demorou cinco anos pra aprender a fazer direito as coisas. Outros, como Jody Scheckter e Nelson Piquet, também demoraram um pouco para aparecer. É verdade que pilotos como Ayrton Senna e Michael Schumacher começaram a brilhar desde cedo. Mas ninguém tem a obrigação de ser Senna ou Schumacher. E nem de ser Hamilton.

Nico Hülkenberg. Ganhou tudo até aqui, mas vem tendo dificuldades nesse ano de estréia na F1. Que são normais e aceitáveis, oras bolas!
Na atual temporada, o estreante que tem brilhado mais é um pseudoestreante. Kamui Kobayashi, da Sauber, marcou 15 pontos até o GP da Inglaterra e está em 12º. Eu me arriscaria a dizer que o japonês só tem brilhado mais porque fez dois corridões em Valência e em Silverstone. O restante do ano, em termos de resultados, foi absolutamente dispensável. Ele teve muito azar, mas também andou atrás de Pedro de la Rosa, seu discreto companheiro de equipe, por algumas vezes. Longe de ser um mau piloto ou um completo picareta de olhos puxados, a verdade é que Kobayashi agiu, acima de tudo, com extremo oportunismo nas últimas corridas. E é isso mesmo que um estreante de uma equipe média deve fazer: agir com oportunismo e mandar à merda quem encher o saco.
O motivo desse texto, no entanto, está nos estreantes que estão nas melhores equipes, a dupla dinâmica Hülkenberg e Petrov. O alemão, que já deve ter ganho até campeonato de cuspe antes de chegar à F1, faz um ano bastante complicado e marcou até aqui apenas dois pontos. Seu companheiro Rubens Barrichello, a título de comparação, marcou 29. Nico vem andando razoavelmente bem nos treinos, mas se perde nas corridas com erros e uma crônica falta de ritmo. Em dias muito negros, já chegou a terminar atrás de um Lotus. É verdade que seu Williams não é aquela Brastemp com degelo automático, mas os esforços bem-sucedidos de Barrichello acabam por ofuscar por completo o jovem alemão. E aqueles que não tem tanto contato com o automobilismo além do mundo cego, surdo e mudo da Fórmula 1 terminam achando que o tal Hülkenberg é mais um moleque medíocre e sem futuro. Esses nem se dão ao trabalho de pronunciar corretamente o nome do cidadão. Hulk não existe. É Hilk. Trema!
E o coitado do russo? Se desconsiderarmos o japonês surgido na safra 2009, Vitaly Petrov é o estreante com mais pontos até aqui. São seis, marcados em um chuvoso GP da China no qual ele andou muito bem. Ele também teve atuações bastante razoáveis em Sepang, em Istambul e em Silverstone. No entanto, andou muito mal em outras corridas também, como em Montreal e em Barcelona. Ao contrário de Hülkenberg, Petrov tem sérios problemas nos treinos, nos quais consegue uma posição média de 14,1. Nas corridas, ele até se recupera com largadas razoáveis e, dependendo da posição dos astros, consegue andar bem. No entanto, nem sempre isso acontece. E o azar sempre dá as caras, como aconteceu em Istambul. Seu companheiro Robert Kubica, inspiradíssimo, já tem 83 pontos e tem uma posição média nos grids de 6,8.
Em tese, Hülkenberg e Petrov merecem um desconto por serem companheiros de Rubens Barrichello e Robert Kubica, dois pilotos de ponta. Por maior que seja a derrota, perder pra Rubens e Robert não deveria ser considerado um demérito quase criminoso. Os estreantes precisam passar por um período de aprendizado para se tornarem pilotos de ponta um dia, e nada mais adequado do que ter um bom companheiro como professor. Se Hamilton conseguiu vencer um bicampeão no seu primeiro ano, parabéns para ele. Hülkenberg e Petrov não estão conseguindo, o que não quer dizer picas.

Vitaly Petrov. Seu vice-campeonato na GP2 em 2009 mostra que ele é bom. Mas a Renault tem pressa, e quem tem pressa come cru.
O velho Frank Williams até entende a situação. O tiozão já teve em seus carros estreantes como Jenson Button e Nico Rosberg, e estes penaram em seu primeiro ano na categoria. Frank teve a paciência necessária para não mandá-los embora na primeira oportunidade e o resultado é que ambos são pilotos consolidados na categoria. E exatamente por isso que ele dará toda a assistência possível a Hülkenberg. “Vocês vão ter de me engolir”, diria Nico se ele conhecesse o Velho Lobo. No entanto, Petrov não deverá ter a mesma sorte.
Nesta semana, Eric Boullier, dirigente da Renault, andou dizendo que estava conversando com alguns pilotos para o ano que vem. A mídia alemã emplacou até mesmo um número para estes “alguns”, sete. E todos esses sete eram nomes de quilate: Kimi Raikkonen, Nick Heidfeld, Timo Glock, Kamui Kobayashi, Heikki Kovalainen, Jarno Trulli e Christian Klien. Hoje, o dirigente disse que estava satisfeito com o russo, mas que só conversaria sobre seu futuro mais tarde. É visível que se for pra ter qualquer nome da lista acima, ele mandaria Petrov às favas, mesmo que este carregue consigo uma bolada em sua carteira. Nem acho que o russo fique de fora da Fórmula 1, já que tem dinheiro pra comprar a vaga que quiser. No entanto, é um piloto em visível evolução. E a Renault segue destruindo carreiras promissoras com sua impaciência, suas cobranças e os excessivos privilégios ao primeiro piloto. Nelsinho Piquet e Romain Grosjean que o digam.
Nessa segunda metade do campeonato, o que Nico Hülkenberg e Vitaly Petrov podem fazer é seguir seu trabalho com discrição e eficiência. Eles devem tentar se manter o mais próximo possível de Rubens e Kubica, mesmo que não consigam superá-los. Além do mais, o melhor é se afastar de torcedores e jornalistas. Na verdade, qualquer um relacionado ao esporte faz bem ao se afastar deles. O efeito Hamilton faz mal à cabeça.
21 de julho de 2010 at 0:25
Iai Verde beleza? Bom, acho que seria um erro a Renault trocar o Russo, pelo menos agora. Esperar mais 1 ano pelo menos, ele tem que se adaptar mas já mostrou que é um bom piloto e que tem bom futuro na F1. O mesmo com o Hulk, que espero que se de bem na Fórmula 1. Claro que, por ser novatos e com companheiro de equipes bem mais experiente, eles ficariam atrás, mas isso serve como aprendizado e experiencia para ambos. O que aconteceu com Hamilton com Alonso foi um caso que nem eu acreditei na época, mas Hamilton parece que mostrou seu lado iniciante no fim de 2007 quando errou e perdeu o titulo. Abraço man visite meu blog lá.
21 de julho de 2010 at 0:32
Ah, espero que ano que vem a Williams esteja boa o suficiente para brigar com as equipes acima, seria bom ver Hulk e Rubens brigando com RBR, McLAren, FErrari e Mercedes e seria bom pra F1. E tem a Renault, que parece que ira forte só espero que não tirem o petrov abraço
21 de julho de 2010 at 11:47
Voltando ao meu comentário anterior… Acho que aí está uma boa aplicação do raciocínio histórico.
Porque o que você chama de efeito Hamilton eu também vejo como efeito Vettel, efeito Kubica. Lembra do polonês que estreou brigando com Schumacher e que marcou seu primeiro pódio em três corridas? E do alemão que estreou largando em sétimo, e venceu com uma Toro Rosso?
Houve uma onda de iniciantes que se destacaram logo de cara (algo, imagino eu, muito alinhado aos interesses de um sistema econômico que investe num discurso pesado de aliciamento de jovens ao culto ao sucesso). Houve mais do que uma exceção, em minha opinião.
Houve um momento histórico propício, do qual eu consigo enumerar duas condições logo de cara: 1) uma geração que se iniciou nos primeiros anos da GP2, que substituiu a decrépita F3000 (que formou pilotos como Liuzzi, Bourdais, Wirdheim…) por algo mais próximo à experiência de pilotar um F1; e 2) aquele período em que o regulamento permitia que determinadas equipes colocassem um terceiro carro na pista às sextas-feiras. Este último foi decisivo para a carreira de Kubica e Vettel. Podiam treinar e moldar seus estilos de pilotagem de acordo com uma situação real de GP, sem a pressão de disputá-lo. Privilégio maior que esse, impossível.
Agora a nova geração patina porque a GP2 está perdendo o bonde da história, e porque os testes foram simplesmente erradicados da Fórmula 1. Eles deram azar, pois são jogados nos GPs ainda crus demais. Se fossem jogadores de hóquei, diria que eles nasceram depois de julho, e Vettel, Kubica e Hamilton, antes. Não que nascer antes de julho faça o sujeito em questão prescindir do talento – todo mundo que chega à Fórmula 1, como você bem notou em um post anterior, é por si só uma exceção (e talvez Hamilton seja até “mais” exceção do que tantos outros, por sua própria trajetória pessoal) -, mas ajuda um bocado.
21 de julho de 2010 at 12:11
Não consideraria como “efeito Vettel” ou “efeito Kubica” exatamente por ambos terem tido uma ascensão bem menos íngreme do que a do inglês. Kubica estreou em 2006 por uma BMW Sauber que era boa o suficiente para não condená-lo ao fim do grid, mas ao mesmo tempo não tão boa de modo que ele pudesse se manter um pouco longe da pressão e dos holofotes. Mal comparando, é algo como Mauricio Gugelmin ter estreado em uma March. No ano seguinte, seu carro melhorou e, mesmo ficando atrás de Nick Heidfeld, ainda assim conseguiu angariar uma boa imagem, a de um piloto de ponta em um carro que não estava à sua altura.
Já Vettel, desconsiderando sua “one-off” pela BMW Sauber, estreou na melhor condição possível, tendo uma equipe pequena que deu a tremenda sorte de conseguir ter um carro bastante convincente. Aos olhos das pessoas, vencer com a Toro Rosso em Monza/2008 foi uma extrema demonstração de genialidade que pôde até mesmo apagar o complicado início de campeonato que ele teve. Sua ascensão foi meteórica, mas não foi imediata. E digo o mesmo para Kubica. Os dois puderam se desenvolver tecnicamente, psicologicamente e até mesmo comercialmente antes de serem chamados, definitivamente, de pilotos de ponta.
Já Hamilton foi um caso único porque, desde o primeiro momento, ele se mostrou um piloto de ponta com tudo aquilo de bom e ruim que a alcunha traz. E é isso que todos andam esperando: pilotos de ponta imediatos. Não creio que a GP2 seja um problema grande, até porque a categoria vem buscando uma aproximação agressiva com a Fórmula 1. A falta de testes, sim, é péssima. Mas o imediatismo das pessoas, gerado em grande parte pela velocidade da informação, reduz cada vez mais a paciência com novatos como Hülkenberg e Petrov.
21 de julho de 2010 at 23:11
De qualquer forma, podemos considerar que as estréias de Hamilton, Kubica e Vettel mudaram a forma com que a F1 encara seus novatos. Infelizmente, apesar de ter sido uma época impressionante.
19 de setembro de 2019 at 23:40
Verde, parabéns pelo seu Blog, e Dá para dizer que Verstappen e o Leclerc também tiveram ótimas estréias na Fórmula 1 e vem mostrando talento em equipes grandes, como o monegasco, que vem aposentando o Vettel.